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Entrevista a Pedro Costa Ferreira

"Devemos ter cuidado com o papel que a TAP tem desempenhado" no crescimento do turismo

21 fev, 2023 - 22:14 • Ana Carrilho

Presidente da Associação das Agências de Viagens também está preocupado com a indecisão do Governo em relação ao novo Aeroporto de Lisboa. "Quase teria mais otimismo relativamente ao regresso de D. Sebastião do que em relação ao aeroporto", afirma.

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Devemos ter cuidado com o papel que a TAP tem desempenhado no crescimento do turismo, alerta Pedro Costa Ferreira, presidente da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo (APAVT), em entrevista à Renascença.

Depois de um bom ano turístico, os portugueses continuam com vontade de viajar, apesar da inflação, os custos da energia e dos alimentares ou as taxas de juros lhes deixarem menos dinheiro na carteira. Proposta não faltam nas agências de viagens, que já têm um bom nível de reservas. Mas o presidente da APAVT prefere mostrar um otimismo moderado.

Pedro Costa Ferreira está satisfeito com o contributo do setor do turismo para o crescimento da economia. Mas mostra-se preocupado com a indecisão do Governo em relação ao novo Aeroporto de Lisboa e com o anúncio de greves na TAP, que têm efeito imediato nas reservas. Não vê qualquer problema na privatização da companhia aérea, desde que se preserve a sua mais-valia: o hub de Lisboa. E sublinha que “devemos ter muito cuidado com o papel que a TAP tem desempenhado no crescimento do turismo em Portugal".

Está satisfeito com os resultados do ano turístico? Foram melhores do que esperava?

Sim, depois de tudo aquilo que passamos, é quase irreal termos chegado ao final de 2022 com estes resultados, embora com respostas assimétricas. É sempre assim num setor económico, mas na sua globalidade julgo que temos resultados muito próximos dos de 2019. Ainda não superámos, mas estaremos um bocadinho abaixo, um bocadinho acima, dependendo dos segmentos. Agora, se pensarmos que no primeiro trimestre de 2022 estivemos dois meses fechados, qualquer de nós assinaria este resultado com um sorriso nos lábios. O que aconteceu foi certamente melhor do que poderíamos esperar.

Dito isto, a crise não mora nas demonstrações de resultados contabilísticos, mora nos balanços. Nós teremos perdido em 2020 e 2021, no setor como um todo, cerca de seis vezes o resultado que obtivemos em 2019. E, portanto, se em 2022 fizemos um resultado semelhante ou um pouco superior a 2019, ótimo. Foi um resultado quase inesperado mas temos, com certeza, uns anos à nossa frente até termos as empresas com os balanços que tínhamos nessa altura.

Entretanto, houve alguns apoios do Governo. As agências de viagens recorreram a esses apoios?

Recorremos durante a pandemia e no início do ano passado. E, em ambos os momentos, os apoios foram absolutamente fundamentais, mas não suficientes. Toda a resposta à crise, do ponto de vista dos empresários, foi muito feita em cima de prejuízos e de endividamento.

Durante a pandemia, o lay-off, o Apoiar.pt, a própria lei dos vouchers, condicionaram – no bom sentido – o funcionamento do mercado e foram muito bem recebidos. Neste início de recuperação, o Consolidar e a nova tranche do Apoiar.pt, sendo verbas que não foram extraordinariamente significativas, foram bem recebidas pelo mercado e julgo que ajudaram a consolidar uma recuperação que é absolutamente visível.

Quantos anos 2022 é que serão necessários para as empresas recuperarem os níveis de saúde financeira que tinham em 2019?

No dia de hoje eu diria que, como perdemos seis vezes o resultado, em matemática pura, se calhar mais quatro ou cinco anos. Em todo o caso, vejo uma dinâmica muito grande, o mercado cresce e o próprio setor turístico português cresce mais do que as expetativas. Se tudo acontecer como até agora, creio que daqui a três anos poderemos atingir os níveis de 2019. Agora, não devemos esquecer que estamos perante uma situação complexa e eu não estou totalmente otimista, mesmo em relação a este ano.

Primeiro há uma incerteza relacionada com a guerra e, portanto, enquanto durar - e tudo indica que vai durar - ela pode escalar. Se escalar, pode ser um desastre não apenas para o setor económico turístico, mas para o mundo. Portanto, essa incerteza vai-nos acompanhar.

