"Gravíssimo". Acusação da Benfica SAD já "não é um rival que encontrou uns e-mails"

O caso dos e-mails já não se resume a um arrufo de clubes rivais ou a acusações de "polvos". No entender do advogado Ricardo Salazar, o facto de haver uma acusação do Ministério Público (MP) contra a SAD do Benfica, Luís Filipe Vieira, seu ex-presidente, e Paulo Gonçalves, antigo assessor jurídico, é, por si só, "gravíssimo".

Em entrevista à Renascença, Ricardo Salazar salienta que "só o facto de uma entidade como o Ministério Público estar a proferir uma acusação e pedir essa medida de pena é bastante gravoso".

"Pode mostrar que, efetivamente, houve um período no futebol português com pessoas que se julgavam acima da lei e que puderam ter feito atos que têm de ser censurados", assinala.

Numa breve explicação do processo, o advogado salienta que, após as buscas que recaíram sobre vários clubes portugueses, um deles o Benfica, "ou haveria arquivamento ou acusação". Agora, "a questão é saber se a acusação pode ser sustentada em julgamento, que pode dar condenação ou absolvição".

Além da Benfica SAD, de Vieira e de Gonçalves, também a SAD do Vitória de Setúbal está acusada. Todos respondem por alegados crimes de corrupção e fraude fiscal qualificada, devido a uma alegada simulação de compra e venda de jogadores com o suposto objetivo de injetar dinheiro no clube sadino, que atravessava grandes dificuldades financeiras, entre 2016 e 2019.

O ex-presidente encarnado é considerado o "mentor" deste esquema, que teria como suposto objetivo subverter a verdade desportiva através do controlo de outros clubes, que por sua vez facilitariam em jogos frente às águias

"Neste momento é o 'in dubio pro reo' e, nesse sentido, não há ninguém condenado. O que tem de acontecer é o benefício da dúvida", ressalva Ricardo Salazar.

Ainda assim, e no caso de a acusação se concretizar, "estamos perante algo terrível e negro para o futebol português e para a sociedade".

"A ser verdade o que consta da acusação - são crimes de muito difícil investigação e prova - é que, ao longo de um determinado período, uma instituição relevante na sociedade portuguesa, através do seu presidente e braço direito, foram entidades que conseguiram aliciar, influenciar e chegar a outros clubes e fazer com que houvesse situações de corrupção e falsificar a verdade desportiva", realça.

E num campeonato "tão competitivo" como o português, em que por vezes o título se decide por um, dois ou três pontos, "se um clube estiver na dependência do outro, direta ou indiretamente, pode significar seis pontos, que é muito", alerta o advogado.

"Isto é gravíssimo do ponto de vista de imagem. Não é um clube rival a dizer que encontrou uns e-mails. É o MP a dizer que, pela prova verificada, o [então] presidente [do Benfica] cometeu crimes que são do mais nocivo para a nossa sociedade", diz, antes de prosseguir.

"Embora seja um crime dito de colarinho branco, é o que nos faz muitas vezes perder capacidade competitiva, a incapacidade de ombrear com países mais desenvolvidos e vai destruindo o nosso tecido social. Um clube, ou um banqueiro, alguém com poder pode chegar a todo o tipo de pessoas. Quer a nível de vida social, quer desportiva, podemos estar perante o que chamaram um polvo, uma organização com putativos donos disto tudo", lamenta.

O Ministério Público pede que o Benfica seja suspenso de todas as competições desportivas. Nestas declarações a Bola Branca, Ricardo Salazar explica que, agora, "o mais certo" é que os arguidos peçam a abertura da instrução, uma fase facultativa após a qual um juiz de instrução decidirá se há matéria para manter as acusações.

No caso hipotético de uma condenação, "não haveria influência a nível de campeonatos transatos", que já foram homologados. De qualquer forma, Salazar admite que muito dificilmente, no caso do Benfica, a pena chegaria ao caso mais extremo - a exclusão das competições desportivas, que é o que o MP pretende:

"Não falando como advogado, mas como cidadão, era mais fácil D. Sebastião ser encontrado que o Benfica ser suspenso. Sabemos a influência que certas entidades têm neste país. Tudo bonito na justiça, podemos acreditar na aplicação cega da justiça, mas seria preciso algo calamitoso para o Benfica ser suspenso das provas."

O Benfica já reagiu ao caso. Em comunicado, o clube classifica as acusações do Ministério Público como "infundadas" e garante que "se defenderá, sem hesitar, de todas as acusações".