01 jun, 2022
Apesar de já ter votado várias vezes no PSD, não sou, nem nunca fui, militante do partido (aliás, não sou militante de nenhum). Contudo, os rumos da direita portuguesa - ou das direitas - interessam-me, como também me interessam os das esquerdas, sob o ponto de vista de saber os projetos de cada um dos campos ideológicos para o país.
O PSD, ou seja, a direita que era quase toda a direita quando só havia CDS, foi a votos para eleger o 19.º titular da mais importante cadeira da São Caetano à Lapa. A vitória de Luís Montenegro sobre Jorge Moreira da Silva não deixa margem para dúvidas (72,5% contra 27,5%). A sua maioria expressiva assegura-lhe um partido unido, ou pelo menos disciplinado, até às Europeias de 2024, talvez até ao confronto com António Costa (ou com Pedro Nuno Santos) em 2026. O “ríoismo”, se existiu, saiu de cena; mas não é ainda claro se vai haver (ou sequer se é possível haver) “montenegrismo”.
Luís Montenegro desceu do norte para a Assembleia da República em 2002, e ao norte voltou para uma candidatura derrotada à Câmara de Espinho, em 2005. Há quem lembre que foi Miguel Relvas quem o “inventou” e o recomendou a Passos Coelho. Em 2011, o nascente “passismo” escolheu-o para líder da bancada parlamentar do PSD, e Montenegro revelou-se como um dos rostos da defesa do programa de austeridade imposto pela Troika, embora com frases que não (o) ajudaram (“A vida das pessoas não está melhor, mas o país está melhor”). Perdeu as diretas contra Rio em 2020, não compareceu em 2021, ganhou em 2022. E agora, o que fazer com este triunfo?
No discurso de vitória, Montenegro anunciou “o princípio do fim da hegemonia socialista” e que o novo PSD não vai “falhar a Portugal”. Eis o que se verá. O novo líder não quis integrar as listas para o parlamento nas eleições de março passado: não estará, portanto, na Assembleia (onde estão Ventura e Cotrim) para debater com Costa quando ele por lá aparecer, e terá de liderar, à distância, uma bancada escolhida pelo líder cessante. A malha autárquica do PSD vai rareando e a boa moeda de Moedas, em Lisboa (ou de Pinto Luz, em Cascais) poderá ensombrar, mais do que ajudar. Num país onde a sociedade civil existe minguada e onde o Estado manda em quase tudo, num partido que está fora das prebendas há sete anos, a capacidade de Montenegro mobilizar será o seu verdadeiro teste. O partido que já foi de Sá Carneiro, de Cavaco e de Passos (as três lideranças mais fortes da sua história) perdeu para o PS o chamado voto dos reformados e de muitos interesses que gravitam em torno do “partido-Estado”, para a IL o voto dos liberais jovens e para o Chega o voto de uma ala conservadora. Ao não debater com Moreira da Silva, Montenegro perdeu oportunidade de dar a conhecer o seu projeto para fora, para o país, assim começando a cativar novas vozes não-socialistas, listando ideias-fortes que posicionem o partido como alternativa viável (o que hoje não é claro), e superando a crise em que ele se encontra, no marasmo de quem apenas faz prova de vida, e de quem vê, a seu propósito, discutir-se não o futuro de Portugal, mas o próprio futuro do PSD.
A democracia portuguesa não foi só obra do Partido Socialista, nem este tem direito a considerar o regime como coutada exclusiva. Do reformismo pré-democrático da Ala Libera à contenção do PREC, da esperança da AD à modernização na CEE e à gestão de crises alheias no século XXI, o PSD tem uma larguíssima folha de serviços prestados ao país. Talvez essa longa história possa ser o “roadmap” inspirador para um primo ministeriável em 2026 - começando, aliás, por contrariar a sobranceria de uma certa esquerda, que hoje afirma que a direita (já) não conta para nada.