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Eleições nos EUA

Trump não vai aceitar uma nova derrota, mas desta vez é mais difícil interferir nos resultados

17 out, 2024 - 19:36 • João Pedro Quesado com Reuters

O ex-Presidente tem repetidamente avisado para uma ameaça de fraude eleitoral em larga escala - um tema de Donald Trump desde 2016. Há menos caminhos para alterar resultados legítimos, mas o ataque ao Capitólio de 6 de janeiro de 2021 permanece como aviso do que pode acontecer.

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O candidato presidencial republicano Donald Trump disse que, se não vencer as eleições presidenciais de 2024 nos Estados Unidos da América, a 5 de novembro, vai alegar fraude e não aceitar os resultados - tal como fez em 2020, quando perdeu para o democrata Joe Biden, então eleito Presidente.

"Se eu perder - vou dizer uma coisa, é possível. Porque eles fazem batota. Essa é a única maneira de perdermos, porque eles fazem batota", disse Trump num comício no estado decisivo do Michigan, em setembro.

A recusa de Trump em aceitar a vitória da rival democrata Kamala Harris arrisca atirar os Estados Unidos para um clima de instabilidade política, num momento em que o país já está profundamente dividido entre democratas e republicanos.

Depois de Trump perder a eleição de 2020, ele e os seus aliados tentaram anular o resultado através de dezenas de ações judiciais que, no fim das contas, não conseguiram alterar nem atrasar a contagem dos votos.

Caos, violência e mortes. A invasão ao Capitólio em cinco minutos
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O ex-Presidente também pressionou as autoridades na Geórgia para "encontrar" mais votos, e os seus apoiantes invadiram o Capitólio dos EUA a 6 de janeiro de 2021, numa tentativa frustrada de impedir que o então vice-presidente, Mike Pence, certificasse a vitória de Biden.

Uma diferença fundamental é que, desta vez, Donald Trump não tem os mesmos poderes presidenciais que tinha em 2020. Outra é que os estados e o Congresso aprovaram novas leis, pensadas para dificultar a interferência nos resultados das eleições.

Ainda assim, Trump e os seus aliados estão há meses a preparar o terreno para protestar em caso de derrota a 5 de novembro. O nomeado republicano pode contestar uma vitória de Harris nos tribunais, ou apenas levantar dúvidas sobre a validade da vitória entre os apoiantes - o que pode criar episódios tão ou mais graves do que o ataque de 2021 ao Congresso norte-americano.

Contagem de votos prolongada

Tanto republicanos como democratas consideram que a contagem de votos se pode arrastar por vários dias após 5 de novembro, enquanto os votos enviados por correspondência são contados e organizados, e outros votos são verificados.

Se, durante o processo, parecer que Trump está a perder, a demora vai dar uma nova oportunidade de alegar fraude e tentar sabotar a confiança nos funcionários eleitorais, ao mesmo tempo que pode incitar os seus apoiantes a protestar. O ex-Presidente ameaçou prender funcionários eleitorais e outros funcionários públicos por “comportamento inescrupuloso” - embora precise de vencer a eleição para levar isso a cabo.

Trump pode apresentar caso diretamente ao público norte-americano sem esperar por provas, utilizando redes sociais, conferências de imprensa e entrevistas.

"O Presidente Trump deixou muito claro que temos de ter uma eleição livre e justa", apontou Karoline Leavitt, porta-voz da campanha de Trump. A campanha de Kamala Harris não respondeu à Reuters..

Estados decisivos, palco da batalha judicial

Os republicanos já entregaram em tribunal, de forma preventiva, mais de 100 ações judiciais nos sete estados decisivos que vão decidirão a eleição. O objetivo é preparar o terreno para contestações pós-eleitorais, incluindo alegações, sem provas, de que não-cidadãos vão votar em grande número.

Ambos os partidos planeiam enviar milhares de voluntários treinados, chamados fiscais eleitorais, para monitorizar a eleição e a contagem de votos, com a missão de relatar quaisquer irregularidades de que suspeitem.