Por outro lado, do ponto de vista do contexto macroeconómico, temos inflação, subida das taxas de juro, perda do poder de compra, desaceleração económica generalizada no mundo e, quer queiramos quer não, estes fatores económicos vão chegar ao consumo.

Portanto, está a perspetivar uma retração?

Vai ter de haver, pelo menos, um menor crescimento. Não sem ter a humildade de admitir que a única coisa que está a correr bem é a realidade.

As reservas continuam no ritmo do final do ano, que seguiram o ritmo do verão do ano passado. Portanto, se me pergunta: “já encontra esta retração no consumo?” Tenho de ter a humildade de dizer não. Se me pergunta: “mas no verão pode continuar a ter esta aceleração?” Nós sabemos o impacto das taxas de juro nos empréstimos à habitação, na classe média, que é no fundo o “coração” das viagens.

Então acha que as pessoas ainda não sentiram esse impacto?

Se já sentiram, ainda não reagiram. E apesar de algumas leituras macroeconómicas, à medida que o tempo passa se tornarem mais benevolentes para todos nós, acho que mais tarde ou mais cedo, temos de comparar um 2022 (em que tínhamos muita poupança forçada por parte das famílias, decorrente de uma coisa má, que foi a pandemia) com um 2023, em que andámos a discutir a possibilidade de uma recessão geral.

Mesmo que a inflação tombe no sentido de ficar mais baixa, a verdade é que as taxas de juro vão crescer, pelos menos mais duas ou três vezes. E depois de crescerem, vão ficar altas. E uma taxa de juro alta, significa menos consumo dos portugueses.

Ainda assim, já se sente a procura, tanto por Portugal como por outros destinos?

Do ponto de vista de Portugal, é óbvia; os resultados estão aí. O ano 2022 correu bem, no ano 2023 temos no início um desenho da oferta - sobretudo charter - que é otimista. Enquanto setor, estamos a desenhar para 2023, mais operação charter e para mais sítios do que tivemos em 2022. Não quer dizer que, depois, decorra toda; depende das reservas.

Logo para a Páscoa podemos falar de charters para a República Dominicana, para o México, Cabo Verde, para a Tunísia e para o Egito, à partida de Madrid. Já é um quadro já com alguma relevância.

Se falarmos de verão, então é um caleidoscópio, mesmo se falarmos só do charter. Temos as Caraíbas todas, como é a República Dominicana, México e Cuba; temos Cabo Verde, Tunísia, Marrocos; temos as ilhas espanholas, temos circuitos europeus, a Disney e o Egipto. Os Cayos cubanos, que regressam ao mercado português depois de um intervalo. Malta volta a ter voos diretos; o Senegal vai no seu segundo ano de operação, mais consistente que no primeiro e sempre com algumas novidades. E vamos ter, pela primeira vez, à partida de Portugal, charters para a Albânia e para as praias albanesas. Vamos ter um novo ponto na Sardenha e um novo destino em Marrocos, Al Hoceima.

Temos basicamente muita diversidade, um desenho da oferta mais robusto, e um ritmo de reservas idêntico ao de 2022, apesar de todas as vezes que ligamos a televisão, nos assustamos com o mundo em que vivemos.

E, muito provavelmente, alguns desses destinos ficam mais baratos que fazer férias no país porque Portugal está a tornar-se um destino cada vez mais caro e já não é acessível a muitas bolsas, não é?

Sim e eu vou dar-lhe um exemplo que não é verdade este ano; é verdade há muitos anos: Porto Santo é um destino que não é propriamente barato e do ponto de vista avião+hotel, está mais caro do que inúmeros destinos a partir de Portugal. Dito isto, é, dos destinos que fica cheio mais cedo e com reservas de portugueses.

Tem a ver com a qualidade do destino e com o que ele oferece. Se estamos a falar de um destino mais caro, que fica cheio mais cedo, é bom que seja em Portugal. Esse facto que mencionou é uma belíssima notícia para Portugal enquanto destino turístico.

E esses mercados em que se tem feito uma grande aposta, nomeadamente Estados Unidos, Canadá?

