15 set, 2023 • Francisco Sarsfield Cabral
Porque será que, na grande maioria dos países desenvolvidos, os governos abdicaram de conduzir a política monetária, transferindo esse poder para bancos centrais independentes? Porque a experiência histórica mostra que, em democracia, os políticos não resistem a prosseguir políticas monetárias expansionistas, gerando inflação.
Quando a inflação se instala, é muito difícil fazê-la baixar. Por isso nas últimas décadas registaram-se várias subidas dos juros dos bancos centrais que provocaram recessões. A recessão não é coisa boa, mas uma inflação em roda livre é pior. A inflação é uma espécie de imposto disfarçado, que atinge sobretudo as pessoas de menores rendimentos. Ou seja, combater a inflação com subidas de juros também decorre de um imperativo de justiça social.
A Turquia passou anos a não subir juros, o que teve como resultado uma inflação cada vez mais alta. Mas Erdogan finalmente abdicou de esse seu capricho: o banco central turco foi autorizado a subir juros. Como a alta geral dos preços se tinha entretanto enraizado profundamente na sociedade turca, as subidas de juros têm, agora, que ser violentas. Repare-se também na Argentina, onde a alta dos preços já ultrapassou os 100% e continua a subir.
A separação entre poder político governamental e bancos centrais independentes é abalada quando dirigentes desses bancos manifestam ambições políticas. Poderá ser esse o caso de Mário Centeno, o que, a confirmar-se, seria negativo. Centeno tinha-se oposto a uma nova subida dos juros do Banco Central Europeu (BCE).
Mas o BCE subiu os juros em 0,25%. A inflação na zona euro está em 5,3%, contra 10% em Outubro passado, mas ainda longe do objetivo do BCE de 2%. Por isso esta subida dos juros não surpreende, mesmo sabendo que a economia da zona euro está praticamente estagnada – hoje trata-se de evitar a “estagflação”, crescimento económico nulo com subida de preços.
Cabe, agora, ao Governo português tomar medidas para atenuar os efeitos desta subida nas prestações do crédito à habitação. Sem esquecer que, do ponto de vista da proteção social dos menos favorecidos, a inflação é o adversário a abater.