13 ago, 2024 - 10:30 • Luís Aresta
O campeonato arrancou e os regressados à 1ª Liga – Santa Clara, Nacional e Aves (ou AVS ou AFS Futebol SAD...) – disseram ao que vêm. Sobretudo o Santa Clara, que na 2ª jornada recebe o FC Porto, depois do tiro de partida a alta velocidade (goleada por 4-1 no terreno do Estoril Praia).
Mais modesto, mas igualmente positivo, foi o arranque do Nacional, o próximo adversário do Sporting CP (empate, a uma bola, na Vila das Aves). Será demasiado cedo para açorianos e madeirenses apanharem pela frente dois dos candidatos ao título e tentar uma surpresa?
“Costumo dizer que impossível não é o mesmo que improvável”, responde o treinador António Barbosa, que, a convite da Renascença, aceitou o desafio de olhar para o positivo e negativo dos três emblemas recém-chegados à 1ª Liga.
“Acho que este é um excelente momento da época para receber uma equipa que à partida disputará o título nacional, como é o caso do Sporting e do FC Porto. O Nacional e o Santa Clara veem aqui uma grande oportunidade de se valorizarem e valorizarem aquilo que foi a sua crença e o seu trabalho na época anterior. Estes elementos de valorização e de foco em torno de um objetivo, frente a um adversário que vai seguramente exigir o máximo de concentração e determinação em todos os lances, são momentos de catalisação da coesão da equipa”, declara António Barbosa.
O técnico que iniciou a época passada na Lank Vilaverdense, da Liga 2, complementa que “treinadores e equipas veem estes jogos como uma grande oportunidade de criação de um histórico de sucesso e de mostrarem a sua valia perante os grandes do futebol português. As hipóteses serão aquelas que os jogadores, fruto da sua entrega e atitude competitiva, consigam criar, percebendo da grande dificuldade que vão ter perante duas equipas que vão disputar o título nacional”, refere.
Enquanto treinador do Lank Vilaverdense, António Barbosa defrontou, na época passada, Santa Clara, Nacional e AVS. O técnico, de 41 anos, faz uma análise detalhada dos três emblemas e conclui que, dos três clubes, é o emblema da ilha de São Miguel, treinado por Vasco Matos, que se apresenta mais sólido neste regresso à 1ª Liga.
“Penso que o Santa Clara estará mais próximo de realizar um campeonato com sucesso neste seu regresso. O AVS e o Nacional vêm de uma época excecional, mas passaram por alterações que podem condicionar o sucesso. No AVS, a saída do presidente da SAD, Henrique Sereno, e a troca de treinador podem condicionar a dinâmica instituída", continua.
"Claro que contratar um treinador como Vítor Campelos, conhecedor da 1ª Liga, fixar jogadores úteis e ativos, como Pedro Trigueira, Clayton, Alaba, Lucas, e jogadores de grande retorno como é o caso de John Mercado e o próprio Nené que fez uma época fantástica, podem ajudar a que esta equipa - que já na época anterior não tinha o maior orçamento e, fruto da união, da organização e dinâmica interna do clube - possa também ter sucesso neste regresso à 1ª Divisão”, considera.
Em contraste, António Barbosa aponta como maior dificuldade para o Nacional, de Tiago Margarido, a forte mexida operada no plantel.
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“O Nacional da Madeira, que na época anterior fez um trajeto fantástico com o Tiago Margarido, perdeu vários jogadores do setor ofensivo. Carlos Daniel, Chuchu Ramirez, Gustavo, Witi, todos saíram e isto representa muito peso naquilo que era a equipa do ponto de vista ofensivo. Aliás, o Nacional perdeu jogadores que estiveram em muitos jogos, em todos os setores."
E acrescenta ainda sobre o mesmo tema: "É verdade que se reforçaram com jogadores interessantes, como o Bruno Costa e o Djibril, mas o facto de perder seis dos principais ativos da época anterior pode condicionar, pelo menos na fase inicial da época”, assinala, mesmo considerando que “para o Nacional este regresso foi muito importante, até para tentar criar algum distanciamento para o rival Marítimo e condições para prolongar a sua permanência na 1ª Liga”.
