20 set, 2023 • Francisco Sarsfield Cabral
Foi recentemente posta em dúvida a constitucionalidade da norma que considera crime (lenocínio) a exploração da pessoa que se prostitui, mesmo quando eventualmente feita com o consentimento desta. Quatro juízes-conselheiros do Tribunal Constitucional (TC) criticaram esta norma, quando a prática da prostituição se realiza com o consentimento de quem se prostitui. Aguarda-se, agora, uma decisão do Plenário do TC sobre a matéria.
Num artigo do deputado do PS Filipe Neto Brandão (Público de 14 de setembro) defende-se a constitucionalidade da referida norma. E afirma-se que “a prostituição é sempre a instrumentalização da pessoa, a sua redução a objeto de uma transação comercial”. É nesse plano meta-jurídico que gostaria de acrescentar algumas notas.
Sabe-se que em países como a Alemanha e os Países Baixos a prostituição é considerada um trabalho como outro qualquer. Quem se prostitui paga impostos, desconta para a segurança social, etc. Independentemente dos resultados sociais deste regime ele repugna-me por se tratar de uma comercialização do corpo humano. No limite, esta lógica tornaria legal a venda de partes e órgãos do corpo humano - o que a legislação portuguesa proíbe e ainda bem.
Claro que a prostituição é conhecida como a mais antiga profissão do mundo. Mas essa antiguidade não lhe confere qualquer direito. Também a escravatura foi aceite durante longos séculos por sociedades que se reclamavam do cristianismo.
No artigo acima citado, F. N. Brandão escreve que “ao legalizar a prostituição, o Estado transmite uma mensagem de aceitação da comercialização do corpo humano”, o que é “um retrocesso civilizacional”. Note-se que não está em causa criminalizar a pessoa que se prostitui, mas, sim, criminalizar quem fomentar a prostituição.
A mercantilização do sexo deveria merecer a oposição dos que criticam, com razão, a tendência para tudo ou quase tudo ser remetido para o mercado, para a troca comercial, para o império do dinheiro. No entanto, vemos pessoas de esquerda que encaram como um progresso o “trabalho sexual”. É uma incoerência chocante.