01 ago, 2024 • D. Américo Aguiar *
Ao longo dos anos de preparação da “nossa” Jornada Mundial da Juventude, foram muitos e muito diferentes, os sentimentos que encheram o meu coração. Da alegria ao espanto, do receio ao desespero, das dúvidas às convicções, tudo por aqui passou, umas vezes mais pelo coração, pelo sentimento, outras pela razão, prática e dura.
Teoricamente, a organização de uma JMJ é demais para qualquer país e Igreja local. Porque a dimensão mundial é quase esmagadora, porque os recursos humanos, técnicos e financeiros começam no quase zero e nunca se sabe até onde nos levam. Porque não há profissionais de Jornadas, apesar da longa experiência do Dicastério que as tutela, cada Jornada é da total responsabilidade que a acolhe. E podia continuar a elencar razões pelas quais organizar uma JMJ é demasiado, para a nossa dimensão de homens e mulheres que servem a Igreja por vocação e amor.
Mas na prática é possível. Todos confirmámos que é possível. E é belo, extraordinário e feliz. Ainda hoje conseguimos ver a beleza do nascer do sol no parque Tejo e do entardecer no palco do Parque Eduardo VII, a nossa colina do Encontro. Como foi extraordinária a semana antes das Jornadas, com o país todo a acolher jovens, a cuidar deles, a trazê-los até Lisboa. E, naqueles dias, havia uma sensação generalizada de alegria, de sorrisos entre desconhecidos, de apoios inesperados e desinteressados pelas ruas da cidade. Quando a noite chegava, só conseguia agradecer a Deus, por tudo o que tinha recebido, por tudo o que nos tinha dado.
De um modo muito especial, nunca poderei esquecer a satisfação que vi no olhar do Papa Francisco, nas celebrações, nas ruas, em casa. Foi uma consolação que até hoje me continua a encher de alegria. Como muitos sabem, fiz questão de ir dando conhecimento de toda a preparação da JMJ ao Papa Francisco. Com ele partilhei muitas das alegrias e das preocupações que enchiam os nossos dias e a nossa sede, principalmente no ano que antecedeu a Jornada. O Papa Francisco foi e é o Pastor que deixa tudo para ir à procura de quem ficou para trás, de quem se sente longe ou fragilizado. Também sei que todos os vídeos que gravou, de um modo tão informal e próximo, são um sinal concreto da sua estima para com todos nós. Regressei sempre a Portugal, com um sentimento de imensa gratidão, de paz e confiança.
ENTREVISTA a D. AMÉRICO AGUIAR
Cardeal Américo Aguiar foi o “homem do leme” da Jo(...)
Tenho manifestado, vezes sem conta, como sou grato a todos, assim como tenho dito o quando gostaria de poder agradecer, pessoalmente, a cada voluntário, a cada família de acolhimento, a cada agente de segurança, a cada funcionário de todos os serviços que nos ajudaram, a cada padre e religiosa que se deram totalmente à JMJLisboa2023. A gratidão não tem princípio nem fim. E não se limita a ser dita em português. Gostaria de a fazer chegar ao mundo inteiro. Assim como quero dizer a todos, sem distinções de raças, línguas ou credos, que cada Jornada Mundial da Juventude é única e que nenhum de nós consegue sequer imaginar os frutos que podem nascer e crescer nas vidas dos jovens peregrinos, das Igrejas locais ou até mesmo da Igreja Universal. Não somos capazes de fazer estas contas, não existe o deve e o haver, quando falamos da vida de Deus no coração da humanidade.
Não seria verdadeiro, nem realista se pintasse tudo de cor-de-rosa. Não correu tudo bem, tivemos momentos de verdadeiro suor e lágrimas. Nem sempre nos entendemos, nem sempre confiámos, nem sempre fomos irmãos e irmãs em Cristo. Mas as nossas fragilidades foram e continuam a ser a prova viva da nossa humanidade, apenas superada pela imensa misericórdia de Deus, que se enche de compaixão pelos seus filhos e filhas!
Passado um ano, olho para trás e tudo valeu a pena. Cada dia, cada viagem. Cada reunião – e foram milhares – cada celebração. Valeu a pena acima de tudo, porque fomos a Igreja Viva de Nosso Senhor. Que canta, reza e chora. Que se alegra, se entristece, se enche de esperança e confiança. Que se encontra em Jesus e com Jesus Vivo. Que se reúne à volta do Pastor e se alegra só de o ver passar. A Igreja Viva de Nosso Senhor, onde todos somos filhos e filhas muito amados, todos, todos, todos.
Só Deus conhece o futuro. Só Deus sabe o que está reservado viver a cada um dos peregrinos da JMJLisboa2023, a cada um dos voluntários que fizeram acontecer a nossa Jornada. Pessoalmente, sei que irei rezar por todos, todos, todos, até ao fim da minha vida.
Como dizia Teixeira de Pascoaes, tenho “Saudades do Futuro”. E como desafia o poeta da Arrábida, Sebastião da Gama: “Pelo sonho é que vamos”.
Que Nossa Senhora da Visitação nos continue a cuidar.
* Cardeal D. Américo Aguiar, bispo de Setúbal e coordenador geral da JMJ Lisboa 2023