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"Há um desprezo económico, social e cultural pelas profissões operárias em Portugal"

HENRIQUE RAPOSO

"Há um desprezo económico, social e cultural pelas profissões operárias em Portugal"

09 jun, 2023 • Sérgio Costa , Pedro Valente Lima


Comentador da Renascença tem um familiar envolvido na construção do bolo de 12 metros de Joana Vasconcelos e aproveitou a deixa para falar da desvalorização destes "trabalhadores essenciais" no mundo Ocidental.

A 15 de junho, será oficialmente inaugurado o bolo de noiva com 12 metros de altura de Joana Vasconcelos. A obra da artista portuguesa tem 25 mil azulejos, mil peças de cerâmica, 3.500 peças de ferro forjado e conta com 12 metros de altura.

A estrutura ficará em exposição no Waddesdon Manor, parque de esculturas a 80 quilómetros a noroeste de Londres. Joana Vasconcelos concebeu a obra, mas quem é que a construiu? Sérgio Raposo, o primo de Henrique Raposo.

O comentador da Renascença aproveita esta deixa para falar sobre a valorização do trabalho operário e manual. "Nós temos um problema dramático, não só em Portugal, mas no Ocidente inteiro, que é um desprezo económico e social e até cultural pelas profissões operárias, pelas profissões manuais."

De acordo com Henrique Raposo, embora não se tratem de profissionais licenciados, não deixam de ser profissões "essenciais". "E a minha pergunta é: se são essenciais, porque é que ganham tão pouco?"

Por outro lado, o comentador realça que também há outras oportunidades na área em que se aufere um melhor salário, como é o caso de se "trabalhar para um atelier de um artista". "Um soldador como o Sérgio ganha bastante mais do que qualquer licenciado médio hoje em dia", sublinha.

"Nós temos um enorme setor metalúrgico em Portugal, exportador, que está sempre à procura de rapazes ou de raparigas para trabalharem e não conseguem. Dão bons empregos, com bons salários e não são preenchidos, porque houve um ataque cultural, económico e social à ideia de trabalhador manual."

Classe operária ficou "esquecida"

Henrique Raposo reforça a questão histórica e cultural associada às profissões operárias e à classe média, apontando, como exemplos, a "direita de Margaret Thatcher, que disse que temos de ser todos de classe média e que só podemos trabalhar em 'open space'", ou a esquerda, que "esqueceu os operários para se dedicar a outras causas".

"E ao ficar esquecida, temos um dos maiores dramas sociais de Portugal, que são os 'nem-nem'. São centenas de milhares de miúdos - ou milhões - em todos os países que não trabalham nem estudam, porque se criou esta ideia de que ou estás no nada ou chegas à Liga dos Campeões. Ou estás nas distritais, onde vives de biscates ou de um trabalho sem qualquer tipo de especialização, ou dás o salto para a Liga dos Campeões."

É nesse sentido que o comentador frisa a valorização de cursos profissionais e técnicos, como é o caso dos cursos de terapia na Escola Superior de Saúde de Alcoitão - na qual a Renascença fez uma reportagem -, em que "os miúdos e miúdas saem dali e têm um trabalho fabuloso e emprego imediato".

"Estamos a dar a volta culturalmente. A pandemia mostrou que estes trabalhadores [são] essenciais. Com a reindustrialização de todo o Ocidente, nós temos de voltar a dar dignidade a estas profissões."

No final, o primo "metalúrgico e soldador", Sérgio Raposo, deixou ainda uma mensagem: "Sou um dos 'pasteleiros' que está a montar o bolo de noiva da Joana Vasconcelos. Já vamos com cento e poucos dias de montagem, mas daqui uns dias já poderemos provar o bolo. Se puderem, venham a Waddesdon [Manor], porque esta obra de arte não é só para inglês ver".

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