Douro

Grainhas de hoje, Bagos d’Ouro de amanhã. Associação prepara estudantes para a vida

18 mar, 2022 - 06:43 • Olímpia Mairos

Atualmente, são 34 os universitários d’Ouro que chegaram ao Ensino Superior graças à ajuda desta associação: foi-lhes adiantado o valor das bolsas de ação social, tiveram apoio com material escolar/livros e ajuda na procura de casa ou residência.

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Começou com um sonho e tornou-se realidade. Na região duriense, a Bagos d’Ouro procura, desde 2010, construir dia a dia uma sociedade mais justa, um Douro mais equilibrado, mais equitativo e, sobretudo, mais inclusivo.

Na associação acredita-se que a “arma mais poderosa para mudar o mundo” é a educação e é para que todas as crianças tenham igualdade de oportunidades e as novas gerações possam ter um papel ativo na inversão do ciclo de pobreza e exclusão social que as várias equipas trabalham.

O foco principal, que é também a missão, centra-se, por isso, na promoção da educação de crianças e jovens do Douro, que vivem em situação de carência económica, como forma de inclusão social no território.

Em seis concelhos do Douro – Alijó, Armamar, Murça, Sabrosa, São João da Pesqueira e Tabuaço, a ação da Bagos d’Ouro abrange 197 crianças e jovens (do 1º ciclo até à universidade) e 103 famílias.

O compromisso é, assim, de longo prazo, numa estratégia de proximidade, um trabalho personalizado com cada uma das crianças e jovens, acompanhando o seu percurso educativo, social e familiar até à integração na vida ativa.

34 universitários d’Ouro

A Bagos d’Ouro tem sentido um grande crescimento no número de jovens universitários que apoia. Atualmente, são 34 os universitários d’Ouro, para quem concretizar o sonho de chegar ao Ensino Superior teve uma grande ajuda desta associação a vários níveis: adiantamento do valor das bolsas de ação social, apoio com material escolar/livros e ajuda na integração, por exemplo, com a procura de casa ou residência.

Para os estudantes que são colocados em Universidades mais longe, a Associação ajuda ainda no reconhecimento da cidade (os transportes, onde são os principais serviços, etc.).

Porto, Coimbra, Vila Real e Aveiro são algumas das Universidades por onde se distribuem estes jovens, que estão em cursos tão diversos como: Genética e Biotecnologia, Ciências da Comunicação, Direito, Engenharia, Turismo e Animação Sociocultural.

“Tenho muito orgulho. Sem eles não conseguiria estar na universidade”

Júnior Vilela, de 19 anos, natural de Favaios, está no 2º ano de Engenharia Civil na FEUP. Conta à Renascença que já está na associação desde o sexto ano de escolaridade e, se chegou onde chegou, tal deve-se à Bagos d’Ouro.

“Tenho muito orgulho. Sem eles eu não conseguiria estar na universidade, tanto a nível de força de vontade, como a nível económico. Sem eles não seria possível seguir em frente e acredito que o apoio se vai manter até conseguir um emprego”, diz.

O jovem sente que uma das formas de retribuir o muito que tem recebido é disponibilizar-se para ajudar, como voluntário, para, assim, apoiar outros como ele foi apoiado. “Esta é a minha segunda família, sempre me trataram como família, sempre me trataram muito bem e ajudaram-me a crescer como pessoa. É isso que eu quero fazer também”, explica.

Também Beatriz, 22 anos, de São João da Pesqueira, destaca o trabalho de proximidade, o apoio e a ajuda da associação na concretização dos seus sonhos. “Desde que tenho memória, estive sempre na associação e sempre foi uma presença importante na minha vida. Tem sido uma ajuda fundamental no meu percurso”, refere a jovem, atualmente no 4º ano de Genética.

“Fazer pelos outros o mesmo que fizeram por mim”

Rodrigo Moura é de Sabrosa, tem 20 anos e frequenta o 2º ano de Turismo. É apoiado pela Bagos d’Ouro desde o secundário e destaca a importância da associação quer a nível pessoal quer a nível académico. “Tem vindo a ser um grande apoio, principalmente a nível pessoal, pois têm vindo a trabalhar comigo, ajudando-me a ser mais autónomo, a ultrapassar as fases mais adversas da vida e a descobrir o que quero ser no futuro”, conta o jovem.

O apoio monetário é importante, salienta Rodrigo que prefere, no entanto, destacar o “muito conhecimento e a muita educação” que recebe e que o preparam para a vida. O principal objetivo do jovem é “concluir o mestrado e, depois, ficar pela zona do Douro/zona Norte e procurar trabalhar na área da gestão”. E, claro, disponibilizar-se como voluntário na associação para “fazer por outros” o que fizeram por ele.

“No fundo, para ajudar quem mais precisa. E como me têm ajudado muito, também conseguirei transmitir para os outros o que me transmitiram a mim”, diz.

Ajudar as crianças a crescer e transformar o Douro

Luís Ribeiro é do concelho de Murça, tem 18 anos e está a frequentar o curso de História na Faculdade de Letras do Porto. Chegou à associação através do irmão, que já estava a ser apoiado, e não poupa as palavras para descrever o quanto tem sido importante este apoio no seu percurso.

“É um orgulho. E hoje aqui estou. E senti-me sempre apoiado, acarinhado por esta família fantástica, fiz amigos fantásticos, conheci pessoas fantásticas. Alarguei os meus conhecimentos e a minha visão. Só tenho a agradecer. E uma forma de agradecer é também poder servir e estar disponível para ajudar esta associação a crescer”, conta.

