15 dez, 2021
Joacine contra o mundo José Miguel Sardica Professor da Universidade Católica Portuguesa Joacine Katar Moreira, a antiga parlamentar do Livre, tem oferecido ao mundo os tribalismos verbais intolerantes da sua militância antirracista. Há dias, a deputada reagiu a um cartaz do Bloco de Esquerda em que Catarina Martins anuncia “razões fortes, compromissos claros”.
Nas redes sociais, Joacine declarou concordar, mas logo apelou a que se deixasse de usar o adjetivo “claro” e a própria dicotomia claro/escuro naquele, ou noutros contextos. Ou seja: em causa estará a associação do “claro” a algo positivo – no caso, compromissos esclarecedores – e, por contraste, do escuro, do negro ou do preto, como cores, a algo sempre negativo. Os antirracistas policiam tudo o que existe, respira e mexe e, portanto, também a linguagem precisa de ser racialmente neutralizada. Imagino até que Joacine tenha pena por os polícias de serviço não poderem impor a inversão vocabular, pela qual seria o “escuro” o positivo e o “claro” o negativo.
Se até já o BE é réu de opressão verbal, parece não haver esperança para Joacine neste mundo. Acontece que não é o mundo que conspira contra a deputada, mas esta que está e estará sempre contra o mundo. Dizer que a expressão “compromissos claros” é racista – porque é isso que Joacine implicitamente afirma – é revelador do ar do tempo em que vivemos. Por mim, só posso dizer que não se trata de racismo, mas de física! E a física, por ser…física, ou seja, do domínio natural, pré-existente ao homem e à mulher de qualquer cor que eles/elas sejam, não é adjetivável como racista. “Compromissos claros” provém de “clareza” (verbal e ideológica) e esta de “claridade”, atributo físico que advém do facto de que só com iluminação, na luz, é possível descortinar, ver, distinguir, esclarecer. Ainda antes de a humanidade moderna descobrir as leis da física, já o hominídeo percebera que o fogo alumiava a escuridão da caverna, já os egípcios cultuavam o sol, cuja luz fertilizava o Nilo e guiava os mortos além-túmulo, e já a Bíblia registava, pela pena do profeta Isaías ou do evangelista Mateus, que “o povo que andava nas trevas, viu uma grande luz”. E, permita-se-me a paráfrase, Deus viu que isso era bom! Muitos séculos depois, o espírito das Luzes do Iluminismo (“Lumières”, “Enlightenment” ou “Aufklärung”) opôs-se às trevas censórias da cultura inquisitorial de antigo regime. Numa palavra: ninguém vê na escuridão; só com luz, que é clara, branca, alva e etc., provinda do dia, do sol, da vela ou da lâmpada. E reconhecer que existe uma dicotomia claro/escuro, luz/escuridão – uma evidência sensorial das mais básicas da existência terrena – não é ser cúmplice de qualquer espécie de opressão racial.
Em 1963, no seu famoso discurso «I have a dream», Martin Luther King afirmou: “Now is the time to rise from the dark and desolate valley of segregation to the sunlit path of racial justice”. Reparem: que se abandonasse “o escuro e desolado vale da segregação” (racial – numa escala e num tempo bem mais duros do que os da aconchegada posição da senhora deputada no Portugal de hoje), e que a América e o mundo transitassem para “o ensolarado caminho da justiça racial”. Será necessário rever e rasurar Martin Luther King? Quererá Joacine, por absurdo, que as nuvens do céu sejam escuras e não brancas, para que o cosmos não ofenda a sua negritude militante?
O problema – lá está, físico – é que as nuvens negras escurecem o céu (a meteorologia explica porquê) e, misturadas com a noite, que também é escura (desde a criação do mundo), elas podem impedir brancos, negros e todas as outras raças ou etnias que coexistem debaixo do céu, de, muito simplesmente…verem!