Agora já estamos a falar de "in coming", de quem vem para Portugal. Isso entronca com tanta coisa no turismo, com a TAP, com os aeroportos, etc.

O mercado norte-americano é responsável por 50% do crescimento do turismo português este ano e o turismo é o responsável pelo crescimento da economia. Eu acho que o grande desafio de Portugal e da economia portuguesa, com os dados lançados como estão agora e sem grandes novidades, é o desafio do "long haul" [voos com duração superior a 7 horas, de longa distância], para podermos continuar a crescer, gerindo a pressão turística.

Este mercado de "long haul" não vive só para o verão. O mercado norte-americano, canadiano, brasileiro e até oriental, ainda um bocadinho incipiente...

Mas com grande potencial…

Com grande potencial e algumas surpresas. Para quem não acompanha, é bom dizer que, por exemplo, o mercado sul-coreano é muito relevante para Fátima.

Este é um tipo de mercado que não precisa só do verão. Pode funcionar ao longo de todo o ano e não precisa só do Algarve ou da Madeira ou do Porto, de Lisboa. Funciona ao longo de todo o território. Portanto, temos tido um dinamismo fantástico – ainda bem que temos a TAP com saúde operacional, as outras saúdes já veremos se sim ou não – porque ela tem sido a grande impulsionadora destes mercados, que são os grandes impulsionadores do turismo e da economia.

E, além disso, estamos a falar de mercados em que os turistas vêm por mais tempo e gastam mais.

Exatamente.


Já mencionou a TAP, ultimamente, envolta em grande polémica e que já se saber que o Governo quer reprivatizar. Há algum grupo de aviação que, do seu ponto de vista, serviria melhor os interesses nacionais?

Bom, eu não sei se a TAP vai ser privatizada, sabemos é que há declarações do Governo com a intenção de privatizar, mas não há um processo em curso, não conhecemos pormenores.

O que eu oiço sempre dos políticos são enormes certezas onde eu tenho incertezas. Estou sempre mais focado naquilo que a TAP pode dar do que na composição do capital. Embora, obviamente, pela minha visão económica, faz sentido privatizar a TAP; vamos ver com que regras.

Privatizar a 100% ou o Estado deve ficar com uma parte?

Enquanto presidente da APAVT, não temos gostado de comentar a composição do capital. O que temos dito é que o turismo português é fundamental para a economia, que o "hub" [plataforma giratória de voos] da TAP é fundamental para o turismo português e a partir daí esperemos que corra bem. É um bocadinho como aqueles políticos quando dizem: “não discuto pessoas, discuto políticas”. E eu também não discuto muito a composição do capital social, discuto o papel da TAP e o seu fortalecimento.

Por exemplo, a anterior privatização permitiu à TAP crescer em mercados como o norte-americano. Fantástico! Se com outra composição do capital permitisse a mesma coisa, para nós, fantástico também.

O que nos parece mais relevante – em qualquer processo de privatização – é a manutenção do "hub", porque é fundamental para os mercados emissores de "long haul" e estes, essenciais para o crescimento do turismo.

O "hub" é, em meu entender, uma das maiores e mais visíveis mais-valia da TAP. Portanto, não concebo que haja alguém que queira pagar milhões pela companhia aérea e, depois, vá destruir uma das suas maiores mais-valias. Eventualmente, o que eu mais gostaria é que houvesse capital português porque um dos aspetos mais frágeis da nossa economia é a falta de capital de grupos portugueses.

E acha que há uma mínima hipótese de isso acontecer?

Não sei, mas eu gostaria que, em primeiro lugar, capitais portugueses pudessem fazer parte da composição do capital e ainda mais, que estivessem ligados ao turismo. Porque, obviamente, têm uma visão mais próxima do que a TAP pode fazer pelo turismo e isso seria benéfico, uma vez mais, para a economia portuguesa.

E seria também importante que no acordo de privatização ficassem definidas algumas condições básicas para proteger os interesses nacionais?

Do ponto de vista do turismo português, o mais revelante é o "hub" da TAP. O resto são obrigações de serviço público, há um contrato a que a TAP ou outra companhia podem aceder. O que me parece importante é não substituir slots de "long haul" por slots ponto a ponto, o que faria com que muito menos território turístico fosse acessível por turistas. Porque íamos ter mais low-cost, mais cidades que já estão com algumas dificuldades de gestão da pressão turística.

