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Da Capa à Contracapa

Maioria feminina na Missão Olímpica. "É uma evolução, mas não reflete a realidade"

23 jul, 2024 - 13:15 • José Pedro Frazão

Em Paris, Portugal vai apresentar uma atleta que foi mãe em maio. As dificuldades para conciliar maternidade e competição são a regra. Susana Feitor acredita que se os grandes clubes derem o exemplo, mais desporto feminino será praticado em Portugal.Victoria Kaminskaya pede mais sensibilidade dos treinadores masculinos para as especificidades femininas.

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Pela primeira vez, Portugal apresenta uma Missão Olímpica com uma maioria de atletas femininas nos primeiros Jogos da História com paridade de participação entre atletas masculinos e femininos. Mas fora do quadro olímpico, a realidade é bem diferente, alerta Susana Feitor, a ex-atleta portuguesa que lidera a Fundação do Desporto e que tem mais participações em Jogos Olímpicos em Portugal. Elas continuam a ser um terço do contingente geral de atletas.

"Em 2018, antes da pandemia, tínhamos 215 mulheres em 700 atletas no alto rendimento. Hoje temos 324 mulheres em 923. Os números da Missão Olímpica não se refletem nas camadas 'mais baixas'. Não são uma excepção, mas são provavelmente o espelho da evolução. Se conseguimos aumentar a base da participação, vamos ter depois uma paridade mais evidente nas seleções nacionais e Missão Olímpica", sustenta Susana Feitor no "Da Capa à Contracapa", um programa da Renascença em parceria com a Fundação Francisco Manuel dos Santos, que debate o desporto no feminino.

Nos seus primeiros Jogos Olímpicos, em 1992, Susana Feitor esteve na estreia da marcha feminina em Olimpíadas. Só em 2017 é que as mulheres puderam entrar nos 50 quilómetros de marcha e com uma portuguesa, Inês Henriques, como primeira campeã do mundo. Hoje Susana Feitor lidera a Fundação do Desporto, mas a evolução marca passo no dirigismo.

"A minha posição na Fundação do Desporto também foi um pouco para passar a mensagem que deve existir aumento da participação feminina no dirigismo. Um estudo de 2023 mostra que não há nenhuma mulher a liderar qualquer uma das dez maiores federações em Portugal", refere Feitor, para quem o papel dos grandes clubes no impulso dado às modalidades femininas será determinante para uma melhoria de resultados e consequentemente de patrocínios.

"O futebol arrasta as outras modalidades. Se os dirigentes das restantes modalidades forem humildes e aprenderem com as boas práticas do futebol, provavelmente têm uma evolução mais rápida", acrescenta.

Mais mulheres treinadoras e mais formação para os homens

As audiências de grandes competições desportivas femininas estão a subir em todo o mundo, mas subsistem ainda grandes desigualdades nas remunerações e no acesso ao desporto, para além de uma prevalência de violência e abuso sobre raparigas e mulheres desportistas.

As tendências são globais. As raparigas desistem do desporto a uma taxa duas vezes superior aos rapazes logo aos 14 anos, de acordo com a World Sports Foundation. Também já retirada, a nadadora portuguesa nascida na Rússia, Victoria Kaminskaya, pede mais sensibilidade dos treinadores masculinos e um aumento dos incentivos às jovens atletas para se manterem no desporto.

"Devíamos ter mais apoios como bolsas ou incentivos no âmbito de programas de desenvolvimento para apoiar as atletas femininas desde cedo. Se calhar não é necessário abandonar a competição se a causa forem os estudos. Podia haver também mais formação dada aos treinadores para perceberem também como é que as mulheres funcionam, colo lidar com as raparigas em questões como a menstruação", refere a nadadora que competiu no RIO 2016. Susana Feitor concorda e assinala que já existe um trabalho de identificação de jovens atletas, o programa UAR (unidade de alto rendimento) do Ministério da Educação em parceria com as escolas e as federações para jovens até aos 12 anos.

Deixar de ser atleta para ser mãe

Victoria Kaminskaya abandonou a carreira depois de ser mãe, ainda antes dos 28 anos. "Nos primeiros dias de vida do bebé, é quase impossível treinar porque exige 100% da atenção da mãe. Como escolhi amamentar, foi ainda pior. Era impossível treinar quando a minha filha precisava de mim a cada duas horas", recorda a nadadora casada com Miguel Nascimento que vai participar nos Jogos Olímpicos de Paris que começam na sexta-feira e vão até 11 de Agosto,

Neste domínio, Susana Feitor admite que a maioria das situações é semelhante ao caso de Kaminskaya embora anote que as atletas grávidas têm uma bolsa de 85% na transição para o regresso à atividade no quado do projeto olímpico. Existe já também uma subvenção a 100% após os 120 dias de licença de maternidade, explica a presidente da Fundação do Desporto.

O exemplo da difícil conciliação entre a maternidade e a competição ao mais alto nível deve vir este ano da marchadora Ana Cabecinha. A porta-estandarte da Missão Portuguesa ( com Fernando Pimenta) foi mãe há apenas dois meses e vai entrar nos Jogos de Paris no processo de recuperação. As Olimpíadas da capital francesa vão ter também berçários pela primeira vez para os atletas, além de permitirem visitas familiares nos termos já existentes ( visitas com marcação antecipada)

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