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Uma parceria entre a Renascença e o jornal “Público”. Entrevistas aos protagonistas da atualidade. Quinta às 23h20.
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António Leitão Amaro. “Costa é tão derrotado como Medina”

30 set, 2021 • Eunice Lourenço (Renascença) , Sofia Rodrigues (Público)


O ex-vice-presidente da bancada parlamentar do PSD António Leitão Amaro acredita que o sucesso de Carlos Moedas em Lisboa se pode repetir no país se o PSD apresentar uma “alternativa diferenciadora, reformista” e não for uma mera “muleta”. Sobre se a atual liderança de Rui Rio representa essa visão, o ex-deputado remete uma avaliação para o “momento próprio”.

António Leitão Amaro. “António Costa é tão derrotado como Medina”
Hora da Verdade com António Leitão Amaro

António Leitão Amaro, um dos conselheiros de Carlos Moedas na campanha de Lisboa, diz que o candidato social-democrata é “o primeiro e o último responsável” pela vitória em Lisboa. Em entrevista ao programa Hora da Verdade, da Renascença e do jornal 'Público', o ex-secretário de Estado da Administração Local considera que os resultados das autárquicas “são um sinal de fim de ciclo” e acredita que PS e CDU não vão pôr em causa o mandato do novo presidente eleito.

O resultado de Lisboa foi uma vitória de Carlos Moedas ou sobretudo uma derrota de Fernando Medina?

Foi claramente uma vitória de Carlos Moedas por duas razões: primeiro, o Carlos Moedas cresceu e venceu, na expressão dele, contra tudo e todos porque apresentou esta alternativa reformista que deu esperança às pessoas. Ele soube, e foi o único, de uma forma assertiva e intransigente, mostrar os fracassos, os erros e os falhanços da governação socialista.

Mas Medina perde 25 mil votos em relação a 2017.
Quando as urnas abriram às 07h30 da manhã não havia nenhum voto nas urnas. Todos os votos têm de ser ganhos de volta. Se quiser falar de derrotados, António Costa é tão derrotado como Fernando Medina porque as políticas sempre foram de António Costa, e seguidas por Medina, porque se envolveu na campanha. Há um mérito que tem de ser compreendido na denúncia do que está errado: aquela governação carregada de problemas éticos, de promiscuidade, de utilização do aparelho autárquico e municipal para distribuir em função do interesse partidário, em grande medida clientelar.

Estes 25 mil votos que Medina perdeu terão ido para a IL e para o Chega. Se estes partidos estivessem na coligação, Moedas teria maioria mais confortável?
A conclusão dessas transferências de voto é polémica.

Falo mais da Iniciativa Liberal...
Os resultados falam pelo erro tremendo que o partido fez e espero que possam corrigi-lo com o tempo, mas é uma falsa partida autárquica. A opção foi basicamente privilegiar o interesse partidário. Felizmente, e isso também é uma lição para o PSD, é possível o PSD ser liderante e ganhar a partir da sua base e com o seu cunho e a sua marca. Poderia haver circunstâncias que permitiriam um resultado ainda maior, mas este resultado é extraordinário, lembramos o que toda a gente dizia a poucas semanas da eleição. Se a IL poderia ter estado dentro do projeto, e não quis por interesse partidário, creio que hoje só pode estar arrependida e muitos dos seus eleitores a dizerem o mesmo.

Como é que Carlos Moedas vai governar a Câmara sem maioria?

As condições sobre a governabilidade do Governo não são a realidade das câmaras. Na câmara municipal, todos os eleitos pertencem ao executivo. O que significa que a dinâmica de decisão é completamente diferente. Um dos candidatos eleitos, derrotado, [João Ferreira] já veio dizer que irá votar tudo o que é positivo e ajudar a resolver a vida das pessoas. Ninguém compreenderia que o PS quisesse recusar os resultados eleitorais. O que os lisboetas escolheram foi Carlos Moedas e o seu programa. É muito combativo, mas é uma pessoa com uma enorme capacidade de construir compromissos.

O PS é que pode não estar nesse clima de cooperação...
Há que dar tempo ao PS... [Que] respeitem o vencedor e a vontade de mudança expressada pelos lisboetas. Todas as medidas são levadas ao executivo, que é plural. Vão votar contra o desagravamento de impostos? Contra transportes públicos gratuitos para avós e netos? Contra o acesso à saúde dos mais velhos? Nem na substância nem no espírito democrático qualquer desses cenários faz sentido.