Eu acho que devemos ter muito cuidado com o papel que a TAP tem desempenhado. Só conseguimos discutir tudo o resto – Segurança Social, Saúde, Ensino, Igualdade – se crescermos. E no quadro atual, digam-me qual é o motor de crescimento do país.

O que resulta do setor turístico em Portugal, do ponto de vista da balança turística, é um PRR por ano. Andamos todos a falar em economia, na necessidade de utilizar um PRR até 2026. A balança turística dá nos um PRR/ano e por isso, eu teria algum cuidado quando falamos dos pilares desse setor.

As greves na TAP que decorreram em dezembro e os anúncios feitos para janeiro, mas que não se concretizaram, que impacto é que tiveram nas agências de viagens?

A primeira, que acabou por ocorrer, se fosse só essa, do ponto de vista do ano, podíamos geri-la e considerá-la relativamente irrelevante.

O que nos preocupa mais não é quantas vão suceder, mas se e quantas greves vão ser anunciadas. Porque na indústria aérea, quando uma greve é anunciada produz imediatamente os seus efeitos. Quando anunciam uma greve para daqui a um mês numa companhia aérea, as reservas para daqui a um mês param, começam os cancelamentos e o ritmo de novas reservas baixa.

Portanto, até pela situação da TAP, acho que o que é responsabilidade máxima das partes envolvidas – administração da TAP e sindicatos - é construírem um quadro de paz social que permita que seja absolutamente percetível e garantido que não vão existir novos anúncios de greve.

Isso é importante para a TAP, para o plano de recuperação da TAP, para os trabalhadores da TAP, para as agências de viagens, é importante para todos nós. Se os sindicatos e a administração da TAP não conseguirem construir um plano de paz social, algo está errado e não sei se um deles ou as duas entidades não têm de ser substituídas, porque é estar à beira do abismo e decidir dar as mãos - neste caso sindicatos e administração - e atirar-se para o abismo. Entrar numa greve é fazer isto. Esperemos que não entrem de mão dada nem um puxe o outro.

E ao novo aeroporto? É uma espécie de D. Sebastião?

Enfim, eu quase teria mais otimismo relativamente ao regresso de D. Sebastião do que em relação ao aeroporto. O problema é a falta de decisão em relação ao local, é básico. Decidam, para valer.

Segundo ponto: tenham atenção que estamos a perder slots e turistas todos os dias. Portanto, qualquer que seja o local que decidam, deixem as obras do aeroporto da Portela a avançar. Ainda vão durar dois anos e meio, mas permitem melhorar a operacionalização e recuperar alguns aspetos.


Mas essas obras ainda não começaram.

Porque não estão autorizadas. Depois, se tivermos uma solução de longo prazo que não seja Montijo, que ainda são quatro ou cinco anos de obras, anos e meio de obras, pelo menos façam num período intermédio o(aeroporto) Montijo. Ficámos muito satisfeitos quando o ex-ministro Pedro Nuno Santos disse que estava tudo decidido, era em Alcochete e íamos fazer o Montijo, no meio.

E, entretanto, o ministro saiu

Entretanto, para além de não termos aeroporto, desta vez não tivemos a decisão ou tivemos a decisão revertida e o próprio ministro revertido.

Numa lógica de longo prazo, estar dez anos a recusar slots que serão cada vez mais precisas porque a expectativa é de aumento de procura, acho que é uma insanidade económica.

Este vai ser um ano particularmente importante para o turismo nacional. Há vários eventos, mas um como nunca tivemos, com mais de um milhão de jovens - a Jornada Mundial da Juventude. Boa parte vai chegar a Portugal por via aérea. Teme que se repita aquelas situações de grandes filas e grandes filas o aeroporto?

Mais do que temer isso, estou muito contente por existirem as jornadas em Portugal. Mais de um milhão de jovens, do ponto de vista da promoção do país, é uma oportunidade quase única. Não apenas pela interação direta desses jovens com o país, que vão cá estar poucos dias e em determinadas condições, mas que vão sempre desejar voltar. Por outro lado, o que se vai falar das jornadas no mundo inteiro é, também, uma ação de promoção que não tem preço.

