15 set, 2023 - 19:40 • Liliana Carona
Sempre quis ser professora desde pequenina, “era algo que queria mesmo”, recorda Susana Duarte, a viver no Fundão e colocada este ano no Agrupamento de Escolas A Lã e a Neve, na Covilhã, passando a estar vinculada ao Ministério da Educação.
Apesar de o momento ser de alegria pela conquista que desejava desde 2004, Susana confessa que não pode apagar todo o rol de experiências vividas desde 2004.
“O nosso ordenado não chega para fazer face às despesas, talvez um suplemento para as deslocações a partir de uns certos quilómetros, um apoio para a renda para os deslocalizados, como existe para os ministros, ajudas de custos”, começa por sublinhar a docente que acredita estar a dar a voz por muitos colegas.
“Estou a dar a voz por esta situação e a representar muitos colegas, espero não ter consequências”, afirma Susana Duarte, lamentando que muitas colegas já tenham desistido da profissão. “Conheço muitas colegas que tiveram de deixar o ensino. Foram para empresas de peças, por exemplo, horários certos, sem deslocações, sem ouvir comentários de encarregados de educação”, conta, destacando que o professor “tem vindo a perder poder”.
“Não temos autoridade sobre eles, qualquer ação tem de ser pensada várias vezes, porque podem vir consequências maiores, os encarregados da educação vêm à escola confrontar-nos”, assume Susana Duarte.
É mais uma viagem para a professora Susana Duarte, que desde 2004 lutava por ficar vinculada ao Ministério da Educação. Este ano consegue e pela primeira vez, ficar perto de casa, do Fundão para a Covilhã, muito menos quilómetros, do que no ano letivo passado, em que conseguiu horário em duas escolas, Mêda e Pampilhosa da Serra, 177 quilómetros de distância.
“A nossa vida não é fácil, no início da minha carreira, sempre com horários incompletos, fiz um part-time de 11 anos para a Sonae. E nunca desisti da carreira, gosto de ensinar. Faço de tudo também para estar presente na vida dos meus filhos”, explica sobre a conciliação do trabalho com a vida pessoal.
O carro novo que comprou em 2018, e que está a pagar, já tem 180 mil quilómetros. “Faço revisões de dois em dois meses e mudo de pneus constantemente. Espero que o Ministro se coloque no terreno, a escola pode estar a 30km, mas é curva contracurva ou atrás de serra e em vez de demorarmos 30 minutos, demoramos uma hora. Mêda podia parecer próximo de Pampilhosa da Serra, mas não é”, adverte.
Terminou o curso em 2004, e com 44 anos, só neste ano que se inicia, vinculou. Ainda não está estável, garante, e na história de vida desta professora, está também na memória a dificuldade em arranjar quarto onde pudesse permanecer com os dois filhos menores.
Em Loures, por exemplo, há três anos, teve de insistir.
“Foi a segunda vez que tive de levar os meus filhos. Procurei sempre um espaço em que os meus filhos se sentissem em casa. Era uma cama de casal e eu tive de pedir à dona da casa para arranjar um colchão mais pequenino que não tinha estrado, nem a espessura necessária. Eu dormia com a minha filha com 8 anos, e o meu filho, 11 anos, um pouco mais crescido, dormia no colchão, no chão. Pagava por aquele quarto 350 euros, sem recibo verde e vivia com a dona da casa. Se um professor tem filhos é um problema arrendar quarto, eu dizia sempre que era eu mais duas crianças, e não queriam porque perturbavam o ambiente. Há senhorios que não nos permitem levar os filhos. Vi-me sempre complicada para arranjar quarto para os meus filhos. Depois de me apresentar nas escolas ia sempre a chorar para casa”, recorda, emocionada, Susana Duarte.
Já teve outros trabalhos em part-time, para fazer face às despesas, e apesar de finalmente estar vinculada, Susana Duarte não acredita que possa respirar de alívio.
“Tenho agora a sorte de estar perto de casa, mas para o próximo ano letivo, provavelmente vou ter de concorrer para todo o país, se o Governo não mudar o que decidiu neste ano letivo. Quem entrou na vinculação dinâmica vai ter de concorrer a todo o país”, alerta a docente.
Susana Duarte recusa desistir da profissão, mas admite que tem sido uma aventura. “Quando entro na sala, esqueço a minha realidade, vi-me e desejei-me para aqui chegar. Conheço o nosso país e conheço todos os miradouros e passadiços. Mas espero que agora acalme aos 44 anos, já preciso de um bocadinho de paz e serenidade na vida. Já chega”, desabafa.