31 mai, 2024 - 11:25 • Inês Braga Sampaio
Encarnar Lars Ricken. É com esse objetivo que o Borussia de Dortmund entrará em campo no sábado, frente ao todo-poderoso Real Madrid, na final da Liga dos Campeões: recuperar o espírito do avançado que, em 1997, pintou a Europa de preto e amarelo com um único toque na bola.
A final era em Munique, em casa do Bayern, o maior rival do Borussia, e frente à Juventus, campeã em título e presença assídua em finais da Champions. É a história de que o desporto mais gosta: David contra Golias, Rocky Balboa contra Apollo Creed, Grécia contra Portugal.
A Juventus tinha Didier Deschamps, Christian Vieri, Alessandro Del Piero, Zinedine Zidane. Era a grande favorita a vencer a prova e o percurso quase perfeito até aí mostrava-o. Porém, o Dortmund, com o internacional português Paulo Sousa no onze inicial, demorou apenas 29 minutos a desafiar as probabilidades.
Cruzamento de Paul Lambert da direita e Karl-Heinz Riedle pontapeou a bola lá para dentro. Cinco minutos mais tarde, só mudou o assistente: canto de Andreas Möller para a área e o avançado fez o 2-0.
"O que é que se está a passar aqui?", questionava o narrador.
A Juventus tentou reagir, mas havia sempre algo no caminho: um poste tirou um golo a Zidane; uma mão na bola anulou um golo de Vieri. Até que, ao intervalo, Marcello Lippi decidiu fazer entrar Del Piero e as hostes alemãs tremeram: minuto 64, bola da esquerda e o "10" desviou de calcanhar para um grande golo.
Ao minuto 70, nova contrariedade: Kalle Riedle, que marcara os dois golos do Borussia, lesionou-se e teve de ser substituído. Ottmar Hitzfeld chamou Lars Ricken e disse-lhe: "Lars, entra e marca o golo decisivo!"
Dito e feito. Bastaram cinco segundos para o então jovem de 20 anos aproveitar o adiantamento do guarda-redes da Juventus, Angelo Peruzzi. Assim recordou Ricken, há cinco anos, em entrevista à UEFA:
"Reparei que o Peruzzi se colocava várias vezes demasiado longe da sua baliza e entrei com isso em mente, a pensar: 'O Peruzzi está demasiado longe da baliza, o Peruzzi está demasiado longe da baliza...' Não podia ter corrido melhor. Ao fim de cinco segundos em campo, o Andreas Möller passou-me a bola e até os comentadores da TV gritavam: 'Faz-lhe o chapéu!'."
Foi exatamente isso que Lars Ricken fez. Depois de desmarcado por Möller, na passada e ao primeiro toque - o primeiro toque na bola no jogo -, o número 18 do Borussia de Dortmund tirou um chapéu de aba larga ao guarda-redes da Juventus e "matou" a final da Liga dos Campeões.
"Marcas um golo assim uma vez em dez, mas desta vez funcionou. O destino estava do meu lado", declara o herói de Munique, que em maio foi assumiu as funções de diretor desportivo do Dortmund.
Foi o primeiro - e único, até agora (derrota na final de 2013 vs. Bayern) - título do Borussia. Na altura, Paulo Sousa, que no verão trocara a Juventus pelo clube alemão, tornou-se o primeiro jogador a conquistar a Champions duas vezes seguidas por dois clubes diferentes.
A Juventus voltaria à final na época seguinte, e voltaria a perder, para o Real Madrid, que quebraria um jejum de 32 anos sem ser campeão europeu. São, precisamente, os espanhóis, o adversário do Borussia de Dortmund na final de sábado, em Wembley. Não são os campeões em título, mas venceram cinco das últimas dez edições, a última há duas temporadas, e são claramente favoritos.
Além do historial na Champions, o Real Madrid acaba de vencer o campeonato espanhol, ao passo que o Dortmund ficou num modesto quinto lugar. O percurso na prova, contudo, foi igualmente complicado para ambos: os espanhóis ultrapassaram o ainda campeão em título, o Manchester City, e depois o Bayern de Munique; os alemães eliminaram o Atlético de Madrid e o Paris Saint-Germain.
No sábado, o Borussia tentará encarnar o espírito de Lars Ricken e da equipa de 1997 para derrubar o recordista de títulos da Liga dos Campeões (14) e, pela segunda vez na história, sagrar-se campeão europeu.