Continuamos a discutir na espuma dos dias - o custo do altar - o que não tem nada a ver com a importância desta Jornada. Estamos a discutir que partimos um pires de uma cozinha que está repleta de coisas boas. O que vamos ganhar com a Jornada é imensamente mais do que aquilo que podemos perder.

Digamos que é um investimento para o futuro. E há muitos destes jovens a chegar através de agências de viagens?

Não, não há muitas agências de viagens envolvidas neste negócio, o que não estranhamos. Há algumas, que pelo facto de trabalharem este tipo segmento do turismo religioso estão muito envolvidas. Para essas agências vai ser um belíssimo ano e um belíssimo momento, mas do ponto de vista do setor, não teremos uma influência muito grande. Mas estamos muito felizes por estarem cá, é mais turismo, mais contacto, mais promoção.

Quase teria mais otimismo relativamente ao regresso de D. Sebastião do que em relação ao aeroporto

E isso acontece com este evento, que é enorme, mas acontece também com os eventos os eventos, em geral?

São muito importantes porque combatem a sazonalidade, ninguém faz grande eventos num mês típico de procura. Portanto, dá para alargar as épocas de maior intensidade. E depois tem também no plano do marketing, dependendo qual é o evento. Mas quer seja a Jornada da Juventude, a Formula1, o MotoGP, um circuito de golfe internacional ou o Web Summit são muito importantes.

Atualmente, há uma multiplicidade de plataformas que permitem a cada um planear as suas viagens e, de alguma forma, fazer alguma concorrência às agências de viagens. Quando corre bem, tudo bem mas quando corre mal, pode dar grandes problemas. A pandemia mostrou isso. O que lhe pergunto é se o setor já sente que os clientes, consumidores, de alguma forma, estão a tomar consciência das vantagens de viajarem através das agências?

Haverá sempre uma evolução da curva no longo prazo e depois oscilações maiores no curto prazo. Há dois aspetos que estão muito relacionados com a exposição das pessoas: informação não é conhecimento e isso é muito óbvio. Por exemplo, com os medicamentos, temos toda a informação na net sobre medicamentos, mas nós não nos devemos automedicar. E depois temos o paradoxo da escolha: é muito mais fácil para um ser humano escolher entre 3 opções ou entre 300 e 3.000 opções?

Ora, do ponto de vista dos destinos, neste momento temos todo o mundo como opção e isso gera sempre algum stress. Do ponto de vista da informação, a pandemia foi um momento extraordinário para mostrar a relevância das agências, porque foram elas que, para além de terem repatriado todas as pessoas que no início da pandemia ficaram fora dos seus mercados emissores, também foram, sobretudo ao longo da pandemia, as únicas organizações que conseguiram colocar as pessoas a viajar.

Toda a gente tinha informação sobre as restrições Covid, mas ninguém, para além das agências de viagens, conseguiu estruturar essas informações para permitir que alguém saísse de Lisboa, fizesse uma escala em Frankfurt, fosse para outro sítio qualquer, com filhos ou sem filhos vindo de onde, porque podia ter uma restrição, quanto tempo é que se ficava em escala, etc. A complexidade foi brutal e não houve ninguém senão as agências que conseguissem resolver.

No fundo, foi um momento ótimo para lembrar que quanto mais complexa é a viagem e quanto mais incerto é o mundo, maior capacidade de intervenção têm as agências.

Sendo certo que saímos da pandemia absolutamente reforçados e que sentimos isso, também temos a noção de que esta construção da confiança é, por definição, diária. Daqui a dois anos, nada acontecendo, se calhar quem perdeu dinheiro nos sites por causa da pandemia, já se esqueceu disso. Na verdade, os que viajaram através das agências de viagens foram todos reembolsados. E nos sites perdeu-se muito dinheiro e até em compras diretas em companhias aéreas.

E a construção dessa confiança também está a ser reforçada com a parceria que fizeram com a DECO, a Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor?

É preciso tentar explicar que um processo de certificação em boas práticas e em transparência de comunicação para os clientes, que é gerido pela maior associação em Portugal de defesa dos consumidores, é algo que nós não encontramos nem na Europa nem no mundo. Não conhecemos um segundo caso, é algo absolutamente inovador e dá realmente esta capacidade de comunicação de segurança.

