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Mortalidade Covid-19

“Todos os dias há mortes declaradas no boletim da DGS que não foram por Covid-19”, garante médico infecciologista

08 fev, 2022 - 16:30 • Joana Gonçalves

A garantia é deixada por um médico do Hospital de Santo António, no Porto, que adianta que a rapidez no reporte pode resultar em perda de informação clínica dos doentes. Em meados de janeiro apenas um terço dos internados neste hospital com teste positivo ao SARS-CoV-2 deram entrada devido à Covid-19. O clínico reconhece, contudo, melhorias no sistema de reporte de casos. A DGS já reagiu e assegura que segue “as regras de codificação definidas pela OMS".

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A mortalidade por Covid-19 em Portugal pode estar a ser “sobrevalorizada”. A tese é defendida por Miguel Araújo Abreu, médico do Centro Hospitalar Universitário do Porto.

De acordo com o infeccologista, em causa não está a inegável gravidade da pandemia que desde 2020 tirou a vida a mais de cinco milhões de pessoas em todo o mundo, mas antes a qualidade da informação recolhida pela Direção-Geral da Saúde.

“Tenho a certeza absoluta que todos os dias há mortes declaradas no boletim diário da DGS que não foram por Covid-19. Se fossem cinco ou três óbitos diários era difícil. Mas com 40, 50 ou 60 mortes por dia, a probabilidade de haver muitos desses óbitos que não são consequência da Covid-19 mas de muitas outras comorbidades que o doente tem é muito grande”, esclarece o médico.

O clínico explica à Renascença que no momento da redação da nota de óbito de um doente, que atualmente é eletrónica, os médicos têm de responder a um item que questiona se o paciente em causa está ou não infetado com SARS-CoV-2.

“Se eu puser sim, automaticamente esse doente pode ser considerado como doente Covid-19, quando ele morreu por outra coisa qualquer”, esclarece Miguel Abreu. Tal só não se verifica se o clínico acrescentar na nota da causa principal de morte, uma outra causa que não a doença provocada pelo SARS-CoV-2.

“E muitas vezes, sobretudo em situações de excesso de trabalho, acentuadas pela Covid-19, pode haver facilmente uma sobrevalorização da Covid-19 em termos da mortalidade. Muito, muito facilmente. Porque os certificados de óbitos estão numa plataforma à qual a DGS tem acesso imediato, é fácil fazer a contabilização”, acrescenta o médico.

Já na passada sexta-feira, a DGS divulgou uma nota que dava conta de cerca de 25% dos internados com SARS-CoV-2, desde o início da pandemia em Portugal, foram hospitalizados por consequência direta de outra doença que não a Covid-19.

Num esclarecimento enviado à Renascença, a DGS adianta que "são analisados todos os certificados de óbito com o campo "Paciente infetado por SARS-CoV-2" assinalado, e destes apenas são reportados publicamente os óbitos devido à COVID-19, em concordância com as regras de codificação definidas pela OMS".

Assim, depreende-se que qualquer erro na classificação só ocorrerá se o clínico não preencher devidamente o documento. A DGS deixa ainda um exemplo - "na passada sexta-feira, foram analisados 74 certificados de óbito com registo de infeção por SARS-CoV-2, dos quais apenas 50 óbitos foram classificados conforme as regras da OMS como óbitos devido à COVID-19 e reportados no boletim diário".

"O relatório de situação diário reporta apenas as mortes devido à COVID-19. A declaração de qualquer óbito em Portugal faz-se acompanhar de um certificado de óbito, passado pelo médico que verificou o óbito no Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO)", reafirma a entidade.

No caso particular do Hospital de Santo António, no Porto, Miguel Abreu adianta que em meados de janeiro, altura em que foi feito o pedido de acesso a estas dados por parte do ministério da Saúde, apenas um terço dos internados com teste positivo ao SARS-CoV-2 deram entrada devido à Covid-19.

Sistemas de reporte “francamente melhores”

Em abril de 2020, vários médicos denunciaram à Renascença problemas de eficiência nos sistemas de reporte e vigilância de casos de Covid-19. Passados quase dois anos, Miguel Araújo avança que a maioria dos obstáculos foram ultrapassados.

O especialista afirma que se mantém a “obsessão” pela quantificação de dados clínicos, “porque o ministério [da Saúde] para justificar trabalho, precisa de mostrar números”, mas garante que “em relação especificamente à Covid-19, está francamente melhor”.

“Houve diminuição de redundância de notificações”, assegura o médico.

Alteração do método de vigilância já devia estar em curso

Apesar dos avanços no sistema de reporte de casos de SARS-CoV-2, o infecciologista defende que o método de vigilância da Covid-19 já devia ter sido alterado.

“Sou infecciologista e não epidemiologista, mas acho que já devíamos estar a fazer isso há muito tempo. Chega a ser quase absurdo - e não vejo outro motivo que não político - para se continuar com aquele boletim diário”, diz.

O médico relembra que o número de doentes internados em unidades de cuidados intensivos é estável desde dezembro. “As pressões que existem neste momento nos cuidados de saúde, são pressões muito mais pelas regras que nos exigem para estes doentes do que por outra coisa qualquer. Estamos todos cansados”.

No final de janeiro o Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge avançou, à Renascença, que está a estudar um novo sistema de vigilância da Covid-19, baseado em modelos de amostragem com estimativas semanais, e que deverá estar concluído até outubro.

[Notícia atualizada às 17h00 com esclarecimento da Direção Geral da Saúde]

Comentários
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  • Manuela Bastos
    08 fev, 2022 Batalha 20:59
    Finalmente. Rádio Renascença está a ser fiel aos valores cristãos que estão na base da sua criação: a defesa da verdade e do Bem,, a denúncia da hipocrisia e da manipulação. Fico à espera de mais notícias que tragam à luz a verdade acerca da pandemia do medo e da submissão.

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