Alguns ativistas dos direitos de voto estão preocupados que os fiscais eleitorais do Partido Republicano possam ser disruptivos para o processo eleitoral. O partido diz que os voluntários foram treinados para respeitar a lei.

Assim como fizeram em 2020, os aliados de Trump nestes sete estados decisivos - autoridades eleitorais locais, legisladores estaduais e até juízes - podem tentar atrasar a certificação, que consiste na confirmação da contagem oficial de um estado, através de alegações de fraude.

Esses esforços não foram bem sucedidas na última eleição presidencial, e vários especialistas em direito eleitoral asseguram que as leis nesses estados - Pensilvânia, Michigan, Wisconsin, Carolina do Norte, Geórgia, Arizona e Nevada - deixam claro que as autoridades locais não têm poder para rejeitar boletins de voto ou interferir no processo de contagem dos votos.

Cinco dos sete estados decisivos têm governadores democratas. Contudo, ativistas democratas estão preocupados com a Geórgia, cujo comissão estadual eleitoral recentemente deu poderes sem precedentes às autoridades locais para liderar investigações - uma medida que, segundo os ativistas, pode dar espaço para atores de má-fé que tentam contestar ou atrasar a contagem de votos.

No entanto, um juiz da Geórgia decidiu esta semana que as autoridades locais devem certificar os resultados obtidos, e não têm poder discricionário para não o fazer.

O processo eleitoral dos EUA estabelece que todos os estados devem enviar os seus totais de votos certificados antes de o Colégio Eleitoral se reunir, em dezembro, para os eleitores votarem conforme os resultados e leis eleitorais de cada estado. Esse voto é então entregue ao Congresso para a certificação final, a 6 de janeiro.

Os desafios judiciais e atrasos na certificação inspirados por Trump podem fazer com que um estado não cumpra o prazo de submissão. Isso pode dar argumentos para objeções republicanas no Congresso.

Alguns especialistas em direito eleitoral alertam que é difícil prever como novas disputas legais sobre a certificação eleitoral podem ser resolvidas, especialmente se forem decididas por juízes simpáticos às alegações de Trump.

Congresso tem a última palavra

Após a eleição de 2020, o Congresso aprovou uma lei, o Ato de Reforma da Contagem Eleitoral e Melhoria da Transição Presidencial, que torna mais difícil para um candidato enfrentar o tipo de desafio que Trump tentou montar.

A lei deixa claro que o vice-presidente, que na certificação eleitoral das eleições de 2024 vai ser Kamala Harris, não tem autoridade para atrasar a certificação nacional, nem sequer rejeitar os resultados de um estado, como Trump exigiu que Pence fizesse em 2020.

A lei atualmente em vigor também estabelece que uma objeção à contagem eleitoral de um estado não pode ser apresentada sem que um quinto dos membros de cada câmara do Congresso (Câmara dos Representantes e Senado) concorde. Depois disso, é preciso uma votação por maioria em cada câmara para que uma objeção seja considerada válida.

No improvável resultado de que votos eleitorais suficientes sejam lançados de forma que nenhum candidato alcance a maioria necessária, a recém-eleita Câmara dos Representantes dos EUA escolhe o próximo presidente, com a delegação de cada um dos 50 estados a ter direito a um único voto, decidido entre os congressistas eleitos. Esse cenário dá, em princípio, vantagem ao nomeado republicano.

Violência pode ser contra funcionários eleitorais

Qualquer esforço de Trump para sugerir que a eleição foi alvo de fraude pode levar a agitação civil, como aconteceu a 6 de janeiro de 2021.

Especialistas que monitorizam grupos militantes de direita, como Peter Montgomery, do "People For the American Way" (um "think tank" liberal), dizem que estão menos preocupados com uma resposta violenta desses grupos do que com ameaças contra os trabalhadores nas urnas. Também pode haver manifestações violentas nas capitais dos estados decisivos, disse Montgomery.

Centenas de pessoas envolvidas no ataque de 6 de janeiro ao Capitólio foram condenadas e presas, uma poderoso dissuasão para grupos que possam estar a considerar levar a cabo ações semelhantes.

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