António Barbosa retoma o olhar sobre o Santa Clara, para sublinhar o projeto que vai consolidando raízes na ilha de São Miguel.
“Na época passada, o Santa Clara fez um investimento fortíssimo, pelo seu presidente Bruno Vincentim, em jogadores de grande qualidade e capacidade, que até poderiam estar em equipas que disputam o acesso às competições europeias; conseguiu manter quase toda essa base. São jogadores úteis e de retorno. A estrutura defensiva é quase toda a mesma – Gabriel Batista, Lucas Soares, Luís Rocha, Pacheco, Paulo Henriques, Calila. E tem o Klismahn, Firmino, Ricardinho, Bruno Almeida, Safira e Rafael Martins. É um conjunto de jogadores de elevado potencial, em idade útil, com grande performance. Mantendo o treinador, a mesma estrutura técnica, penso que numa fase inicial será a equipa mais preparada para fazer um campeonato com tranquilidade”, enfatiza.
Nesta entrevista a Bola Branca, António Barbosa lança um olhar sobre a liga 2 e aqueles que, na sua opinião, serão os mais fortes candidatos à subida à 1ª Liga.
“A Liga 2 é sempre altamente competitiva, com várias equipas a poder assumir a candidatura à subida. Acredito que os mais fortes candidatos serão o Chaves, Portimonense, Vizela, Marítimo e Académico de Viseu. Depois, como “outsiders”, mas extremamente válidos, o Torreense, o Leixões, com um forte investimento nas condições criadas no clube, o Paços e o Tondela”.
A Liga 2 tem vindo a ganhar competitividade, reconhece António Barbosa.
“É de valorizar o trabalho da Liga Portugal no sentido de promover uma melhor organização dos clubes, com maior investimento e maior capacidade para formarem quadros que ajudem no melhor funcionamento das equipas. Obviamente também são importantes as infraestruturas, com relvados de treino e de jogo, com qualidade", reflete.
"A própria estrutura da competição e a introdução de competições como a Taça da Liga, ajudam a que haja melhorias económicas, atraindo maior investimento para desenvolver a competição. Assim como a melhor formação dos árbitros que têm vindo a aparecer na segunda liga e na primeira”, considera este treinador. António Barbosa observa a crescente aproximação na qualidade entre as duas competições profissionais de futebol em Portugal.
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“Acho que a qualidade dos planteis entre as duas ligas até é bastante similar. A título de exemplo, o Rio Ave desceu de divisão, subiu, esteve três mercados sem poder contratar e, com a mesma equipa que subiu de divisão conseguiu manter-se na 1ª liga com alguma naturalidade. E há os exemplos dos “playoff” que nos últimos anos têm sido ganhos pelas equipas da Liga 2, talvez também pelo histórico de sucesso. O que está a acontecer na Liga 2 é que há grandes investimentos. Na época passada houve equipas a fazer investimentos avultados, em recursos, quadros e também em jogadores”, considera, antes de assinalar a diferente qualidade de jogo entre a Liga 1 e a Liga 2.
“O que separa as duas ligas na qualidade do jogo é que na 2ª liga há um jogo com maior concentração, menos tempo útil de jogo, mais faltas num jogo mais agressivo, muitas vezes mais físico, onde há menos espaço nas zonas próximo da baliza ou nos setores médios. Para que a dinâmica de jogo fosse maior e se jogasse durante mais tempo, talvez se devesse valorizar as equipas que cometem menos faltas de forma repetida, faltas que visam fundamentalmente quebrar o ritmo de jogo e o ímpeto de quem quer ter e cultivar a bola”, observa. António Barbosa aponta a estabilidade como fator fundamental ao crescimento da Liga 2, em que os clubes com maior massa social têm uma importante palavra a dizer.
