13 nov, 2024 - 18:00 • Alexandre Abrantes Neves
Estamos “cada vez mais sensibilizados” para o tema da sustentabilidade? Sim. Mas ignoramos se as marcas dos produtos estão preocupadas com o planeta e a sociedade? Também sim. Então porque é que somos contraditórios? Simples – há “demasiada pressão”.
Frederico Fezas Vital, professor na Universidade Católica de Lisboa nos temas de sustentabilidade e empreendedorismo, simplifica a fatura da sociedade de consumo atual: ter “sempre alguém a cutucar, a dizer que podíamos estar a fazer melhor em termos de sustentabilidade” tem um preço elevado para o planeta e só vai tornar os comportamentos responsáveis cada vez mais de nicho.
Por isso, e para fazer "checkout" de vez nos comportamentos consumistas e irrefletidos, são precisos incentivos e não reprimendas.
“Não é com pressão, não é pela negativa. Tem de se envolver as pessoas nos resultados. Tem de se demonstrar pela prática que aquilo é melhor para a vida da pessoa e ela tem de o perceber. E a ‘no bullshit approach’ (em português, ‘abordagem sem tretas’) pode funcionar, dizermos às pessoas como as coisas funcionam”, assinala.
Estudo
Número consta do relatório “CTT e-Commerce Report (...)
E se pusermos a receita em curso, o bolo pode mesmo sair melhor do que tem sido até agora: segundo o Relatório Europeu de Consumidores e Pagamentos da consultora INTRUM, mais de 60% dos jovens aumentaram o número de compras por impulso nos últimos dois anos.
Fezas Vital culpa as “técnicas de marketing poderosíssimas”, mas mostra-se otimista quanto à “consciência crescente dos jovens que vem pelo conhecimento” – e aqui a responsabilidade é de todos, principalmente em vésperas de Black Friday. Da família (e os mais velhos que também podem ser contagiados para a sustentabilidade, da escola (e o “muito por fazer” no que toca à literacia financeira”, dos políticos (que têm de corresponder à expectativa de “cidadãos emponderados e esclarecidos”). E até das redes sociais.
“Essas plataformas não podem assumir uma postura de: ‘ai, nós apenas disponibilizamos’. Não é viável falar-se em sustentabilidade e depois estar a alimentar o espaço que permite e até incentiva comportamentos contrários. Acho que devemos ser reivindicativos quanto à responsabilidade das plataformas”, apela.
A Diretiva para a Capacitação dos Consumidores para a Transição Ecológica, aprovada pelo Parlamento Europeu no início do ano, obriga as empresas dentro da UE a deixarem de lado formas manipuladoras e superficiais – “quase cliché” – de destacarem o lado sustentável dos produtos.
“Ajuda a mitigar o fenómeno do ‘greenwashing’, do ‘whitewashing’ e de todos os outros ‘washing’. Se as empresas não vão a bem, têm de ser ajudadas a ir lá. É verdade que nós consumidores desconfiamos, mas desconfiamos porque muitas marcas não são transparentes e honestas. Tem de haver uma forma de fazer negócio mais verdadeira”, vaticina, sublinhando que esta postura é ainda mais necessária perante “a aceleração em que vivemos e uma falta de tempo, que nos podem fazer ter um consumo despiciente”.
Ainda em termos europeus, e numa altura em que decorrem a todo o gás as audições para confirmar os nomes propostos para a nova Comissão Europeia, os temas do consumo devem ficar divididos entre várias pastas, como “Ambiente e Economia circular”, “Clima e Crescimento Limpo” e ainda “Startups e Inovação”.
Para este professor universitário, distribuição não tem de ser sinónimo de confusão – aliás, também rima com colaboração. Vai ser preciso esperar para ver, mas aqui deixa-se já um pedido: mudar a forma de comunicar sobre estes temas.
“Se for aos sites da União Europeia, há uma série de reportes e relatórios. Qual é o problema? Ninguém os lê. Eu diria que não é uma questão de quantidade de publicidade institucional, é a forma como se comunica. (…) Era fundamental que houvesse uma aproximação da comunicação para limpar a informação, estar mais acessível e ser menos densa e complexa para chegar às pessoas”, remata.