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Manuel Pinto
Opinião de Manuel Pinto
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Sobre a “situação de emergência” nos media (1)

03 dez, 2018 • Opinião de Manuel Pinto


As palavras de Marcelo Rebelo de Sousa tiveram alguma repercussão, mas há o risco de se correr para as terapias sem ter feito ainda o diagnóstico.

Na cerimónia de entrega dos prémios Gazeta de jornalismo, o Presidente da República lançou o desafio: existe uma “situação de emergência na generalidade dos media” e cabe ao Estado ponderar se e como atuar, dada a relevância da comunicação social para a democracia.

As palavras de Marcelo Rebelo de Sousa tiveram alguma repercussão, mas há o risco de se correr para as terapias sem ter feito ainda o diagnóstico. Desde logo, saber de que estamos a falar. Como caraterizar exactamente esta “situação de emergência”? Quais os media que se consideram na “generalidade dos media”? E é uma crise sobretudo económica, de negócio, ou é mais estrutural? Estamos a falar especialmente de jornalismo ou também de outras funções que os media desempenham? Pensamos prioritariamente na informação regional e local e na malha de cobertura que os media (não) asseguram ou no panorama nacional? Serão as empresas de media o único ou principal foco das atenções ou o enfrentamento da crise deverá considerar outros centros de gravidade? E quais as responsabilidades das multinacionais como o Google, Facebook e quejandos, empresas ditas tecnológicas, que afinal são também de conteúdos (dos outros)?

Sem obstar a que numa situação de emergência se deva adotar medidas de emergência, é, no entanto, necessário ter em conta o seguinte:

- Um diagnóstico de situação dos media está por fazer em Portugal. Existem diagnósticos sectoriais e dados e estudos fragmentários, mas há aqui trabalho a fazer;

- O Estado, que é um parceiro importante no sector dos media, desinvestiu, nas últimas décadas, na sua vertente de definição e promoção de políticas públicas;

- Os próprios meios de comunicação social, que procuram escrutinar toda a vida social, desinvestiram, nas últimas décadas, de escrutinar-se a si mesmos.

A consequência deste último ponto é particularmente grave, visto que se quer agora uma resposta do Estado à crise, sem que a cidadania esteja devidamente informada sobre essa crise. As áreas de media desapareceram das redacções e com elas os jornalistas especializados nesse campo. Os focos voltaram-se para o vedetismo e os sucessos e, de quando em vez, para as desgraças … dos concorrentes. Neste vendaval, que afetou também outras áreas da vida pública, os cidadãos foram privados da informação relevante para a compreensão daquilo que o Presidente caracteriza agora como situação de emergência.
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