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OE 2025 - a visão da OCC

11 out, 2024 • Paula Franco, Bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados • Opinião de Opinião


Há sempre quem entenda que os Orçamentos pecam por falta de ousadia nas medidas propostas, e que deviam ser o instrumento para colmatar as lacunas do sistema. Outros preferem versões minimalistas, pela dificuldade de alcançar consensos.

Como habitualmente, os Orçamentos do Estado são comentados na perspetiva do que contêm e do que neles se entende que falta.

Há sempre quem entenda que os Orçamentos pecam por falta de ousadia nas medidas propostas, e que deviam ser o instrumento para colmatar as lacunas do sistema. Outros preferem versões minimalistas, pela dificuldade de alcançar consensos.

O que marca de forma distinta este Orçamento é a convergência entre os parceiros sociais, já que a maioria das medidas já tinha sido acordada no início deste mês, dando-se agora concretização legal na proposta apresentada. Por isso, este Orçamento parte de medidas de políticas públicas com largo consenso social, que visam, essencialmente, a valorização salarial, incluindo a otimização dessa valorização pela via fiscal.

De todo o modo, excluindo as alterações ao IRS Jovem e uma tímida redução da taxa de IRC, o que temos são medidas pontuais e de correções a normas que careciam de melhoramentos.

Temos um vasto conjunto de exemplos destas medidas, como a isenção de prémios de produtividade, de desempenho, participação nos lucros e gratificações de balanço na lógica da premiação fiscal do chamado 15.º mês, redução em 50% da taxa de retenção autónoma de IRS sobre o trabalho suplementar, isenção da taxa liberatória de IRS aplicável aos trabalhadores não residentes às primeiras 100 horas de trabalho suplementar, aumento do limite fiscalmente isento de tributação no subsídio de refeição, e, por fim, a atualização dos escalões de IRS de forma a assegurar a neutralidade fiscal das atualizações salariais.

A discussão em torno do IRS Jovem, que polarizou o debate político, concretiza-se num alargamento do âmbito de aplicação significativo deste regime, não só em termos de idade (passamos dos 18 aos 26 anos para qualquer idade até aos 35 anos), nível de escolaridade (o que permite incluir os trabalhadores a partir do nível de estudos secundários), como no período de 10 anos, para conferir estabilidade e segurança aos jovens), assim como em generosas reduções de imposto, que, no primeiro ano, se concretiza numa isenção total, e em reduções de 75% (do 2.º ao 4.º ano), 50% (do 5.º ao 7.º) e 25% nos restantes anos, em qualquer caso sujeitando a isenção a um limite máximo de 55 IAS (cerca de 28.000€).

Contudo, esta medida não pode ser vista como o único ou mais relevante fator para atrair a permanência dos jovens. De todo o modo, e indo menos longe do que seria, porventura, desejável, é um sinal de esperança. Aos que põem o acento discriminatório nesta medida, notamos que a discriminação positiva não fere, irremediavelmente, o princípio da igualdade. A igualdade em sentido positivo envolve a obrigação de tratar igualmente o que é igual e desigualmente o que é diferente. E a constatação de que os trabalhadores jovens estão hoje numa situação diferente dos menos jovens é uma evidência, pelo que consideramos relevante o tratamento desigual, por pretender objetivos legítimos de retenção desse bem tão escasso que é o talento. E a solução de compensação desta desigualdade também se nos apresenta evidente, pois estes jovens que se conseguirem reter contribuirão para a sustentabilidade do modelo social nacional.

Quanto às empresas, não podemos dizer que este Orçamento tenha sido ambicioso. Para além da concretização da redução da taxa de IRC em apenas 1%, propõem-se pequenos acertos à tributação autónoma, no sentido da sua redução, na utilização de viaturas, seja na eliminação de tributação autónoma em certas despesas de representação, melhoria do acesso a benefícios fiscais à capitalização de empresas e a manutenção do desagravamento da tributação autónoma para empresas com prejuízos, mas que tenham lucro tributável em um dos três períodos de tributação anteriores e para as empresas em início de atividade e nos dois anos seguintes.

Temos vindo a defender que a redução da taxa de IRC é uma medida essencial para a competitividade das empresas e para a economia em geral e que se poderia ter ido mais longe, promovendo uma substancial redução da carga fiscal, o que permitiria, por exemplo, canalizar essa poupança para a valorização salarial.

Continuamos a ter das taxas nominais e efetivas de IRC mais altas da União Europeia, e tendo em conta a liberdade de uso deste instrumento de política económica, não ir mais longe obriga a financiar a valorização salarial à custa da redução da remuneração do capital, já que será difícil conseguir aumentar mais a produtividade num contexto de escassez de mão de obra, carência de matérias-primas e contexto geopolítico instável. Num cenário em que nem as taxas de IRS descem em termos reais nem a descida da taxa de IRC é significativa, saem penalizados quer o trabalho quer o capital.

Por fim, uma medida que pode passar mais despercebida, mas que muita relevância social tem, é a de, finalmente, se dar cumprimento a uma medida de troca de informações entre autoridades públicas que permita informar os herdeiros dos detentores de títulos e certificados de dívida pública (certificados de aforro) dos investimentos feitos pelos autores da sucessão. Assim se evitará que estes investimentos revertam para o Estado e retornem, justa e tempestivamente, aos herdeiros dos investidores.

E, como começámos por dizer, este também é um Orçamento de ausências, nalguns casos justificáveis, pela necessidade de se evitar a criação de obstáculos à aprovação das medidas indicadas, reputadas de mais urgentes, e assim assegurar a sua aprovação, noutros por estratégia política.

Falamos também de medidas já acordadas em concertação social, como o Programa Acelerar a Economia, à luz das novas diretrizes europeias de aumento da competitividade, da produtividade e do investimento.

Mas falamos também de outras medidas em relação às quais existia alguma expetativa, como a reintrodução do regime dos residentes não habituais e a revogação do atual regime do incentivo fiscal à investigação científica e inovação, cuja implementação tem conhecido um caminho errático e que não garante segurança nem estabilidade aos beneficiários.

Para a profissão, notamos positivamente a continuação do adiamento de obrigações que carecem de ponderação e avaliação de impacto, como a comunicação de inventários valorizados, o SAF-T da contabilidade e a aceitação das faturas em ficheiro pdf como faturas eletrónicas.

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