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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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O original debate sobre habitação

01 mar, 2023 • Francisco Sarsfield Cabral • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


O Governo vai apresentando uma ou outra medida concreta, esperando a reação para depois optar, porventura após o mês de debate. Mas há outras interpretações possíveis para o “pacote da habitação”.

Teoricamente, decorre o período de um mês para debate público das medidas anunciadas pelo Governo sobre a crise da habitação. O problema está em que se vão sabendo “às pinguinhas” importantes normas legais para assuntos polémicos, como o arrendamento compulsivo ou o definitivo congelamento das rendas antigas (neste caso há promessas de compensar os senhorios).

Esta original forma de alimentar, ou de dificultar, o debate anunciado tem várias consequências. Haverá quem, prudentemente, não se pronuncie sem conhecer as medidas propostas; talvez tenha que esperar pelo fim do prazo de debate. Por outro lado, ao proceder assim, o Governo parece que vai apresentando uma ou outra medida concreta, esperando a reação para depois optar, porventura após o mês de debate. Conclusão, não é debate que se apresente.

Entretanto, multiplicam-se os desafios ao Governo: se quer obrigar a arrendar, porque não começa pelos numerosos edifícios do Estado que estão devolutos e muitos em degradadas condições?... Acontece que o Governo não sabe, ao certo, os edifícios que lhe pertencem e muito menos conhece o estado de cada um deles.

Perante aquilo que já se sabe sobre o “pacote da habitação”, é curioso que esta iniciativa governamental tenha sido vivamente criticada à direita e à esquerda. É que as medidas supostamente de esquerda, arrendamento compulsivo por exemplo, aparecem com benefícios aos senhorios de que a esquerda não gosta – mas os putativos beneficiários não se mostraram propriamente encantados com tais benesses.

O pacote não aborda aquilo que a Prof.ª Susana Peralta, no Público do passado dia 24, classificou de vergonha, ao “subsidiar quem encarece as casas”, isto é, borlas fiscais a residentes no estrangeiro que investem na compra de casas em Portugal; esses investidores (v.g. nómadas digitais e fundos de investimento imobiliários) têm muito mais dinheiro do que os residentes locais. Acrescento o que dizia a manchete do Público três dias depois: “fundos e off-shores que vendam casas ao Estado ficam isentos de mais-valias”.

O artigo de Susana Peralta terminava afirmando: “É no que dá desenhar pacotes complexos sem fazer o trabalho de casa”. O que me sugere uma outra explicação para a “divulgação às pinguinhas” das futuras leis da habitação – o Governo nada ter preparado a sério, apresentando, sem sequer consultar as Câmaras Municipais, uma quantidade de medidas ou intenções de medidas, por vezes quase palpites, sem prévio estudo e sem ligação lógica entre si.

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