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Eleições no Brasil

Lula, o sindicalista que quer voltar ao Planalto

02 out, 2022 - 23:33 • Fábio Monteiro

Aos cinco anos, já vendia tapioca e laranjas no mercado de Santos. Entrou na política pela porta de um sindicato. E durante muito tempo foi marxista. Depois de 2018 ter sido afastado da corrida, Lula da Silva quer voltar ao palácio do Planalto. Mas para isso terá de derrotar Jair Bolsonaro na segunda volta, a 30 de outubro.

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30 de outubro de 2022: eis a nova data decisiva no calendário de Lula da Silva. Depois de muitas sondagens terem dado como provável uma vitória do ex-Presidente na primeira volta, ainda não foi desta que a disputa com Jair Bolsonaro teve ponto final.

Na primeira volta, Lula amealhou pouco mais de 48% dos votos, enquanto Bolsonaro ficou com menos de 44% de votos. Uma diferença mais curta do que previram algumas sondagens e nenhum com os 50% necessários para vencer à primeira.

Anunciados os resultados, sublinhou aos seus apoiantes num hotel de São Paulo que "isto foi só uma prorrogação" da sua vitória, depois de ter sido "um ser humano jogado fora da política" nas últimas presidenciais.

Há quatro anos, o nome de Lula da Silva não constou do boletim de voto das eleições no Brasil. Fernando Haddad ainda tentou manter o Partido dos Trabalhadores (PT) no poder, mas foi o popular e populista Jair Bolsonaro quem ganhou. Uma condenação por corrupção e branqueamento de capitais afastou o candidato do PT, que, entre 2003 e 2011, já fora o principal hóspede do palácio do Planalto.

Houve então quem afirmasse que a vida política de Lula tinha acabado de ser terminada. Mas, em 2021, tudo mudou: o julgamento, que teve por base o alegado recebimento de um apartamento em troca de cedência de contratos da Petrobas à construtora OAS, foi anulado.

E assim, renascido, na luta mais uma vez, Lula voltoupor um bilhete de regresso ao Planalto. Queria regressar ao sítio onde já foi feliz para “normalizar a democracia”, após os quatro anos cheios de solavancos com Bolsonaro no leme.

Queria também fazer muitos brasileiros felizes. No período de oito anos em que liderou o Brasil, a pobreza diminuiu mais de 50% no país. Quando cedeu o lugar no Planalto a Dilma Rousseff, tinha o apoio de 87% dos brasileiros.

Uma vida de lutas

Lula da Silva nasceu a 27 de outubro de 1942. E não se pode dizer que, como outros políticos da sua geração, que tenha nascido num berço de ouro. Aos cinco anos, já vendia tapioca e laranjas, no mercado de Santos.

O seu pai, Aristides da Silva, era um camponês alcoólico e analfabeto que teve 22 filhos de duas mulheres, primas entre si: Lindu, mãe de Lula, e Valdomira. Ainda Lula era um bebé, Aristide fugiu com Valdomira para São Paulo.

Deixada para trás na miséria, Lindu agarrou nos filhos e meteu-se num camião e viajou 3 mil quilómetros para Santos, para aí recomeçar do zero. Foi nessa cidade que Lula estudou e, mais tarde, fez formação de torneiro mecânico.

Ativismo e sindicalismo

Aos 18 anos, Lula entrou para o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, tendo subido até à liderança, de onde liderou o maior movimento operário da história do Brasil.

Marxista por convicção, em 1980 aproveitou a liberdade política entretanto conquistada no Brasil e fundou o Partido dos Trabalhadores (PT), que nasceu trotskista, mas que, com o passar dos anos havia de situar-se no centro-esquerda.

Lula da Silva foi candidato presidencial em 1989, 1994, 1998 e, finalmente, em 2002, ganhou a corrida. Em vez de descamisado e com o punho erguido a gritar “revolução”, como em eleições anteriores, apresentou-se de fato e gravata, defendendo “paz e amor”.

Anos no poder (e problemas)

Em 2003, quando chegou ao poder, a primeira grande iniciativa política de Lula foi levar os ministros para fora do gabinete. Era preciso que os nascidos em berço de ouro "sentissem o cheiro da pobreza", defendeu.

Com uma política económica ortodoxa, não teve praticamente oposição nos primeiros dois anos de mandato, durante os quais as suas preocupações sociais escondiam a falta de realizações políticas. Nessa altura, é 'apanhado' no primeiro escândalo de corrupção (Mensalão) que decapita a liderança do PT.

Lula da Silva, pragmático, distancia-se do seu partido e vai a votos com o apoio do centro e direita, ganhando novamente a eleição de 2006.

O segundo mandato é suportado por uma ampla, mas dissonante coligação, o que dificulta a ação política, mas que Lula considera fazer parte da vida devido à "correlação de forças políticas".

Depois de oito anos no poder

Por momentos, fora do Brasil, Lula foi uma estrela: em 2008, a revista “Newsweek” incluiu-o na lista de 20 pessoas mais influentes do mundo; em 2009 o francês Le Monde e o espanhol El Pais consideram-no 'Homem do Ano'.

Depois de deixar o poder a Dilma Rousseff, Lula da Silva criou um instituto com o seu nome e usou a sua popularidade para fazer o chamado “circuito das palestras” - muitas delas pagas por empresas por empresas que, anos mais tarde, estariam sob investigação judicial.

Em março de 2016, um novo capítulo começou na vida do ex-Presidente, quando foi preso pela Polícia Federal. Foi levado da sua casa, na periferia de São Paulo, para depor na polícia, na altura suspeito de ter enriquecido ilegalmente com a corrupção na Petrobras.

Dois anos mais tarde, seria condenado e impedido de entrar na corrida das presidenciais. Esta noite, Lula tentou corrigir a história. A sua e a do Brasil. Mas ainda não foi desta.

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