20 set, 2023
A rentrée política de 2023 foi em grande parte preenchida pela discussão mediática sobre os protocandidatos às eleições presidenciais de janeiro de 2026. Faltam 28 meses – mais de dois anos. Até lá, haverá eleições regionais, europeias, autárquicas, talvez até legislativas. Mas janeiro de 2026 é o que interessa. No fundo, o assunto não interessa. Mas interessa que ele seja tornado tópico, porque esse entretenimento serve duplamente ao governo: divide, porque multiplica, nomes à direita (como se à esquerda não existisse já burburinho), e impede que, na bolha mediática e fora dela, se fale do que deveria ser falado. E do que deveríamos estar a falar, a nove meses de umas eleições europeias bem mais importantes do que se pensa, era do país, de Portugal, e dos seus bloqueios conjunturais a caminho de se tornarem estruturais.
Do parlamento europeu que for eleito em 2024 sairá a nova Comissão Europeia para o mandato de 2024-29. No seu discurso do estado da União (o último deste mandato), Ursula von der Leyen entreabriu a porta à recandidatura. O seu eventual 2.º mandato, contudo, será mais difícil do que o que está a terminar. Mesmo sem uma nova pandemia, a espiral de dificuldades europeias já é visível. A UE está economicamente entalada entre os EUA, cujo PIB total ou per capita progride mais do que o europeu desde 2008, e a China e seus parceiros, onde o “dumping social” é uma alavanca de competitividade… e de concorrência desleal. Os 50MM€ de euros prometidos à Ucrânia, no âmbito de uma política de alargamento que chegará à Geórgia ou Moldávia, vão exigir um esforço orçamental significativo, e o novo Pacto para as Migrações e Asilo, que quer equilibrar soberania e solidariedade, não evitará, e aumentará até, a força dos populismos xenófobos. Soma-se a isto a evidência de que o continente está a entrar em recessão, com vários países a apresentarem já taxas de crescimento negativas. Quando a locomotiva alemã parar, o comboio fica a meio caminho; e a pequena carruagem portuguesa não terá quem a puxe.
É nesta Europa (mais) aflita que o resto do governo de António Costa e de quem vier a seguir (até poderá ser Costa a suceder a Costa) terá de se posicionar. E é muito sério (não exagero) lembrar alguns dos bloqueios ou dependências do país que de conjunturais já se vão tornando estruturais. O Instituto +Liberdade (de que não faço parte), coligiu, no seu livro «Portugal em 50 Factos», números reveladores. A economia portuguesa estagnou desde o início do século, com médias decenais inferiores a todo o período compreendido entre 1940 e 2000. Em 2002, Portugal ocupava o 15.º lugar na UE27 em termos de PIB per capita; em 2015 estava em 18.º lugar; hoje ocupa o 21.º lugar. Conseguiu apenas ultrapassar a Grécia, foi ultrapassado por Hungria, Polónia, Malta, Chéquia, Eslovénia, Lituânia e Estónia, e sê-lo-á em 2024 pela Roménia! No Ranking Global de Competitividade, recuou do 36.º para o 42.º lugar de 2021 para 2022 (já sem pandemia). Mais beneficiário (424€ por habitante), do que contribuinte (179€ por habitante) do orçamento europeu, Portugal é o país da UE onde os fundos comunitários (leia-se, a brutal dependência da Europa) têm maior peso (88%) no investimento público (a média da UE é de 14%). Se não começarmos a fazer a nossa parte, enquanto a crise do nosso “patrono-financiador” não se torna muito óbvia, seremos dos mais sofredores num futuro não longínquo. A não ser que fiquemos satisfeitos, como o governo quer que os jovens fiquem, com a oferta de quatro bilhetes de comboio e uma semana de férias em Pousada da Juventude. Com um bocadinho de jeito, quem sabe se não é a Europa que também paga isto.