03 jul, 2024 - 09:30 • Francisco Sousa (comentador e analista)
O Áustria-Turquia foi tudo aquilo que se esperava deste jogo: frenético, bem disputado, com momentos de protagonismo repartidos e lances emocionantes, como aquela defesa final de Mert Günok, que fica para a memória coletiva deste Europeu.
Houve riqueza tática: Montella adaptou a equipa a um 5-4-1 no momento defensivo, baixando Kaan Ayhan (jogador multifuncional) para central-direito, para estabelecer aproximação direta na marcação a Sabitzer e estabelecendo uma construção a 3, mas sempre visando saídas diretas para a explosão dos extremos (mais em evidência Barış Alper Yılmaz), com o prodígio Arda Güler a exercer de referência móvel na zona central do ataque, o médio Orkun Kökçü a meter critério no passe e Ferdi Kadıoğlu a tentar dar energia a partir da faixa esquerda. A Áustria até ativou Baumgartner e Sabitzer na fase inicial, mas sentiu dificuldade para continuar a progredir pelo corredor central até ao descanso.
Para o 2º tempo, Ralf Rangnick mudou para um 4-4-2, com Prass a dar mais critério na faixa esquerda e Gregoritsch a formar parelha atacante com Arnautović. As melhorias fizeram-se sentir imediatamente, sobretudo através da dinâmica alternada de movimentos entre Posch e Baumgartner a partir da direita e com Laimer a assumir mais aproximações de trás para a frente.
As bolas paradas tiveram um peso tremendo no jogo, dado que os três golos surgiram na sequência de pontapés de canto, sendo que o primeiro é caricato: Arda bateu para a área e entre Baumgartner, Posch e Pentz existiu uma atrapalhação incomum, a valer o remate certeiro de Merih Demiral. Ele que já na segunda parte atacou o 1º poste com contundência, entre os centrais austríacos, para cabecear uma cobrança irrepreensível do menino de ouro turco Güler. A Áustria teve em Sabitzer o batedor do «corner» que relançou a equipa no jogo, com Posch a atacar a primeira bola e Gregoritsch a faturar.
Até ao final, os austríacos massacraram, a Turquia resistiu (baixando muitas unidades), fechou-se com galhardia na área, mas Baumgartner (belíssimo torneio) merecia melhor sorte à beira do fim. Só que apareceu a melhor defesa até aqui do Europeu, a travar um cabeceamento que levava o selo de golo. Sai assim da prova um dos coletivos mais bem trabalhados que esteve na Alemanha.
Ronald Koeman estabeleceu a equipa num 4-2-3-1 na maioria dos jogos no Euro e para o duelo dos oitavos de final com a Roménia, surgiu praticamente o mesmo onze do jogo com a França (única alteração foi a troca de Frimpong por Bergwijn). Para trás, ficou o jogo errático com a Áustria a fechar a fase de grupos e a exibição face aos romenos foi bastante descomplexada, mesmo tendo em conta o início agressivo na pressão da equipa de Edward Iordanescu.
Uma das chaves do triunfo neerlandês esteve no duo Schouten-Reijnders no meio-campo. Alternaram momentos de subida e complementaram-se lindamente na dinâmica construtora a partir da base. O jogador do AC Milan é um dos médios de melhor nível na prova, pela categoria no passe, pela elegância no transporte e na aproximação aos três quartos do campo. Schouten tem mais fama de equilibrador, mas o calibre do passe está todo lá. No lance do 1-0 encontrou Xavi Simons (jogaço no corredor central, com várias intervenções determinantes e duas assistências para golo) nas costas dos médios, aproveitando a saída de posição de Marius Marin e este serviu Gakpo para a diagonal e finalização.
E se no primeiro tempo, as ocasiões claras não abundaram, após o intervalo, o conjunto neerlandês dispôs de várias oportunidades muito vantajosas para chegar a uma goleada vistosa. Memphis Depay continua divorciado da pontaria, mas até deixou um jogo mais clarividente, Dumfries soltou-se muito na direita e houve direito a que os centrais gerassem perigo em pontapés de canto. Quem carimbou o triunfo foi Donyell Malen, saído do banco no início da 2ª parte, mostrando o lado incisivo no ataque a zonas de finalização e o poder de arranque em campo aberto.
Partindo como extremo desde a esquerda, mas com tendência a fomentar a procura pelo corredor central, tem sido um dos jogadores mais destacados deste Euro 2024, em particular na finalização. Aproveitou a passividade do marcador direto para marcar o primeiro, criou novas ocasiões claras, uma delas depois de atravessar o campo sozinho, em aceleração e serviu Malen de forma brilhante, aguentando a pressão contrária para o 2-0. Europeu de craque.
A excelente campanha da turma de Iordanescu terminou com uma derrota sem apelo nem agravo. Ao início agressivo na pressão face aos Países Baixos, seguiu-se uma série de dificuldades, no controlo do espaço entre setores, na defesa da bola parada e cruzamentos e ainda alguma falta de contundência a fechar (Rațiu no golo inaugural como exemplo). Ainda assim, jogadores como Dennis Man, Drăguşin ou Stanciu saem valorizados da competição.