RescEU, o mecanismo europeu que nasceu depois da tragédia de Pedrógão

RescEU, o mecanismo europeu que nasceu depois da tragédia de Pedrógão

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22 jul, 2019 - 13:38 • João Cunha , em Madrid*

O primeiro avião de ajuda no âmbito do Mecanismo Europeu de Proteção Civil só chegou quatro dias depois do pedido de socorro feito pelas autoridades portuguesas, nos incêndios de Pedrógão Grande. Dois anos depois nasceu o RescEU, um mecanismo com vista a garantir que países europeus não ficam à espera de solidariedade numa situação de emergência.

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Quando Portugal pediu ajuda, Christos Stylianides, comissário europeu para Ajuda Humanitária e Gestão de Crise, teve de telefonar a cada um dos governantes dos vários países da União Europeia, com a tutela da Proteção Civil, de forma a conseguir levar ajuda para Portugal na segunda vaga de incêndios de 2017.

Nessa altura, alguns países ainda necessitavam dos seus próprios meios de combate a incêndios e outros já não dispunham de meios aéreos naquela altura do ano.

Tragédia em Portugal na génese do RescEU

No início de julho deste ano, Christos Stylianides pediu desculpa aos portugueses pelo falhanço da ajuda europeia no combate aos incêndios de 2017 e disse que foi a situação mais dolorosa da sua vida.

O pedido de desculpas aconteceu durante um encontro informal com jornalistas, em Madrid, a propósito de uma apresentação do novo sistema de ajuda do Mecanismo Europeu de Portecção Civil, o RescEU.

No âmbito deste sistema, está a ser criada uma nova reserva de capacidades a nível europeu, que inclui para já aviões de combate a incêndios florestais. No futuro, pretende-se que tenha também bombas de água especiais, para acudir em situações de cheias, bem como centro de busca e salvamento urbanos e hospitais de campanha com equipas médicas de emergência.

Cada país disponibilizará, nesta fase, os meios aéreos que puder para a constituição desta força, que conta já com 13 meios: sete aviões e seis helicópteros da Croácia, França, Espanha, Itália e Suécia. Meios que estarão nos países de origem, onde podem ser utilizados, mas que estarão em simultânea prontidão para responder a pedidos de outros países. As aeronaves poderão vir a ser estacionadas numa base ou bases a partir da qual vão operar, por indicação das autoridades europeias.

Em concreto, através do Centro de Resposta Coordenada a Emergências em Madrid, Johannes Luchner, diretor da ECHO, a agência europeia de Proteção Civil e de Operações de Ajuda humanitária, admitiu que não espera que, nesta fase, Portugal contribua para a missão.

“Na atual situação não há qualquer expectativa que Portugal ponha helicópteros Kamov no sistema e ceda dois terços da sua frota. O que Portugal ou outro qualquer país membro esteja disposto a contribuir, é inteiramente com o estado-membro”, explicou Johannes Luchner, durante o encontro em Madrid.

De acordo com o diretor da ECHO, a principal preocupação não é a resposta, mas sim a prevenção. “É saber o tipo de madeira que temos em Portugal. É o cadastro da floresta. É saber se as pessoas tomam conta destas florestas”. Porque, sublinha, em termos económicos, “a prevenção é a melhor coisa que se pode fazer”. E avança com números concretos: um euro investido em prevenção permite uma poupança entre três e 11 euros em combate, dependendo do desastre natural.

O objetivo a longo prazo é aumentar as capacidades e os meios, e criar uma reserva mais forte, com 75% dos custos operacionais a serem suportados pela União Europeia. Durante o período de transição deste programa de ajuda, que vai até 2025, os custos serão suportados, em alguns casos, até 100%.

Não é de excluir que a aquisição de meios aéreos de combate a incêndios possa também ser financiada, em parte, com dinheiros europeus.

Até agora, anualmente, estavam a ser gastos 123 milhões de euros dos contribuintes europeus neste mecanismo. O orçamento que a Comissão propõe até 2027 é de 1.4 mil milhões de euros, o que corresponde a cerca de 200 milhões por ano.

Meios espanhóis na linha da frente

Na cerimónia de apresentação dos dois Cannadair que Espanha disponibilizou para o RescEUE, Fernando Grande-Marlaska, ministro do Interior espanhol, considerou que “é imprescindível acompanhar os esforços da União Europeia que permite ajudar nas insuficiências que cada estado-membro possa experienciar na hora de enfrentar as catástrofes”.

Fernando Grande-Marlaska sublinhou o compromisso espanhol para o reforço da solidariedade europeia. “Acreditamos que a experiência acumulada por Espanha e pelo seu sistema nacional de Proteção Civil, na hora de dar apoio aos seus vizinhos, como Portugal, França e Marrocos, por exemplo, que sempre que nos solicitaram ajuda, bilateralmente ou através do atual mecanismo, poderá ser de muita utilidade para implementação deste projeto europeu, com o qual nos congratulamos”.

Meios espanhóis na linha da frente no combate contra a incêndios
Meios espanhóis na linha da frente no combate contra a incêndios

Palavras ouvidas com atenção por Reinaldo Fernandéz Boyero, capitão do Grupo 43, unidade da Força Aérea Espanhola, integrada na Unidade Militar de Emergências, que dispõe de 17 Cannadair que, na época dos fogos, estão distribuídos por Santiago de Compostela, Saragoça, Albacete, Málaga e Palma de Maiorca.

“A nossa principal missão é combater fogos florestais e levar a cabo missões de busca e salvamento”, explica Boyero, que depois de cinco anos de formação na academia da Força Aérea Espanhola, para se especializar na área do transporte aéreo, teve formação específica em combate a incêndios.

“Temos muito bom treino e treinamos bastante durante o inverno. Por isso, esse treino dá-nos segurança, ao desenvolvermos, na época dos incêndios, a nossa missão. A manutenção destes aviões é muito boa e este aparelho específico é bastante fiável”.

Este grupo já esteve por várias ocasiões em Portugal, depois de pedidos de ajuda das autoridades portuguesas para combater incêndios.

Esta segunda-feira, Portugal acionou o pedido de ajuda europeia e dois meios aéreos espanhóis foram enviados para ajudar a comabter os incêndios de Vila de Rei e Mação.

Em 2018, no Mecanismo Europeu de Proteção Civil, 17 estados-membro contribuíram com meios para responder a 20 emergências. França é o país que oferece mais meios tem de combate a incêndios florestais. De acordo com a EFFIS, Portugal é o país com mais percetagem de área ardida, com 136 mil hectares anuais perdidos.

*Editado por Joana Bourgard

[A Renascença viajou a Madrid a convite do Mecanismo Europeu de Proteção Civil]

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