Moedas disse que a mudança tinha começado em Lisboa, mas não vai ficar por Lisboa. O que quer dizer com isso?
O que quer dizer, eu assim o interpreto e concordo, é que em Portugal o centro-direita, desde que seja diferenciador na alternativa e que tenha uma proposta de governação e de políticas públicas, e de pessoas que sejam diferentes, e que tenham esse reformismo moderado, equilibrando a modernidade com a consciência e sensibilidade social, tem hipóteses de vencer eleições e mudar o país.

Isto pode ser o princípio do fim do ciclo socialista e o PSD pode estar em condições de ganhar as legislativas em 2023?
O PSD não tem porque achar que não está em condições. Há demasiados sinais do que chama de fim de ciclo. O desespero preocupante do primeiro-ministro nesta campanha com comportamentos que são politicamente e democraticamente inaceitáveis como o abuso da função de primeiro-ministro para privilegiar candidatos do seu partido, a propósito sobretudo da bazuca, aquela cabeça perdida nas declarações sobre a refinaria da Galp em Matosinhos são só mais alguns sinais de um Governo claramente sem rumo. Quando pôde aproveitar o pico do ciclo económico internacional, em 2017 e parte de 2018, pôde distribuir, e basicamente não tinha projeto para mais nada. Conhecemos a frase de Thatcher - o socialismo acaba quando acaba o dinheiro...

Mas agora vem aí muito dinheiro...
E é por isso que vemos esta sofreguidão de António Costa a tentar distribuí-lo com critério partidário. Aceitar e tolerar que candidatos do PS digam que se a câmara for socialista o dinheiro chega cá mais depressa, é uma coisa absolutamente inaceitável. Vem algum dinheiro, mas continua a ser uma parte pequena do PIB. Eu creio que estes resultados são também um sinal de fim de ciclo.

Neste momento, o PSD tem essa liderança diferenciadora de que fala?
Estivemos durante meses a trabalhar afincadamente para as autárquicas. Agora há uma fase de apreciação dos resultados e depois abrir-se-á esse processo de avaliação.

A vitória é de Moedas, é de Rui Rio ou também aconteceu apesar de Rui Rio?
Aconteceu com Rui Rio a presidente do partido, isso é indiscutível. Mas é uma vitória indiscutivelmente e essencialmente de Carlos Moedas. Ele é o primeiro, o último e o principal responsável. Porque o escolhido não é apenas um líder com características muito próprias - a capacidade técnica, a moderação, a humildade face a uma certa arrogância. Há um cunho individual e depois há um cunho programático e de estilo de oposição assertiva. Quanto mais nós sabemos - e aqueles de nós que sabem como as coisas se passaram na preparação da candidatura -, mais sabemos que o mérito é essencialmente de Carlos Moedas. É uma grande vitória e um sinal de grande esperança não apenas para Lisboa, mas para o país.

Estes resultados estão a travar os ímpetos para a sucessão de Rio. Acha que Rangel teve demasiada pressa?

Pressa? Creio que Rangel escreveu no seu jornal que este não é o tempo de fazer balanços.

Eu referia-me às semanas anteriores a domingo.
Eu vi Paulo Rangel, que é um dirigente nacional do PSD, um dirigente europeu e líder parlamentar no Parlamento Europeu, a correr o país inteiro como vi membros da direção nacional e vi outros militantes. Vi Marques Mendes, Luís Montenegro. Creio que fez o papel dele. O partido respondeu todo, de forma exemplar, sem exceção, ao apelo de Rui Rio: todos a marchar e a contribuir para uma vitória.

Quem é que pode protagonizar essa alternativa? Luís Montenegro ou Paulo Rangel?
Poderia equacionar outras possibilidades. Responder a essa pergunta era entrar numa discussão extemporânea.

Tem usado muito o termo centro-direita. O caminho é esse, de tentar agrupar o centro-direita, o PSD e o CDS aparecerem cada vez mais juntos, o que pode levar à diluição do CDS?
Pelo CDS falará o CDS. É indesmentível que tem havido uma interação e uma colaboração com grande cumplicidade, com uma grande coerência sincera entre os dois partidos, sobretudo, desde a última governação no país. E que deixou obviamente essas raízes. Acho que cada partido faz o seu caminho, eu gosto de ver um CDS forte, sinceramente, porque acho que representa um espaço próprio. Acho que o PSD tem outro espaço. Se houver outros partidos com os quais nos entendemos, claro que sim, agora o espaço natural do centro-direita é liderado pelo PSD e continuará a ser. E creio que o Carlos Moedas deu essa reposta cabal, mas se pudermos ir aos Açores e à Madeira, quer o José Manuel Bolieiro quer o Miguel Albuquerque, mostraram isso também: é possível liderar plataformas diferentes.

Ambas com o CDS.
Ambas com o CDS.

Mas também com o apoio parlamentar do Chega no caso dos Açores.

