23 jan, 2025 - 19:01 • Salomé Esteves
“Eu não vou pedir desculpa por pedir misericórdia.” Com o sermão da missa inaugural do recém-empossado Donald Trump como Presidente dos Estados Unidos, a bispa Mariann Edgar Budde tentou “fazer com que alguém em quem foi confiada tremenda influência e poder tivesse misericórdia pelos que são mais vulneráveis”.
Num sermão de nove minutos, em que se dirigiu a Trump, ao vice-presidente, JD Vance, e aos seus familiares, a líder espiritual da Diocese de Washington apelou à misericórdia a comunidades normalmente marginalizadas como imigrantes e pessoas LGBTQIAPN+.
Mas Donald Trump declarou que “não foi grande sermão”. E, horas depois, numa publicação da rede social Truth Social, acusou Mariann Edgar Budde de ser uma “esquerdista radical que odeia Trump” e de não ser “muito boa no seu trabalho”.
Aos 65 anos, a Mariann Edgar Budde não se revê nas críticas de Donald Trump nem se assume como progressista, mesmo com uma longa carreira de religião e ativismo. A Donald Trump, Budde respondeu “o senhor Presidente não me conhece e eu não sou essa pessoa".
Depois do sermão, reconhece que “é sempre preciso ter audácia para falar diretamente para alguém a partir do púlpito”. Mas, apesar dos nervos que antecederam o discurso, a bispa lembra ao canal de televisão estaduniese MSNBC, que, no exercício da fé o essencial é “agir como exemplo” e, segundo “os ensinamentos da fé”, “receber estranhos, amar como somos amados, a ter compaixão”.
E apesar de ter recebido apoio e agradecimentos do público - incluindo de Bernice King, filha de Matin Luther King - e de outros religiosos, surgiu, também, uma onda de críticas, de ódio e de ataques pessoais.
“Algumas pessoas gostariam que eu morresse, não ameaçaram matar-me, mas parece que estariam contentes que eu chegasse ao meu destino final mais cedo”, partilhou em entrevista à CNN. Budde confessa ao mesmo canal que “o nível de ódio que o sermão teve noutras pessoas” é “desanimador”, ainda que, na sua opinião, tenha sido “um sermão suave”.
Nas entrevistas que tem dado desde a missa de terça-feira, em Washington, Mariann Edgar Budde tem reforçado que “a cultura do desprezo está a ameaçar destruir-nos". A bispa acredita que, hoje, a resposta para a discordância é cada vez mais o ódio, em vez do diálogo. “E estou a sentir um pouco isso esta semana”, conta à revista Time.
No final de contas, a bispa não sente que a sua segurança está em perigo: “quem está em perigo são as pessoas que têm medo de ser deportadas” e “os jovens que sentem que não podem ser eles próprios em segurança”.
Ao ocupar o cargo de líder espiritual da Diocese de Washington desde 2011, esta não foi a primeira mensagem para Donald Trump. Em 2020, a Budde escreveu um artigo de opinião no The New York Times, em que condenava Trump por “usar símbolos de autoridade espiritual ao mesmo tempo que defende posições antitéticas à Bíblia”.
A líder espiritual mostrava-se “indignada" com o Presidente na altura em funções por ter posado para uma fotografia em frente a uma igreja, com a bíblia na mão, depois de ter mobilizado a Guarda Nacional para dispersar uma manifestação em nome de George Floyd, com explivos e gás pimenta.
Nesse mês de junho, Budde já notava que “se o Presidente tivesse aberto a Bíblia que segurava, podia ler as passagens que nos chamam para amar a Deus e ao nosso vizinho, para procurar Deus nas faces de estranhos e para, até, amar os nossos inimigos”.
Budde foi a primeira mulher líder espiritual na Diocese Episcopal de Washignton. Por ocupar este cargo desde 2011, também participou em várias das anteriores missas inaugurais que seguem a tomada de posse do Presidente dos Estados Unidos, incluindo na primeira celebração de Donald Trump, em 2016.
Antes de assumir a liderança da Diocese de Washington, Budde serviu como sacerdotisa em Minneapolis, no estado do Minnesota, durante 18 anos.