50 anos do maior sismo desde 1755

Portugal resistiria a um sismo como o de 1969? "Pessoas estão a comprar gato por lebre ao preço do ouro"

28 fev, 2019 - 15:30 • José Pedro Frazão com Redação

Há 50 anos, Portugal despertou de madrugada em pânico, sacudido por um terramoto de magnitude 7,3 na escala de Richter. 13 pessoas morreram naquele 28 de fevereiro.

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28 de fevereiro de 1969. Passa hoje meio século. De madrugada, às 3h41 e 20 segundos, o Serviço Meteorológico Nacional registava, na estação sismográfica de Lisboa, um abalo de magnitude 7,3 na escala de Richter.

Duraria pouco mais de um minuto, aquele que foi o maior sismo do século XX em Portugal e na Europa, também o maior (e mais destruidor) abalo de que há memória no país deste o catastrófico terramoto de 1755.

Treze pessoas morreram naquele 28 de fevereiro de 1969. Outras 58 ficaram feridas.

Não foi, apesar de tudo, Lisboa que mais sofreu o efeito destruidor do terramoto. Por todo o país, a destruição foi generalizada, mas o principal impacto foi na região do Algarve, uma vez que o sismo teve o seu epicentro 80 quilómetros a sudoeste de Sagres.

Segundo um relatório de Fernando Carrilho e Jorge Miguel Miranda, publicado em 2014 pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera, o sismo de 1969 provocou "alarme e pânico entre a população, cortes nas telecomunicações e no fornecimento de energia elétrica". A imprensa deu igualmente destaque à tragédia de há 50 anos. Na manchete do jornal República, de 29 de fevereiro, podia ler-se: "A terra tremeu. Tomadas de pânico milhares de pessoas fugiram para a rua em trajos menores."

Além das vítimas mortais – este não foi, contudo, o sismo mais mortífero dos tempos recentes em Portugal: em 1980, Angra do Heroísmo, nos Açores, foi devastada por um tremor de terra de 7.2 na escala de Richter, o que levaria à morte de 73 pessoas –, registaram-se, sobretudo no Algarve, várias habitações parcial ou totalmente destruídas.

Entrevistado pela Renascença, Carlos Mineiro Aires, bastonário da Ordem dos Engenheiros, garante que muito há ainda por fazer (sobretudo nos prédios mais antigos que hoje vão sendo recuperados) em Portugal quanto à prevenção dos edifícios contra abalos sísmicos.

“Temos todo um património histórico onde muitas vezes não está a ser tida em conta a necessidade de reforçar as estruturas e de fazer uma análise sísmica aos edifícios. Infelizmente não é uma obrigação, porque há um decreto que foi publicado para facilitar a reabilitação urbana e veio isentar essa análise sísmica durante sete anos”, lamenta.

A responsabilidade, apontou Mineiro Aires, não é tanto dos proprietários mas, sim, dos vendedores.

“Se há quem a faça e tenha noção de que está a fazer as coisas em condições, nomeadamente os grandes edifícios que se veem que ficam todos com o miolo à mostra e em que fazem estruturas interiores, há outros em que não está a ser feito isso, estão a fazer simples operações de cosmética, muitas vezes executadas por pessoas que desconhecem inclusivamente as consequências de estarem a derrubar paredes.”

No fundo, acusa o bastonário dos engenheiros, aparece um produto que é “apetecível” do ponto de vista comercial, “que têm umas cores garridas e tem um aspeto moderno”, mas os proprietários “estão a comprar gato por lebre ao preço do ouro”.

Como alterar isto? A legislação europeia pode ser útil, explica Mineiro Aires, mas há ainda que introduzi-la em Portugal.

“Recordo também que há legislação em que Portugal teve um papel importantíssimo, que são os eurocódigos, que já deviam ter sido transpostos para a legislação portuguesa e que ainda não foram. Não tenho dúvida nenhuma que é possível fazer mais do ponto de vista legislativo. Hoje, as câmaras municipais também não fiscalizam os projetos, não aprovam os projetos e, portanto, há uma série de coisas que estão a ser feitas um pouco à margem daquilo que a Ordem dos Engenheiros entende que deviam ser as obrigações”, explica.

Por fim, Carlos Aires lembra que a gentrificação nas grandes cidades, sobretudo Lisboa, tem sido um obstáculo à prevenção sísmica dos edifícios.

“Outra questão que eu chamo à atenção é a transformação de habitações que eram de uso familiar para uso coletivo. Há muitos andares daqueles de antigamente das famílias grandes, com dez, doze divisões, que estão a ser utilizados para uso coletivo para fins turísticos e são normalmente também andares com uma idade grande, com soalhos em madeira, que também têm um risco de acidente.”

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