Nova Iorque, eua

De aclamado a acusado: a queda em desgraça do governador Cuomo

04 ago, 2021 - 13:25 • Hélio Carvalho

Durante a pandemia, a gestão de Andrew Cuomo foi elogiada pelo seu partido e pela comunidade internacional, considerada uma lufada de bom senso face ao Governo nacional de Trump. Mas as histórias de assédio sexual multiplicaram-se e Cuomo tornou-se indefensável.

A+ / A-

Cento e sessenta e cinco páginas, 179 testemunhas e mais de 74 mil provas depois, Andrew Cuomo está a navegar sozinho na política americana.

O relatório minucioso da procuradora-geral de Nova Iorque, Letitia James, detalha onze casos de assédio sexual de Cuomo com funcionárias, antigas e atuais, além de descrever possíveis violações de leis estatais e federais.

Entre as acusações, há muitos relatos de toques indesejados pelo pescoço e pelo peito, de Cuomo a agarrar no rabo de funcionárias, de lhes perguntar porque não usam vestido, e o relatório acusa-o de fomentar um ambiente "que permite o assédio".

Andrew Cuomo tentou defender-se na terça-feira, depois de o relatório ter sido apresentado. Numa conferência de imprensa insólita, Cuomo procurou argumentar que os seus beijos nas mãos e os abraços não são mais que um reflexo "caloroso" dos gestos dos pais, e a sua equipa passou um vídeo de outros políticos e Presidentes a abraçarem pessoas - algo completamente diferente das acusações e dos contextos em que Cuomo terá assediado funcionárias.

Há muitas consequências políticas que se vão desenrolar nos próximos tempos, mas a consequência direta para Cuomo poderá ser uma investigação criminal. O Ministério Público de Albany, no estado de Nova Iorque, já avisou que iria seguir com uma investigação aos relatos do relatório, e pediu a outras vítimas que entrassem em contacto com os advogados.

O relatório apresentado na terça-feira foi o resultado de uma investigação pedida pelo próprio Andrew Cuomo, quando as primeiras acusações foram conhecidas.

Sem rede de segurança

A imagem que Cuomo procurou pintar para os eleitores contrasta de forma gritante com o relatório, e a verdade é que poucos acreditam no governador.

Quando as primeiras acusações surgiram, a equipa de Cuomo foi imediata na sua campanha de descredibilização das vítimas. Colegas do Partido Democrata abstiveram-se de comentar o caso, não querendo que a boa gestão da pandemia por parte de um democrata fosse manchada.

Nas horas a que se seguiram ao relatório, o apoio a Cuomo caiu completamente.

O Presidente Joe Biden, também ele do Partido Democrata, encabeça as vozes que pediram a demissão do governador. "Acho que se devia demitir", respondeu Biden na terça-feira.

A perda do apoio de Biden foi notável: o Presidente e o governador foram apoiantes um do outro em vários assuntos, especialmente na gestão da pandemia, e os dois foram a funerais de membros próximos da família de cada um.

A Biden seguiram-se as maiores figuras do partido. Nancy Pelosi, speaker da Câmara dos Representantes, também ela com ligações próximas à família de Andrew Cuomo, elogiou em comunicado as mulheres que se chegaram à frente e pediu a demissão do governador.

E todos os membros da delegação democrata de Nova Iorque no Congresso americano retiraram o seu apoio a Cuomo, especialmente congressistas importantes para o voto da comunidade negra nova-iorquina.

Até o New York Times, que destacou continuamente a gestão da pandemia de Cuomo em contraponto com o caos da administração de Donald Trump, publicou esta quarta-feira um editorial ríspido sobre as ações do governador. "Independentemente do que possa acontecer na justiça. o governador só tem uma opção: ele deve demitir-se".

Mais um impeachment a caminho

Andrew Cuomo, no vídeo em que reiterou a sua inocência, foi perentório. "Nunca toquei em ninguém de forma inaproriada ou fiz avanços inapropriados", garantiu. E não se demitiu.

Mas talvez não seja necessário que Cuomo saia voluntariamente da casa do governador para o lugar ficar desocupado. Em Nova Iorque, já arrancou a investigação do Senado estatal para decidir se seguir com o processo de exoneração, ou impeachment, é a melhor opção.

A decisão está nas mãos de Carl E. Heastie, o speaker do Senado estatal de Nova Iorque. Heastie também pediu a Cuomo que se demitisse e, segundo o New York Times, reuniu-se com membros da assembleia para discutir a decisão de exonerar o governador.

Essa investigação do Senado também estará próxima de estar concluída, segundo confirmou Heastie na terça-feira, apesar do New York Times avisar que a investigação poderá durar um mês.

Mesmo com uma possível longo tempo de espera - à abertura do processo de exoneração, seguir-se-á um julgamento e depois um voto do Senado estatal -, os próprios democratas estão confiantes de que Cuomo será afastado do lugar.

Amy Paulin, democrata da assembleia do Senado de Nova Iorque, disse ao NYT que seria "impossível" não avançar com o processo de impeachment.

"O governador tem de se demitir, e se não se demitir, vamos ter de avançar com o processo de exoneração", afirmou Paulin.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

  • Bruno
    06 ago, 2021 aqui 03:44
    Fui consultar um tratado de Anatomia e não encontrei nenhuma estrutura anatómica com.o nome de "rabo". Creio que o artigo se refere à região glútea quando utiliza este calão.

Destaques V+