07 dez, 2024 - 08:00 • Arsénio Reis , Sandra Afonso
A ideia de tributar robôs tem dividido os especialistas, numa altura em que cada vez mais máquinas e plataformas de inteligência artificial substituem pessoas em contexto laboral. Este não é um problema exclusivo de Portugal mas é uma questão que o país não pode arrastar, avisa o presidente do Conselho Económico e Social (CES), Luís Pais Antunes.
Está em causa a sustentabilidade da Segurança Social, avisa o antigo Secretário de Estado do Trabalho do PSD. Com a substituição dos trabalhadores por máquinas, aumenta o receio de que diminuam as contribuições para a segurança social, num país que já enfrenta o envelhecimento da população.
Em entrevista ao programa da Renascença Dúvidas Públicas, o presidente do CES defende que “é inevitável criar mecanismos de funcionamento que tenham em consideração essa realidade”, o que passa pela reformulação da tributação do trabalho. Diz que não é possível garantir a sustentabilidade do sistema com alterações pontuais.
No entanto, Luís Pais Antunes não defende nenhum modelo específico de tributação. “Saber se a tributação deve ser feita com base no valor acrescentado, se deve haver um imposto sobre a máquina A ou sobre a utilização da inteligência artificial, são depois detalhes”.
A segurança social e a legislação laboral são os próximos temas em discussão em sede de concertação social, depois de revisto o Acordo de Rendimentos e aprovados os aumentos salariais para o próximo ano.
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Nesta entrevista ao programa Dúvidas Públicas, Luís Pais Antunes defende ainda que “vivemos tempos difíceis” e que a economia portuguesa será afetada pela instabilidade governativa em França e pelo abrandamento económico da Alemanha. “É mau para as empresas portuguesas, é mau para os portugueses e para a generalidade dos europeus”, defende.
“Dizia-se que quando a Alemanha tossia a Europa constipava-se, agora a isso junta-se uma fortíssima dor de garganta da França. São tempos difíceis os que vivemos. Tudo isso tem explicações, de ausência de determinadas medidas ou de opções estratégicas que foram feitas ou que não foram feitas. E foi agravado pelo cenário de guerra na Europa”, acrescenta.
Luís Pais Antunes, antigo Secretário de Estado de Durão Barroso e de Pedro Santana Lopes, começou por defender que o país podia ser governado em duodécimos, se o Orçamento do Estado para o próximo ano fosse rejeitado. Semanas mais tarde, admitiu que o cenário estava mais complicado e um chumbo iria levar a eleições antecipadas. Hoje mostra-se aliviado por ter sido possível um acordo. No entanto, também diz que este Orçamento do Estado que foi aprovado “é o possível”, no atual contexto de maioria relativa.
“Não resolvemos o problema da pobreza tornando os ricos menos ricos”
Exemplo disso é o IRC. Luís Pais Antunes lembra que “as medidas aprovadas não se esgotam no 1%”, a descida da taxa geral do imposto acordada entre o governo e o PS, que obrigou o executivo a reduzir em metade a proposta inicial. “Tem o mérito de apontar na boa direção mas, por si só, é um pequeníssimo passo, que só irá certamente produzir resultados se for acompanhado de outros passos”, admite.
Ainda em matéria fiscal, Luís Pais Antunes rejeita um imposto sobre as grandes fortunas, uma medida que foi discutida pelo G20 e é proposta pelo Bloco de Esquerda, porque “os mais ricos em Portugal já são muito tributados”. Até admite que pode fazer sentido noutros países, com um nível de vida superior, não com os rendimentos que auferem os portugueses.
“Não resolvemos o problema da pobreza tornando os ricos menos ricos”, defende o presidente do Conselho Económico e Social.
Nesta entrevista à Renascença Luís Pais Antunes diz que a solução para diminuir a pobreza e aumentar os salários começa por incentivar a produtividade, o que é possível com a “redução da carga fiscal”.
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Questionado sobre as recentes manifestações, Luís Pais Antunes não refere os bombeiros, que protestaram sem autorização e com petardos, mas condena o sucedido e apoia a posição do governo, que suspendeu as negociações.
“Quando estamos a falar de instrumentos de coação, sem a cobertura legal, isso dificilmente é compatível com a realização de negociações”, lembra o advogado. Luís Pais Antunes é a favor de todos os processos negociais, no âmbito do “exercício democrático e dos direitos constitucionalmente protegidos”. “Em presença de situações “abusivas, formas de manifestação que claramente não estão contempladas na provisão legislativa, isso não é compatível com processos negocias”, explica.
O presidente do CES admite o aumento dos protestos em altura de eleições, mas rejeita o agravamento da tensão nas ruas, como se tem assistido noutros países. “Não vejo razões objectivas para grandes tensões sociais no caso português”.
"As dependências fazem todas mal à saúde física e financeira. Temos muitas famílias na miséria por se deixarem levar por essas dependências”
Sobre a atividade do Conselho Económico e Social, diz que estão em preparação vários estudos, não só sobre a reestruturação da composição do CES, mas também sobre matérias de impacto social, como a longevidade e o envelhecimento. Os resultados deverão ser divulgados ao longo do próximo ano.
Defende que a saúde mental e as dependências, em geral, devem ser uma preocupação do CES, mas não destaca nenhum fenómeno em particular, como o jogo social e as raspadinhas, que foram uma preocupação de Francisco Assis, quando ocupou o mesmo cargo.
“Muitas vezes essas dependências estão associadas a problemas de saúde mental, isso é uma preocupação do CES. Não está direcionada para o jogo A ou para a dependência B, as dependências fazem todas mal à saúde física e financeira. Temos muitas famílias na miséria por se deixarem levar por essas dependências”, defende.
Luís Pais Antunes, Presidente do Conselho Económico e Social, advogado e ex Secretário de Estado do Trabalho em dois governos do PSD, é o entrevistado desta semana do programa da Renascença Dúvidas Públicas. Uma entrevista transmitida aos sábados, depois do meio-dia, e que também pode ouvir e ver em qualquer altura em podcast e no site da Renascença.