Todos podemos falar bem de nós próprios, mas quando um especialista em boas práticas de direito do consumidor certifica uma empresa, afirma que é transparente na sua atuação, seguindo as boas práticas, de acordo com os direitos dos consumidores, é evidente que é um passo muito grande. Mas, isto não é a compra de um selo; isto é um trabalho, é uma certificação e, portanto, não é um processo em que nós tenhamos o interruptor que estava em “Off” e passamos a “On”. Estivemos dez anos em diálogo com a DECO para edificar este processo todo, portanto pode ver o carinho que nós temos por ele e a importância que demos. E é certo que agora a certificação é um trabalho para uns, mais lento, para outros mais rápido.

E o facto de terem o selo, não quer dizer que o mantenham. Há avaliações periódicas?

Todos os anos tem de ser auditado e renovado.

E já têm muitas agências certificadas?

Já começam a existir. Ainda não há muitas. Há muitas em trabalho de certificação, mas ainda poucas certificadas. Mas a Deco tem sido connosco aquele tipo de polícia que nós queremos para o país, que é o polícia que vai ensinar antes de multar.

Tem sido um trabalho muito construtivo, muito positivo, que tem ajudado as agências de viagens a confiar nesse trabalho e a entrar com um otimismo.

A APAVT vai ter a maior participação de sempre na Bolsa de Turismo de Lisboa (BTL). Será, com certeza, uma boa altura para quem quiser tratar das férias, mas também um encontro de profissionais. O que está previsto?

É o maior stand privado da Feira e é um stand, de certa maneira, camaleónico, que E tudo isso, sim, é o maior privado da feira, uma vez mais. E é um stand, de certa maneira camaleónico, porque é o espelho da transversalidade do setor no turismo, em geral. Nos dias da semana é um stand B2B, (business to business), corporate, sobretudo focado nos buyers internacionais e na venda de Portugal enquanto destino turístico. No fim de semana é um stand sobretudo B2C, focado na venda de Portugal e do mundo aos turistas nacionais.

Em qualquer dos dias é ponto de encontro obrigatório de todos os profissionais do setor, dos amigos, dos conhecidos. É m dos corações que melhor pulsam na BTL.

E quem vai nos dias para o público, pode encontrar boas oportunidades?

Aquele pavilhão 4 é, no fim de semana, o pavilhão da Distribuição, dentro e fora do stand da APAVT, com agências mais pequenas ou outras maiores e que querem trabalhar com maior relevância, tendo o seu próprio stand.

Como começámos a conversa a falar de um ritmo de reservas que não se tem retraído, prevejo um fim de semana muito, muito animado na BTL. , não estando habitual.

E com grandes descontos?

Haverá oportunidades, até para chamar gente, mas não estamos num momento de saldos. Ainda assim, é tradição – e pelo que já tenho conhecimento – vão existir propostas agressivas. Podem até não ser de muitos lugares, mas que vão ter muitas oportunidades de comprar bem, isso não tenho dúvidas.

O ano passado a APAVT organizou uma manifestação de solidariedade com a Ucrânia. Este ano está prevista alguma iniciativa solidária?

No momento em que a guerra eclodiu, e em que tivemos uma interação com a Ucrânia no nosso stand, dissemos que enquanto a guerra durasse e nos anos subsequentes, enquanto a Ucrânia quisesse, teriam lugar no nosso stand, sem custos. A Ucrânia está muito satisfeita e vai estar presente no nosso stand, lembrando que o ano passado nós pedimos uma coisa à Ucrânia: mostrem o destino turístico como ele era e mostrem às pessoas que a melhor maneira de ajudar é viajar quando isto acabar.

Não sabíamos quanto tempo é que íamos durar a guerra e não sabemos ainda. É óbvio que a relação da Ucrânia com quem nos visitar vai ser diferente, vai ser numa perspetiva de “precisamos de ajuda”, esse vai ser o mote. E nós estamos a dar a nossa parte da ajuda, que é o local. Nós somos do turismo, uma atividade que vive do respeito pelas diferenças, do amor às diferenças, da curiosidade pelas diferenças. Quem é do turismo, nesta guerra não pode estar equidistante. A APAVT, nesta guerra está do lado da Ucrânia.

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