03 mar, 2022 - 17:46 • Liliana Monteiro
Putin vai um dia sentar-se em tribunal? Anabela Alves, advogada de direito internacional, formadora de juízes na área dos crimes de guerra, ex-membro do grupo de advogados que acompanharam o tribunal, responde: “O Tribunal Penal Internacional (TPI) julgará responsáveis máximos por crimes. Agora se Putin será levado para Haia ou não, confesso que isso seria idealismo a mais. Putin tem uma potência nuclear conhecida por todos, mas os seus generais podem ser chamados”.
Anabela Alves recorda que “ninguém acreditava que Milosevic (Presidente Sérvio e da antiga Jugoslávia) ia ser julgado, que se ia sentar acusado no tribunal e aconteceu” e acredita que “vai acabar esta impunidade, não é a primeira vez que Putin invade um país e comete crimes de guerra e desta vez a justiça vai prevalecer, estou muito confiante”.
São já 38 os países (entre eles Portugal) que submeteram formalmente uma informação de crimes de guerra que podem ter sido cometidos na Ucrânia. Ação esta reconhecida já como a maior da história.
O procurador-geral Karim Khan prometeu já abrir investigações “independentes e objetivas” tão rapidamente quanto possível.
Das penas previstas “só está excluída a pena de morte”, explica esta especialista que acrescenta que a pena terá em conta o número e a gravidade de crimes provados assim como o número de vítimas.
O artigo 78 do Estatuto de Roma é claro, a pena não pode exceder os 30 anos de prisão. Não está prevista a pena de morte, mas existe a possibilidade de uma condenação a uma pena perpétua, a cumprir num país europeu. Anabela Alves refere que todos os estados colaboram com o TPI.
Já houve 39 estados que encaminharam suspeitas de (...)
“No caso da Ucrânia os crimes estão a ser cometidos em direto, a prova está mais acessível”, explicando que o procurador do TPI pode autonomamente começar a investigar uma situação, mas que o pedido formulado vai acelerar o âmbito de trabalhos.
“Ele já tem uma equipa a investigar e vai começar a ouvir testemunhos, já tem investigadores no terreno”, acrescentando, que são “peritos, advogados sénior, investigadores, psicólogos, assistentes jurídicos, alguns já integrando uma equipa que está na Ucrânia”.
Com a guerra a decorrer há diligências que se tornam mais perigosas por outro lado lembra que os “testemunhos são mais claros porque a vítima está agora a sofrer, não é como no Camboja ou outros tribunais que demoraram muito tempo, perderam testemunhas que já não queriam depois colaborar porque já não tinham fé”.
Anabela Alves, especialista em direito internacional, revela que a prova agora recolhida “não vai levantar dúvidas porque os testemunhos estão frescos nesta altura” e isso é fundamental para a investigação. Investigação essa que por norma é longa porque os crimes são complexos. “O procurador Karim Khan vai conseguir fazer um bom trabalho”, acredita.
Esta especialista lembra que as convenções regulam o direito internacional e os modos como se pode, ou não, fazer uma guerra.
“Quem pode ser bombardeado e o que não pode, há coisas que numa guerra não podem ser feitas! Um exemplo: bombardeamento de hospitais, escolas, jardins de infância, matar civis de forma indiscriminada, que tentam fugir e já há relatório disso nesta guerra. Marcarem casas residenciais e civis para atacar, também há relatórios que mostram a existência disso. Tudo isto são crimes de guerra”.
E Anabela Alves dá ainda outro exemplo: “há um relatório do ataque à ilha Ucraniana. Soldados jovens -que não se sabe se morreram ou não. Os prisioneiros de guerra não podem ser mortos, tem de haver uma troca no fim do conflito”.