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Hidrogénio. Casos de justiça e turbulência política “vão atrasar” investimentos de mais de 10 mil milhões

09 nov, 2023 - 06:30 • João Carlos Malta

Investimentos projetados em Sines até ao final da década envolvem vários consórcios nacionais e estrangeiros. Pelo menos um desses projetos está sob investigação judicial e não se sabe quando vai deixar os tribunais. Concretização da "revolução verde" que o hidrogénio trará é fulcral para Portugal atingir as metas de descarbonização da economia estabelecidos por Bruxelas até 2050.

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Os projetos de exploração de hidrogénio em Portugal chegaram a ser apresentados pelo então secretário de Estado da Energia e agora ministro das Infraestruturas, João Galamba, como novas Autoeuropas para Portugal.

Esse futuro ainda não chegou, mas estes já foram investimentos marcantes no país porque entram no rol de casos judiciais que fizeram cair um primeiro-ministro e criaram um processo que fez um ex-ministro e de um atual ministro, Galamba, arguidos.

A polémica política e judicial que envolve Sines pode, na ótica da especialista em hidrogénio e professora da Universidade Nova Lisboa Ana Luísa Fernando, não comprometer estes investimentos a 100%, mas “é natural que atrase” “porque a justiça em Portugal também é muito lenta”.

Poderá criar alguns constrangimentos”, resume.

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"É natural que os investimentos se atrasem, porque a justiça em Portugal também é muito lenta”, Ana Luísa Fernando, especialista em hidrogénio..

Os processos que vão decorrer na Justiça podem fazer com que os consócios não possam executar o que está programado e fazer arrastar o desenvolvimento das unidades projetadas.

As consequências em primeira linha serão, segundo a especialista, para “o consumidor português, porque não terá acesso tão depressa a uma oportunidade da substituição dos combustíveis fósseis pelo hidrogénio”.

Vantagens financeiras

A aposta nesta energia verde, explica a professora da Universidade Nova, traz vantagens nas questões ambientais - que ajudam Portugal a manter-se alinhado com os objetivos da União Europeia de descarbonização da economia até 2050 - mas também será vantajosa no plano financeiro.

“Se deixarmos de depender do exterior, do ponto de vista dos combustíveis fósseis, isso também nos torna mais independentes do ponto de vista económico, deixamos de depender dos problemas que podem surgir a nível Internacional com a venda do petróleo e de combustíveis fósseis”, argumenta Ana Luísa Fernando.

As suspeitas sobre o dossiê do hidrogénio remontam a 2019, quando o empresário Marc Rechter, holandês a viver há vários anos em Portugal, apresentou a João Galamba um projeto de produção de hidrogénio verde em larga escala.

A ideia era a exportação para a Holanda. Galamba tomou nota da ideia e reuniu com várias entidades de forma a que pudesse surgir em Portugal uma fileira de exploração de hidrogénio verde.

Já o holandês levou a ideia do projeto a algumas das maiores empresas portuguesas, incluindo Galp e EDP.

Em 2020, contudo, as maiores empresas acabaram por decidir apresentar um consórcio próprio para o hidrogénio verde e deixar Rechter de fora. O empresário formou, entretanto, um consórcio concorrente, a projeto Green Flamingo.

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"Eu vejo que [a aposta no hidrogénio] podia ser várias Autoeuropas", Ana Luísa Fernando.

No final desse ano, em novembro de 2020, a revista “Sábado” noticiou que estava em curso uma investigação do Ministério Público sobre o hidrogénio, suspeitando do favorecimento dos interesses de empresas como a EDP, Galp e REN.

Sines, uma escola feliz

Ainda que não descurando a ideia de que grandes investimentos possam levar a situações menos claras, a professor Ana Luísa Fernando considera que Sines é uma “escolha feliz” para a aposta no hidrogénio verde.

Os investimentos dos vários consórcios terão um valor global que pode ultrapassar os 10 mil milhões de euros até 2030.

“A ideia de Sines foi uma ideia bem pensada. Estamos a falar num porto que permitiria a exportação também por via marítima do próprio hidrogénio”, diz a especialista da Universidade Nova.

Ana Luísa Fernando explica que a fileira do hidrogénio verde foi arquitetada para estar ligada à refinaria e às várias unidades industriais que existem em Sines. Isso permitiria “a inserção desse hidrogénio na rede de gás natural que é bastante boa”.

“É muito recente [a rede de gás natural]. Portanto, não são necessárias grandes alterações”, concretiza a docente.

"Muitas Autoeuropas"

A especialista também concorda com a comparação feita pelo agora arguido no processo João Galamba, quando encontrou semelhanças entre a Autoeuropa e os investimentos feitos agora em Sines no hidrogénio.

“Eu vejo que podiam ser várias Autoeuropas, eventualmente depois essas várias Autoeuropas poderiam transformar-se apenas numa única centralizada em Sines, precisamente pela localização e pela oportunidade do porto”, afirma, acrescentado que o plano de investimentos para a intermodalidade de transportes será um chamariz para atrair mais investimento estrangeiro que concretize essa ideia de um projeto decisivo para o futuro da economia portuguesa.

A especialista alerta, no entanto, que “não somos o único país na Europa a trabalhar em hidrogénio”.

“Nós temos um vizinho espanhol que também anda a trabalhar nisso e que pode eventualmente também arranjar soluções interessantes”, aponta.

Apesar de tudo, Ana Luísa Fernando está otimista em relação ao futuro destes investimentos, uma vez que muitos deles não dependem do Estado português e do Orçamento do Estado, mas sim de fundos europeus.

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  • Luiz
    11 nov, 2023 SANTO ANTÓNIO DOS CAVALEIROS 18:09
    As Burkas pretas, apostam tudo na política da terra queimada, nem a Santa Inquisição foi tão devassa como estes paquidermes!

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