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Chissano à Renascença. Posição irredutível dos manifestantes em Moçambique "está quase a equiparar-se a golpe de Estado"

08 nov, 2024 - 20:16 • Pedro Mesquita

"Não sei se é conveniente que haja pressões...seja da União Europeia ou seja de que quem for", sobre o Conselho de Constitucional, afirma o antigo Presidente moçambicano em entrevista à Renascença.

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Chissano à Renascença. Posição irredutível dos manifestantes "está quase a equiparar-se a um golpe de Estado"
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Confrontado pela Renascença com os relatórios dos observadores, tanto da União Europeia como da Igreja moçambicana – a apontar para a existência de irregularidades nas últimas eleições, Joaquim Chissano, antigo Presidente de Moçambique durante 19 anos, responde que "o relatório dos observadores não substitui os órgãos eleitorais", e sublinha que cabe ao Conselho Constitucional proclamar o nome do próximo Presidente, seja ele – como espera – Daniel Chapo ou Venâncio Mondlane.

Joaquim Chissano avisa, por outro lado, que os protestos e a violência dos últimos dias, nas ruas de Maputo, têm assumido contornos que fazem lembrar uma tentativa de "tomar o poder por meios inconstitucionais", ou uma tentativa de “golpe de Estado”.

Apesar do anúncio da Comissão Nacional de Eleições, o antigo Presidente de Moçambique Joaquim Chissano assume, em entrevista exclusiva à Renascença, que ainda não qualifica Daniel Chapo como Presidente eleito do país.

"Embora os números possam dar-lhe essa tendência de uma maneira muito forte, é preciso, ainda assim, esperar que o Conselho Constitucional diga que sim, que Chapo ganhou, ou que Venâncio ganhou", sublinha.

Já perante a garantia dos manifestantes, de que só tencionam parar quando Venâncio Mondlane for declarado o vencedor, Joaquim Chissano contrapõe que tal procedimento se aproxima "de uma tomada do poder por meios inconstitucionais, está quase a equiparar-se a um golpe de Estado".

O antigo Presidente apela à calma, apela aos que protestam para que "cumpram a lei das manifestações", e lembra que é preciso esperar pela decisão do Conselho Constitucional.

Confrontado pela Renascença com os relatórios da missão de observadores da União Europeia e da Igreja moçambicana, a apontarem para a existência de irregularidades, Joaquim Chissano sublinha que o relatório dos observadores não substitui os órgãos eleitorais.

"Eu não sei se é conveniente que haja pressões, seja da União Europeia ou seja de que quem for, sobre os órgãos que têm que seguir os trâmites. (...) Uma declaração dos observadores não é uma conclusão do que é 'out come' das eleições. Eu já fui observador, já fui chefe de observações. O relatório que nós apresentamos nunca é uma decisão, não substitui os órgãos eleitorais", defende.

Como olha para a violência, aparentemente crescente, que se instalou em Moçambique, na sequência das eleições?

Com muita pena que aconteçam essas coisas, porque a Comissão Nacional de Eleições pronunciou-se, alguns não concordam, há queixas. Então, o Conselho de Constitucional está a fazer o seu trabalho. Eu penso que devia esperar-se que o Conselho Constitucional se pronuncie também. O Conselho Constitucional tem de ver os documentos que são apresentados, os recursos interpostos pelas partes. O que eles dizem pode ser verdade e pode não ser. Eu costumo esperar pelas instituições. Mesmo quando foi das eleições comigo, como participante, eu sempre esperei.

Não considera ainda, então, que Daniel Chapo ganhou as eleições…

Exatamente. Embora os números possam dar-lhe essa tendência de uma maneira muito forte, é preciso, ainda assim, esperar que o Conselho Constitucional diga que sim, que Chapo ganhou ou que Venâncio ganhou.

Não compreende, portanto, que já existam protestos nas ruas?

Exatamente. E pior, quando são protestos que parecem estar... bom, não parecem, estão misturados com violência. Isso são forças de pressão. Dizem que não vão parar esses distúrbios antes que o Conselho Constitucional proclame a vitória de Venâncio. E, se o procedimento é este, isto está quase próximo de uma tomada do poder por meios inconstitucionais, está quase a equiparar-se a um golpe de Estado. Eu fiz campanha para Venâncio, e continuo a ver com bons olhos que ele seja o vencedor. Os números que estão em frente, mesmo se houver irregularidades, dão-me a impressão de que ele, nem que seja com números mais pequenos, passa, mas não me cabe a mim dizer isso.

Está a aguardar, portanto, por uma decisão do Conselho Constitucional. E aconselha, também, aqueles que se manifestam nas ruas a esperar. Mas eu confronto com aquilo que foi dito, quer pela missão de observação da União Europeia, quer pela própria Igreja, que denunciou a existência de graves irregularidades. Que peso é que têm estas denúncias?

Sim, é o que eu disse, não posso ser um tribunal. Estou a deixar que sejam as instituições a trabalhar. E essa pergunta mesmo, é uma forma de pressão sobre os órgãos. Eu não sei se é conveniente que haja pressões, seja da União Europeia, ou seja de que quem for, sobre os órgãos que têm que seguir os trâmites, não é?

Mas as missões de observação têm, precisamente, essa função de observar.

Está certo. Mas uma declaração dos observadores não é uma conclusão do que é “out come” das eleições. Eu já fui observador, já fui chefe de observações. O relatório que nós damos ali nunca é uma decisão, não substitui os órgãos eleitorais.

Para onde é que esta violência poderá conduzir o país?

Bom, cada dia em que a violência é sempre um retrocesso.

Mas receia que Moçambique possa estar à beira de uma guerra civil?

Isso não sei. Não estou a ver uma guerra civil. Mas, o que realmente não gostei de ouvir foi o pronunciamento de que vai criar-se o terror. O terror foi a palavra utilizada por Venâncio (Mondlane).

Para concluir. O que é que diria às pessoas que estão, neste momento, a manifestar-se nas ruas? O que diria o senhor que foi Presidente de Moçambique durante tantos anos?

Bom. O que eu lhe lhes diria é que, se querem continuar a protestar, pelo menos de não destruam carros e que obedeçam às normas que estão na lei, na lei das manifestações.

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