​Rishi Sunak: um bilionário em Downing Street

24 out, 2022 - 14:43 • António Fernandes, correspondente em Londres

Sunak é o terceiro primeiro-ministro britânico em sete semanas.

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Rishi Sunak sucede a Truss como primeiro-ministro do Reino Unido
Rishi Sunak sucede a Truss como primeiro-ministro do Reino Unido

À segunda foi de vez. Nas eleições internas do Partido Conservador britânico que decorreram durante o verão, as discussões em campanha centraram-se principalmente nos impostos. Rishi Sunak defendia que não era tempo de reduzir os impostos e avisava contra as consequências caso esse caminho fosse tomado.

Liz Truss chamou a esse discurso parte do “Projecto Medo” - a mesma linguagem utilizada contra os avisos daqueles que não queriam sair da União Europeia aquando do referendo do Brexit - e prometeu baixar os impostos. Sunak ganhou o apoio dos deputados, mas foi Truss quem ganhou junto dos membros do partido e chegou a primeira-ministra do Reino Unido.

Agora, depois do falhanço completo do seu plano económico ainda antes de começar, Truss sai de Downing Street sete semanas depois, ficando na história como o mandato mais curto da história da política britânica. “Oh dear, oh dear”, diria de novo o Rei Carlos III, imaginamos. Já Sunak chega a primeiro-ministro exatamente com a mesma agenda, mas com ainda mais desafios.

Uma eleição atrás de portas fechadas

No verão as eleições envolveram várias rondas de votações dos deputados até sobrarem só dois candidatos. Depois Liz Truss e Rishi Sunak passaram quase dois meses em campanha, andando pelo país, indo a debates, dando entrevistas. A campanha durou mais que o próprio mandato de Truss.

Desta vez, não só o período eleitoral foi apenas de cinco dias como praticamente não ouvimos nada dos candidatos. Primeiro, porque nem sabíamos com toda a certeza quem seriam os candidatos. Inicialmente só Penny Mordaunt, atual líder da bancada parlamentar, confirmou oficialmente a sua candidatura e foi a única que deu entrevistas.

Sunak confirmou a sua candidatura com um comunicado enquanto Boris Johnson usou também um comunicado, mas para dizer que não era candidato.

Atrás de portas, nos corredores de Westminster, um rodopio constante para convencer deputados a apoiar as diferentes campanhas. Johnson garante que tinha o apoio necessário para ser candidato (eram precisas 100 nomeações), mas esses números nunca foram confirmados e, quando alguns nomes importantes apoiaram Sunak, saiu da corrida indo contra-corrente do que diziam os seus apoiantes.

Por fim, depois da retirada de Johnson, sobrava Penny Mordaunt. Incapaz de reunir 100 apoiantes, a líder parlamentar conservadora desistiu em favor no último minuto antes de se acabar o tempo para submeter a candidatura.

Sunak acaba por ser eleito primeiro-ministro por ser o único candidato que se qualificou, sem ter feito uma campanha pública e sem a votação chegar aos membros do partido.

Em tempos, Harold Wilson, então primeiro-ministro, disse que “em política uma semana era muito tempo”. Nunca isso foi tão verdade como nesta louca semana em que o Governo abdicou do seu plano económico, caiu e um novo primeiro-ministro vai tomar posse.

Quem é Rishi Sunak?

Aos 42 anos, Rishi Sunak chega a primeiro-ministro. É o primeiro descendente de asiáticos a chegar a Downing Street.

Os pais, hindus, mudaram-se para o Reino Unido ainda antes de Sunak nascer. O pai trabalhou como médico de saúde, a mãe tinha uma farmácia. Tendo crescido numa família Hindu, Sunak reforça a importância da identidade, mas fala de experiências negativas com racismo na infância e diz que são momentos que ficam “gravados na memória”.

Adolescente, aproveitava as férias para trabalhar num restaurante, tendo-se formado em Oxford onde estudou Filosofia, Economia e Política. Seguiu-se um MBA em Stanford, nos EUA, onde conheceu a sua mulher, Askhata Murty, filha de um bilionário indiano.

Sunak trabalhou em altos cargos na banca de investimento antes de se dedicar à política. Tornou-se deputado em 2015 e fez campanha pela saída do Reino Unido da União Europeia, dizendo acreditar que “um sistema de imigração pode beneficiar o país” e que o Brexit “podia tornar o Reino Unido num “país mais livre e justo. Há três anos era já uma estrela em ascensão dentro do Partido Conservador.

Por isso mesmo, em fevereiro de 2020, assumiu a pasta das Finanças. Em março, o Reino Unido entrava em quarentena. O enorme desafio da pandemia e a forma como lidou com ele, com esquemas de ajuda a restaurantes e de apoio ao lay-off, valeram-lhe uma subida incrível de popularidade e tornou-se num nome consensual como o sucessor de Boris Johnson.

No meio dos escândalos que envolveram a liderança de Johnson, Sunak foi um dos primeiros ministros a demitir-se num dominó de demissões no Governo que forçou a saída de Johnson.

Inicialmente apontado como o principal favorito - tendo ganho o apoio dos deputados - Sunak acabou por perder para Liz Truss. Muitos dos membros, ainda fãs de Johnson, não o perdoaram pela demissão que consideram uma facada nas costas. Outros acusam-no de ser desligado da realidade, de não perceber os problemas dos comuns mortais por integrar a lista dos mais ricos do Reino Unido.

Sempre elegante, na campanha do verão foi criticado por isso mesmo, com o custo dos seus fatos e sapatos trazido para o debate eleitoral. Quando lhe perguntaram se era demasiado rico para ser primeiro-ministro, Sunak reforçou que como ministro das Finanças ajudou “sempre os mais necessitados”.

Chega a Downing Street à segunda tentativa, mas sem passar por legislativas.

Sem tempo a perder

Sunak não terá muito tempo para celebrar a vitória. Inflação galopante, guerra na Ucrânia, crise energética. Todos os problemas que Liz Truss já enfrentava, agudizados pelo falhanço do plano económico de Truss que deixou um ainda maior buraco nas finanças britânicas.

De certa forma, a reversão do plano de Truss vai já ao encontro do que Sunak defendia - não é possível baixar os impostos até controlar a inflação. Em cima disso serão precisos cortes na despesa e que devem ser anunciados já a 31 de outubro. Um cocktail tóxico para a popularidade.

Os mercados já estão a reagir positivamente a Sunak, mas não deixa de ser uma missão impossível. Tem apenas dois anos para liderar um país em crise, a atravessar a travessia da austeridade, a ameaça de um referendo de independência na Escócia e o protocolo da Irlanda do Norte, pós-Brexit, para resolver.

Para além disso, não está a começar do zero: os conservadores estão muito atrás dos trabalhistas nas sondagens, um cenário que piorou depois do caos dos últimos meses em Downing Street e no Parlamento.

Conseguirá recuperar a imagem dos conservadores? A sua campanha para as próximas legislativas começa agora.

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