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Futebol

Formar para lucrar por muitos anos. Saiba como funciona o mecanismo de solidariedade da FIFA

10 set, 2024 - 09:50 • Inês Braga Sampaio

Um clube pode continuar a encher os cofres com um jogador por muitos anos depois de o vender. A Renascença explica como e faz a distinção para a compensação por formação, outro parâmetro que pode render dinheiro aos clubes formadores.

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Em cada transferência, seja uma entrada ou uma saída, os clubes deixam de lado uma parcela significativa para o mecanismo de solidariedade da FIFA. Mas o que é isso e como funciona?

Na verdade, há duas coisas distintas: a compensação por formação e o mecanismo de solidariedade. O segundo é aquele a que os adeptos de futebol estão mais habituados.

Por exemplo, no Relatório e Contas que publicou no domingo, em que apresentou um prejuízo de 31,4 milhões de euros, o Benfica revelou que, na venda de Petar Musa ao FC Dallas, por nove milhões, descontou mais de cinco milhões em "compromissos com terceiros", serviços de intermediação e retenção do mecanismo de solidariedade. Na venda de Lucas Veríssimo para o Al Duhail, por oito milhões de euros, os descontos ascenderam aos 4,1 milhões, pelos mesmos motivos.

Ainda assim, antes de explicar o que é o mecanismo de solidariedade, é importante fazer a distinção da compensação por formação. A compensação por formação, prevista no Artigo 20 do Regulamento de Transferências de Jogadores da FIFA, entra em jogo em duas circunstâncias apenas: quando um jogador assina o seu primeiro contrato profissional; a cada transferência internacional de um profissional até ao fim do ano civil do seu 23.º aniversário. O valor é calculado de acordo com vários fatores, incluindo a categoria de um clube, quanto custa treinar um jogador profissional por um ano e o rácio de atletas que é preciso formar para se produzir um jogador profissional, entre outros. Também pode variar se a transferência ocorrer no espaço económico europeu.

Quando é que a compensação por formação não é devida? Se o contrato com o clube vendedor for terminado sem justa causa; se o jogador se mudar para um clube de categoria 4 proveniente de outro de categoria superior; se a transferência implicar que o jogador readquira o estatuto de amador.

Veja-se, por exemplo, o caso de João Félix, que passou, entre os 12 e os 15 anos (a FIFA contabiliza o intervalo dos 12 aos 21 anos para estes cálculos, a não ser que fique provado que o atleta completou a formação antes dos 21), pelas escolas do FC Porto. Por isso, quando o internacional português assinou o seu primeiro contrato pelo Benfica, os encarnados tiveram de pagar uma compensação ao rival. Mais tarde, quando o avançado foi vendido ao Atlético de Madrid, com 20 anos, os dragões voltaram a receber uma compensação por formação.

Importa referir que este quadro de compensação por formação não se aplica ao futebol feminino. Em dezembro de 2023, o Conselho da FIFA aprovou um modelo específico com o objetivo de "encorajar a formação de jovens jogadoras, proteger o investimento dos clubes formadores e contribuir para o equilíbrio e a sustentabilidade competitivos do futebol feminino". Assim se lia numa circular de 30 de maio de 2024, quando o organismo levou a cabo uma sondagem, junto das suas associações-membro, de forma a "colher e analisar dados financeiros fidedignos relacionados com os custos de formação de jogadoras", o que permitiria "a categorização correta dos clubes e o estabelecimento de montantes de compensação por formação a pagar".

O mecanismo de solidariedade não tem termo - acompanha a carreira do jogador. Além disso, o período de formação é alongado até aos 23 anos. Por outro lado, aplica-se somente quando é paga uma verba pela transferência. Tem um valor fixo: 5% do valor total da operação. O que cada clube recebe depende de por quanto tempo e entre que idades formou o jogador.

São 0,25% por ano do 12.º até ao 15.º aniversários, para um total de 1%; e outros 0,5% dos 16 aos 23, para um total de 4%. Tudo junto, dá os referidos 5%.

Voltando ao exemplo de João Félix, o FC Porto teve, no total, direito a 1% dos 120 milhões de euros que o Atlético de Madrid pagou ao Benfica para o contratar, em 2019. Corresponde a uma verba de 1,2 milhões de euros, mais o valor correspondente à compensação por formação.

Normalmente, é o clube vendedor que tem de pagar o mecanismo de solidariedade, no entanto, havendo acordo entre ambos, essa tarefa pode passar para o clube comprador. No caso de João Félix, aconteceu precisamente isso: no comunicado enviado, na altura, à CMVM, o Benfica informou que seria o Atlético a assumir as despesas de formação do jogador.

O Benfica também beneficiou do estatuto de clube formador de João Félix, este verão. O Atlético vendeu o jogador português ao Chelsea, por 52 milhões de euros, o que rendeu 5% aos clubes por que passou entre os 12 e os 23 anos: FC Porto, Padroense (a que esteve emprestado pelos dragões) e Benfica. Não houve, desta vez, compensação por formação, uma vez que o avançado já tem 23 anos de idade.

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