“Claro que os clubes que têm massa adepta são extremamente importantes, mas para mim o fundamental é a estabilidade económica e profissional. Quando um treinador tem tempo para trabalhar, quando é dado tempo ao presidente para escolher os quadros humanos que melhor se adequam ao desenvolvimento do clube, quando o treinador consegue escolher os jogadores, tudo flui com maior naturalidade e há uma aproximação entre as equipas da 1ª e da 2ª liga”, observa.
"Quando o mar está calmo, qualquer barco navega bem"
António Barbosa é, nesta altura, um treinador sem clube. Mais um, na longa lista de técnicos portugueses, para quem abraçar um projeto e criar raízes, não é tarefa fácil. A primeira experiência de Barbosa como treinador principal foi no Vilaverdense, entre 2016 e 2018. Seguiram-se passagens pelo Trofense, Varzim, Sanjoanense, antes do regresso a Vila Verde, na época passada (um retorno às origens, interrompido ao fim de 9 jogos). O jovem treinador não se arrepende dos passos que tem dado na carreira apesar dos altos e baixos por que tem passado.
“Vivi em vários contextos de grande precariedade e limitações económicas, perdas, insolvências, restrições, dificuldades humanas, estruturais e erros que, obviamente, também cometi ao logo deste caminho; mas sou muito grato pelas oportunidades e pelas dificuldades que daí advieram, que me ajudaram a um crescimento que só pode se feito de forma vivida e sentida”, declara.
Num dos clubes que António Barbosa treinou, uma placa resumia em poucas palavras aquilo que é a vida das equipas de futebol e, consequentemente, dos treinadores, as maiores vítimas quando as derrotas batem à porta.
“Num dos clubes havia uma frase que me segue: quando o mar está calmo, qualquer barco navega bem. A minha vivência nos últimos anos, principalmente no futebol sénior e profissional, foi muito em mares agitados; isso fez crescer em mim uma forte capacidade para criar soluções perante grandes dificuldades” sublinha, para complementar que “nesta quase uma década de futebol sénior, também vivi momentos de grande alegria na Taça de Portugal, manutenções históricas em momentos muito difíceis dos clubes; também o retorno económico elevadíssimo para clubes, a venda de jogadores e de ativos” assinala. Para o jovem treinador de 41 anos, o momento é para respirar fundo e seguir em frente.
“O que pretendo e aproveito para fazer neste momento é um grande crescimento pessoal, conhecimento interpessoal, relacionar-me com outros treinadores, perceber como pensam e como fazem os melhores, aqueles que estão em níveis de performance elevadíssimos. Estou em reflexão sobre a forma de trabalhar, minha e da minha equipa, que aspetos posso melhorar para criar mais soluções e ser um treinador cada vez mais pronto e preparado para as dificuldades, estando focado e determinado a ter sucesso em contextos que, espero, sejam obviamente mais favoráveis”, declara.
Não basta que o telefone toque. É preciso que do lado de lá, venham boas notícias para António Barbosa, de preferência do futebol português.
“Do ponto de vista pessoal e pelo conhecimento do futebol português – falo de investigação e de prática, porque durante a semana vejo pelo menos quatro jogos de diferentes competições – preferia ficar em Portugal. Tenho bem a noção de que sou treinador de futebol e alimento o desejo de, em algum momento, conhecer o mundo", confessa.
"Aparecem tentações económicas, com valores muito diferentes daqueles que se praticam cá na generalidade dos clubes, mas fundamentalmente o que procuro é uma possibilidade de rendimento desportivo, estar em locais onde tenha a possibilidade de acrescentar valor e em contextos onde exista a verdadeira possibilidade de sucesso, jogar para ganhar, para subir de divisão como fiz mais de uma vez, vendo valorizado e respeitado o papel do treinador, no que sei fazer, colaborando com o clube no meu espaço."
António Barbosa sente-se um técnico preparado para ir à luta. “As ofertas que tenho recebido são mais do estrangeiro. Estou disponível para um projeto, desde que tenha condições para fazer com que as coisas aconteçam e ter sucesso. A cada ano, a cada experiência, aumento a capacidade e a confiança em mim como treinador”, conclui.