04 nov, 2021 - 07:16 • João Carlos Malta
Esta quinta-feira, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, vai anunciar ao país o dia das eleições legislativas antecipadas pelo chumbo do Orçamento. Apesar de este ser um momento-chave na resolução da crise política, e fulcral para o futuro do país, entre os investidores e empreendedores presentes na Web Summit o desconhecimento sobre a turbulência governativa é quase absoluta.
Michael Niklas é um investidor norte-americano que vive no Brasil há vários anos, e, por isso, expressa-se num português quase perfeito. Ele é sócio da Valor Capital, empresa com sede em Nova Iorque, e confessa que não “acompanha a política portuguesa”.
O investidor diz que na hora de apostar em mercados não olha para os países pela situação política que atravessam. A razão é temporal: o prazo de investimento com que trabalha é de três a quatro anos, e a permanência nos projetos pode ser entre 10 e 12 anos. Nesse período, “vemos muita dinâmica [política], indo e vindo".
“A situação política não nos afeta tanto”, reflete.
O sócio da Valor Capital considera que, quando olha para um país, o que mais valoriza conjunturalmente é a “política de impostos” e os “incentivos para empreendedores”. Mas o mais importante, afiança, é o que é estrutural: as infraestruturas de educação, de cowork. “O resto, meio que corre sozinho”, acredita.Web Summit 2021
Um estudo realizado pelo Ministério da Economia re(...)
Acima de todas estas questões, Michel ainda põe outro fator: “o talento”. E esse, em Portugal, “é muito bom”. “Cada vez é mais reconhecido globalmente”, reflete.
Uns minutos antes, junto a uma das bancas corridas − em que as startups se seguem umas às outras numa espécie de linha de montagem − está João Veloso. Aos 39 anos é o representante da empresa brasileira Drones Solution.
João diz que gosta de política, mas as “guerras partidárias que se passam em Portugal” não lhe dizem muito. Na “catedral dos pitch”, como é a Web Summit, o jovem qualifica: “O pitch dos políticos não é cansativo, é 'boring' [aborrecido]. É muito blá blá, como o anúncio que havia da comida para os gatos”.
Em relação à crise política com que Portugal se debate, nas últimas semanas, o representante da empresa brasileira não crê que vá comprometer o ecossistema das startups − que deu mais uma prova de força durante a pandemia.“No dia anterior [à abertura da Web Summit] houve vários eventos, e muito pouco se falou do chumbo do orçamento, e do problema político que está a existir. Falou-se mais na resiliência, no apostar… quem aposta muito, ganha muito. Quem aposta pouco, ganha pouco. O tema política não esteve em cima da mesa”, revela.
O mesmo acrescenta que crê que as startups estão mais resistentes. “Cada vez há mais pessoas jovens a terem mais ideias. Penso que são mais resilientes em relação à política. A economia das startups não vai ser influenciada pelas questões políticas”, vaticina.
Junto ao “Investor Lounge” está a investidora alemã Nakeema Steffbauer. Revela já ter ouvido “qualquer coisa” sobre “a instabilidade do Governo atual”. “Mas apenas isso”, frisa.
Não desvaloriza o fator “instabilidade política” quando olha para um país na lógica de investimento, mas dá mais importância a questões como “a transparência”, e a facilidade de “poder entender as regras fiscais”, ou ainda a compreensão dos “procedimentos legais em relação à falências”, e as proteções legais “para investidores e para o capital”.
Nakeema afirma que, além da capacidade de captação de investimento, está atenta à preocupação que os governos têm em relação “à direção e canais em que o investimento é multiplicado”, bem como se estão “focados em que o capital entre no país”.
“É útil saber que vão investir em tecnologia e programas de digitalização, mas é também importante que se tenha atenção à educação, à segurança pública e, em geral, à qualidade de vida. São áreas que devem ser apoiadas pelos investidores e pelo Governo”, explica.
Na cerimónia de abertura, o presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, reforçou a ambição de no futuro próximo fazer de Lisboa uma “fábrica de unicórnios”. A investidora da Unconventional Ventures acha que é “uma ambição interessante” que visa “criar muitos empregos, e gerar riqueza para todos os que participem na economia digital”.
No entanto, pensa que essa não deveria ser a prioridade. “Penso que, normalmente, há mais coisas para se ser uma economia de sucesso do que gerar unicórnios dentro de um grupo pequeno de investidores, e para um limitado número de trabalhadores, que deles poderão beneficiar”.
A alemã considera que “é bom produzir unicórnios, mas é melhor criar empregos sustentáveis para uma maior percentagem da população”.
Siza Vieira na web Summit
Ministro da Economia lembrou que a economia de Por(...)
“Não é necessário que sejam unicórnios ou fábricas de unicórnios. “Passo a passo é mesmo a melhor forma de fazer as coisas”, sintetiza.
A mesma lógica é seguida por Samuel Portugal da “My Data Manager”, uma empresa de Coimbra especializada em soluções para ajudar as organizações a implementar o Regulamento Geral da Proteção de Dados (RGPD).
Samuel considera que querer fazer crescer “unicórnios” - starups que atingem um valor de mil milhões de euros - é uma ideia “simpática e bonita”, mas pensa que até chegar a esse patamar “temos de passar por muitas fases”.
“Devíamos era ser uma fábrica de startups para um dia chegarem a unicórnios. Faz lembrar a lógica do futebol, nem todos serão Cristiano Ronaldo”, ilustra.
O gestor da empresa de RGPD defende que o mais importante seria “dar condições a todos para puderem chegar a unicórnios”. “Isso é o que todas as empresas querem”, assegura.
Em relação à crise política, acredita que a “desorganização acaba por nos prejudicar a todos, porque há sempre a questão da confiança”. O mesmo empreendedor teme que a situação que o país vive possa pôr em risco a imagem que Portugal detinha como “ecossistema de marcas, empreendedorismo e startups”.
Ideia diferente revela Luigi Prisciandaro − um italiano que trabalha para uma empresa com base na Irlanda, a Hyper Innovation. Luigi defende que política e empreendedorismo correm em pistas diferentes.
“Estar na Web Summit é algo de muito técnico, não estamos envolvidos na política. O que nos preocupa são as tendências do mercado e como a parte técnica evolui. Se houver algo errado relacionado com a informática ou IT [Tecnologia da Informação], nós preocupamo-nos. Mas as questões políticas não são assim tão importantes para escolher onde colocamos os nossos produtos”, resume.
O italiano diz que, do conjunto de eventos de tecnologia que frequenta em todo o mundo, este é aquele em que se sente melhor.
“O que nos preocupa é a qualidade com que são feitas, por exemplo, feiras como esta. Desde que sejam competentes e bem feitas, não me interessa que partido político o faz”, sintetiza.
"Tem sido um sonho e estamos ansiosos pelos próxim(...)