Não é exatamente nesses termos e de relação de governo. É outra discussão. A verdade é que se olhar aos resultados nas autárquicas nos Açores, o PSD cresceu e cresceu por si.

Em muitos concelhos do país, o Chega aparece em terceiro lugar, inclusive em Viseu, no seu distrito. Conseguiu eleger vereadores em grande parte das autarquias à volta de Lisboa. Como é que vê o crescimento deste partido?
Nós vemos esse crescimento num extremo do espectro partidário, do Chega, mas vemos um abatimento, uma queda abrupta no outro extremo do espectro partidário. O Bloco de Esquerda tem uma queda terrível, sem corresponder a um crescimento nem da CDU nem do PS, e a CDU também perde. Portanto não me surpreenderia muito que o crescimento do Chega estivesse ligado nestas eleições ao abatimento do outro extremo. Relativamente às opções e ao futuro do Chega: A resposta que Carlos Moedas deu é muito adequada.

E Rui Rio não tem sido suficientemente claro?
A resposta que o PSD deve dar é esta: nós temos o nosso programa e a nossa visão do mundo, que é inclusiva, aberta. O Chega tem de fazer o seu caminho e nós temos de fazer o nosso.

David Justino disse na Renascença, na segunda-feira, que até ao Congresso ainda há tempo para todos conversarem e haver uma espécie de reconciliação e de união no PSD. Acha possível?

Sobre o julgamento da capacidade que Rui Rio tem, terei seguramente muita coisa a dizer e tenho ideias convictas sobre isso que são para discutir no momento certo, que ainda não é este.

E não as quer partilhar agora?
Não é o momento de o fazer porque há outra mensagem mais importante para transmitir. É o país. Em Lisboa, aconteceu este aparecimento de novos tempos, este sinal de esperança de que é possível do centro-direita aparecer uma alternativa verdadeiramente diferenciadora e que a oposição é mesmo assertiva quando toca a denunciar os erros do Governo, em que se é alternativa e não muleta, em que se oferece um reformismo verdadeiro e coerente que combine de forma moderada as vertentes da modernidade, liberdade, consciência, preocupação e cuidado social, sobretudo com os mais vulneráveis. Como é que isto tudo que estou a dizer se declina em avaliação do desempenho de Rui Rio e as opções para o futuro do PSD é um juízo para o momento próprio.

Mas também com o apoio parlamentar do Chega no caso dos Açores.

Não é exatamente nesses termos e de relação de governo. É outra discussão. A verdade é que se olhar aos resultados nas autárquicas nos Açores, o PSD cresceu e cresceu por si.

Em muitos concelhos do país, o Chega aparece em terceiro lugar, inclusive em Viseu, no seu distrito. Conseguiu eleger vereadores em grande parte das autarquias à volta de Lisboa. Como é que vê o crescimento deste partido?
Nós vemos esse crescimento num extremo do espectro partidário, do Chega, mas vemos um abatimento, uma queda abrupta no outro extremo do espectro partidário. O Bloco de Esquerda tem uma queda terrível, sem corresponder a um crescimento nem da CDU nem do PS, e a CDU também perde. Portanto não me surpreenderia muito que o crescimento do Chega estivesse ligado nestas eleições ao abatimento do outro extremo. Relativamente às opções e ao futuro do Chega: A resposta que Carlos Moedas deu é muito adequada.

E Rui Rio não tem sido suficientemente claro?
A resposta que o PSD deve dar é esta: nós temos o nosso programa e a nossa visão do mundo, que é inclusiva, aberta. O Chega tem de fazer o seu caminho e nós temos de fazer o nosso.

David Justino disse na Renascença, na segunda-feira, que até ao Congresso ainda há tempo para todos conversarem e haver uma espécie de reconciliação e de união no PSD. Acha possível?

Sobre o julgamento da capacidade que Rui Rio tem, terei seguramente muita coisa a dizer e tenho ideias convictas sobre isso que são para discutir no momento certo, que ainda não é este.

E não as quer partilhar agora?
Não é o momento de o fazer porque há outra mensagem mais importante para transmitir. É o país. Em Lisboa, aconteceu este aparecimento de novos tempos, este sinal de esperança de que é possível do centro-direita aparecer uma alternativa verdadeiramente diferenciadora e que a oposição é mesmo assertiva quando toca a denunciar os erros do Governo, em que se é alternativa e não muleta, em que se oferece um reformismo verdadeiro e coerente que combine de forma moderada as vertentes da modernidade, liberdade, consciência, preocupação e cuidado social, sobretudo com os mais vulneráveis. Como é que isto tudo que estou a dizer se declina em avaliação do desempenho de Rui Rio e as opções para o futuro do PSD é um juízo para o momento próprio.

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