O jovem destaca a importância deste tipo de associações na região do Douro, onde ainda existem muitas carências, realçando que “sem esta associação, alguns dos que estão a ser apoiados não teriam chegado onde já estão neste momento”. “Se não fosse a Bagos d’Ouro, eu estaria a trabalhar no campo ou já estaria na França a acarrar baldes de massa. Não teria alcançado o meu sonho, porque os meus pais não tinham possibilidades”, exemplifica.

Luís refere ainda que o papel da associação é fundamental na região do Douro, “uma região que tem excelentes oportunidade e, mesmo assim, continua um bocado desvalorizada”. “A associação tem como objetivo não só ajudar as crianças a crescer, mas a fazer com que elas, depois, no futuro ajudem outros; ou seja, ao ajudarem-nos nós, estão a ajudar o Douro também”, completa.

Beatriz Pires, 21 anos, de Alijó, está no 1º ano de mestrado em Psicologia da Edução e na Bagos d'Ouro entrou através de um irmão, há mais ou menos um ano. Sente que o apoio é importante e já está a “apoiar um menino que anda no 7º ano”. “Dou-lhe apoio ao nível dos trabalhos de casa, preparação para os testes e não me foco apenas numa disciplina, mas dou apoio de um modo geral. E, além disso, ajudo também a organizar-se e a ter momentos de estudo”, conta.

A missão não é fácil, diz, “mas eu acho que, quando temos vontade e quando gostamos daquilo que estamos a fazer, é tudo mais simples”.

Jovens chamados a transformar as comunidades

Todos estes jovens universitários participaram no “Take Action Uni”, um encontro que permitiu que todos se conhecessem presencialmente, partilhando as suas experiências universitárias, as dificuldades que vão ultrapassando e as vitórias que vão conquistando.

Mas, mais do que isso, este fim de semana de atividades destinou-se a desenvolver competências pessoais e a promover o autoconhecimento, tendo em conta dois objetivos principais: por um lado, começar a preparar estes estudantes para integrarem o mercado de trabalho; por outro lado, motivá-los a integrarem programas de voluntariado que os levem a impactar as suas comunidades, inspirar, por exemplo, a que venham a tornar-se voluntários da própria Bagos d’Ouro, acompanhando outras crianças e jovens.

“Foi um fim de semana com um foco no desenvolvimento de competências pessoais e sociais, com vista a uma atitude de liderança face à comunidade. Estes miúdos são ‘bagos’, mas com muito potencial e que podem realmente ter um impacto transformador no futuro do Douro”, conta a coordenadora Social Local da Associação Bagos d’Ouro.

Um trampolim para saltar mais alto

Carla Sousa explica que a associação trabalha com crianças e jovens de famílias com alguma situação de vulnerabilidade social, mas o seu foco centra-se “no potencial que têm e no potencial de mudança que eles podem ter também na sua comunidade”. “Acreditamos muito neste valor e sentimos que o facto de eles sentirem que também há esse acreditar, desabrocha um acreditar também neles próprios e com bastante impacto”, nota.

Segundo a responsável, apesar de o foco ser a educação e o sucesso escolar, o trabalho da associação é muito mais abrangente, na medida em que realizam “uma intervenção muito sistémica. “Trabalhamos com uma família sempre em contexto domiciliário, com os professores, com os parceiros sociais e, no fundo, trabalhamos com a rede que suporta esta criança e este jovem, para que ganhe aqui uma cama, um trampolim que o permita saltar mais alto”.

“Estes jovens serão no futuro também os transformadores da sua própria comunidade e queremos muito que eles sintam que têm um papel ativo na forma como podem intervir sobre a sua região e trabalhamos muito isso também”, acrescenta.

Há também um apoio monetário em algumas situações. “Embora não seja esse o foco, por vezes essa necessidade está lá e também temos que dar resposta”, diz a coordenadora, acrescentando que contam com muitos parceiros no terreno para levar por diante a missão.

O acompanhamento ao estudo, com diversos programas didáticos e de tutoria, é um dos principais focos da associação, a que se junta o apoio aos níveis social e económico, de acordo com as necessidades de cada núcleo familiar.

O futuro do projeto e da região

Na Bagos d’Ouro, o voluntariado assume um papel especial. E muitos dos voluntários são jovens, alguns dos quais ainda estão a receber apoio da associação. “Costumo dizer que eles são os embaixadores da Bagos d'Ouro, por isso, têm muito potencial e muita coisa para dar. Acho que eles são o futuro deste projeto, eles conhecem bem a região onde estamos, conhecem as pessoas, podem ser os principais responsáveis por promover o interior”, conta José Veiga.

O jovem de 26 anos gere a parte do voluntariado, principalmente o projeto “Enreda-te Digital”. Trata-se de um projeto que assenta numa rede de voluntários, principalmente nos universitários, para dar apoio escolar a estudantes do 1.º e 2.º ciclos, numa base contínua e sistemática, com uma lógica individualizada de “um-para-um”.

Os atuais jovens universitários são, assim, “com a bagagem que estão a ter, as próximas linhas da frente e vão ajudar este projeto a crescer”, diz o voluntário.

“Quando eu percebo que sou responsável pelas pessoas que estão à minha volta, sou responsável pela minha comunidade, então isso permite também perceber e ter uma maior sensibilidade para identificar os problemas sociais, ajudar a colmatar esses mesmo problemas”, destaca.

A Associação Bagos d'Ouro nasceu em agosto de 2010, pela iniciativa de Luísa Amorim, com história empresarial no Douro, e do Pe. Amadeu Castro, reconhecido pelo elevado dinamismo social na freguesia de Trevões e no concelho de S. João da Pesqueira.
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