11 set, 2023 - 15:56 • Inês Braga Sampaio , Luís Aresta
[Atualização às 16h14 do dia 26 de setembro de 2023: O recorde de Samuel Barata foi anulado, devido a um erro de medição. Após nova medição do percurso, prática protocolar sempre que há um novo máximo mundial, como aconteceu no feminino, verificou-se que o trajeto tinha menos 25 metros do que era suposto, ou seja, somente 9,975 quilómetros.]
O que é que se pode fazer em 26 segundos?
Respirar pelo menos cinco vezes. Piscar os olhos seis a oito vezes. Ler mais de 100 palavras deste texto. Mandar uma mensagem a um amigo ou apertar os cordões das sapatilhas. O recordista mundial dos 400 metros, o sul-africano Wayde van Niekerk, ainda estaria a percorrer a segunda metade da pista nos 26 segundos que, agora, separam o novo recorde nacional dos 10 quilómetros em estrada do antigo.
Samuel Barata derrubou a histórica marca de Fernando Mamede, que resistia há 38 anos, em 27 minutos e 45 segundos. Tirou, precisamente, 26 segundos ao recorde do antigo atleta, de 28m11s.
"Era um recorde que sonhava já há algum tempo bater", admite o atleta do Benfica, de 30 anos, em entrevista à Renascença, um dia depois do momento de glória em Brasov, na Roménia.
Um recorde fácil e difícil, nas palavras de Samuel Barata. Fácil porque era dos mais acessíveis de um rol de marcas históricas portuguesas no fundo e no meio fundo, em que constam recordes da Europa e do mundo. Difícil porque "correr na estrada a ritmos rápidos não é nada fácil".
Em 2022, Samuel ficara muito, muito perto: "Fiz 28m12s, faltava-me um segundo."
"Agora, fruto de muito trabalho - e não é de semanas, é de anos -, consegui bater o recorde e fazer uma marca abaixo de 28 [minutos]. Isto deixa-me super satisfeito e motivado para fazer bons resultados nas provas que se seguem", assume.
Nesta entrevista a Bola Branca, Samuel Barata explica que "há uns anos nunca [imaginou] que seria possível" inscrever o seu nome na primeira entrada da lista das melhores marcas dos 10 km estrada. O sonho tomou forma quando começou a correr na casa dos 29 minutos.
"Um dos grandes objetivos era baixar dos 29, consegui e, depois, isto é uma bola de neve, é a ambição", refere, com uma gargalhada. "Com os anos de treino, com os resultados a aparecer, cada vez tirava mais segundos e cada vez me aproximava mais dessa marca. Sonhei que era possível e, quando as coisas acontecem, é das melhores sensações do mundo. É mesmo brutal. Fico super satisfeito", completa.
Qual é, agora, o próximo desafio do recordista nacional dos 10 quilómetros estrada? Garantir a qualificação para os Jogos Olímpicos Paris 2024 numa distância mais de quatro vezes mais longa.
"A minha grande aposta passa pela maratona", explica, por gostar "muito das distâncias longas" e sentir que os 42 quilómetros favorecem mais as suas características.
Neste momento, Samuel Barata está "com um pé dentro, mas também com um pé fora" das Olimpíadas e o objetivo levou-o a prescindir da participação nos Mundiais de Atletismo em Budapeste, na Hungria. Ainda não conseguiu a qualificação, contudo, acredita que pode garanti-la numa maratona em outubro.
"Esse é o meu grande objetivo neste momento. Este resultado deixa-me super motivado e claro que também posso sonhar com uma qualificação nos 10 mil metros, apesar de que é muito mais difícil: só para ter noção, a quota para os 10 mil metros são só 27 atletas e na maratona são 80. Nunca se sabe, até posso conseguir, mas neste momento estou muito próximo na maratona. Espero que daqui a um ano o objetivo esteja cumprido", refere.
Samuel acredita que este seu recorde e outros resultados recentes no atletismo são um sinal de que o fundo e o meio fundo portugueses têm potencial para ser, novamente, dos melhores da Europa e do mundo.
"Houve ali uns anos em que deixámos de acreditar em nós próprios, mas temos valor", afiança o atleta português, que espera fazer parte deste ressurgimento de Portugal para os grandes resultados:
"Com estes resultados, também posso dizer que estou a aproximar-me da era de ouro. O nível internacional está muito elevado e, neste momento, em Portugal, os atletas já se aperceberam que têm de treinar mais, apostar mais e fazer fazer como os atletas estrangeiros: mais treinos em altitude e treino científico, para obter melhores resultados. Pouco a pouco isso está a acontecer e acho que, nos próximos anos, os resultados vão ser cada vez melhores. Espero estar a contribuir para isso."
Samuel Barata vê "uma nova geração de atletas" a chegar ao fundo e ao meio fundo.
Destaca Isaac Nader, de 24 anos, que se apurou para a final dos 1.500 metros nos Mundiais e ficou a cinco segundos do recorde nacional de Rui Silva, bronze olímpico em 2004. Também fala de Etson Barros, de 22 anos, que tem a terceira melhor marca portuguesa de sempre nos 3.000 metros obstáculos (menos de três segundos a mais que o recorde nacional de Manuel Silva, em 2004).
"[Nader, Barros e outros] estão a um nível brutal, são muito novos e vão fazer resultados excelentes tornar outra vez o nosso meio fundo de ouro. Acredito que, no futuro, vai haver bons resultados e os portugueses vão ficar orgulhosos", garante Samuel Barata.
Por enquanto, Portugal pode celebrar Samuel Barata, que pulverizou um recorde com quase 40 anos.