07 ago, 2024 - 11:45 • Hugo Tavares da Silva
Se Frank não andasse na canoagem, no clube BSG Stahl Brandenburg, provavelmente Birgit não sentiria o chamamento divino. Frank é Frank Fischer, que já homemzinho ganharia nove medalhas em campeonatos do mundo. Birgit é Birgit Fischer, a rapariga que seria a lenda maior da canoagem. O pai, Karl, foi o seu primeiro treinador.
A história começa sensivelmente em 1968, seis anos depois de Birgit Fischer nascer, em Brandenburg an der Havel, na República Democrática da Alemanha. Meteu-se dentro de um caiaque, gostou de deslizar sobre a água e transformou-se numa campeã olímpica sem paralelo.
A estreia nos Jogos de Moscovo, em 1980, aconteceu depois de Fischer conquistar dois títulos mundiais em K4 5000, em Belgrado e em Duisburgo, em 1978 e 1979. O número depois do “K” indica as pessoas em cima do caiaque. Birgit tinha apenas 18 anos quando aterrou na capital russa para saber como era aquela coisa dos JO.
Aí tornou-se na mais jovem vencedora de uma medalha de ouro na modalidade. E conseguiu-o logo na solitária e rápida categoria K1 500 metros. Seguiram-se nove ouros nos Mundiais de 1981, 1982 e 1983, nas categorias K1, K2 e K4, pode ler-se no site oficial dos Jogos Olímpicos.
Jogos Olímpicos
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Quatro anos depois daquela estreia auspiciosa em solo russo, os Jogos de Los Angeles, onde Carlos Lopes levou bem alto o nome de Portugal, prometiam catapultar Birgit Fischer para junto dos nomes escritos a negrito em qualquer texto. Porém, um boicote dos países do Bloco de Leste ao evento em território norte-americano impossibilitaram-na de dar de comer à fome competitiva que levava debaixo da pele.
Vingou-se em Seul, em 1988, onde outra portuguesa voou sem qualquer vestígio de pejo. E fê-lo por equipas, já que o ouro numa das finais de K1 escapou-lhe por 0.12 segundos. Mordeu o ouro em K2 e K4.
E reformou-se, acabava de ter o segundo filho. Filha, na verdade. Ulla.
Mas um leão faminto é um leão faminto, por isso Fischer regressou para os Jogos Olímpicos de Barcelona, em 1992, já dentro da farda da Alemanha, um país que deixara de estar dividido em 1990, pouco depois da queda do Muro de Berlim.
Acelerando a história. Nos Jogos de Barcelona, Atlanta e Sidney, em 1992, 1996 e 2000, esta canoísta mítica conquistou duas pratas (já tinha uma) e somou mais quatro medalhas de ouro, em K4 500m, K2 500m e, em Barcelona, conseguiu-o em K1 500m.
E voltou a reformar-se.
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Estava feito. Era tempo de aproveitar a vida, a fama sem desperdiçar suor. Era altura de conhecer as virtudes de sentar e respirar o ar fresco, de ter conversas demoradas, de viver sem horários, de estudar o assobio das árvores e as composições musicais dos pássaros e das folhas que aterram no chão.
Mas um leão faminto é um leão faminto, certo? Reza a lenda que quando lhe pediram para entrar no caiaque, para filmar um documentário, as células do corpo que se contorcem quando vislumbram algo dourado fizeram isso mesmo: contorceram-se e salivaram por algo dourado. E ela quis saber o que poderia fazer com 42 anos. Ainda seria rápida? Tinha nove meses para treinar e descobrir…
Em Atenas 2004, sem surpresa (bem sabemos), voltou a subir ao pódio. Fischer ganhou mais uma prata, em K2 500m, e mais um ouro, em K4 500m, transformando-se na mais velha a fazê-lo naquela modalidade.
Resumindo, esta senhora da canoagem ou a ‘senhora canoagem’ conquistou 12 medalhas olímpicas em seis Jogos, numa fita do tempo que se estende por 24 anos.
É a única mulher que sabe o que é vencer medalhas de ouro em seis olimpíadas. No museu lá de casa guarda oito metais redondos dourados, sendo apenas superada pelos nove da ginasta Larissa Latynina e agora de Katie Ledecky, a especial nadadora norte-americana.