22 jul, 2024 • Rute Xavier
Apesar de já se falar há alguns anos, saíram recentemente os resultados de um estudo-piloto sobre a eficácia dos quatro dias de trabalho em Portugal. Neste estudo, a maioria das empresas decidiu manter esta nova forma de organização do trabalho na empresa. Foi a produtividade que ganhou? Tenho dúvidas…
Acredito que será uma medida que aos poucos se vá instalando no nosso tecido empresarial, porque os dois grandes decisores (pessoas e empresas) vão querer que se instale.
Teoricamente, sim. Trabalhar quatro dias por semana dá a todos a sensação de maior equilíbrio, mais tempo disponível.
Cada vez mais as pessoas preferem trabalhos que lhes dá flexibilidade e medidas como o trabalho remoto (e mais ainda modelos de trabalho híbrido) são valorizados pelas pessoas.
Trabalhar quatro dias por semana, por muito que se ouça “eu já trabalho mais do que cinco dias!” e “estou sempre contactável…”, se perguntarmos às pessoas se preferem, a resposta será quase unânime em como preferem.
As empresas podem vir (ainda não amplamente estudado) a ter benefícios de produtividade. Mas mesmo que não tenham benefícios de produtividade (mesmo que a produtividade seja igual, ou inferior em termos absolutos), as empresas têm um grande desafio hoje em dia que é o de atrair e reter talento.
Enquanto apenas algumas empresas adotarem esta medida, será um fator diferenciador para captar as melhores pessoas. Vemos, hoje em dia, as empresas a gastarem milhares de euros em employer branding (muitas vezes, muito mal gasto em puffs e maçãs na receção – ninguém decide ficar numa empresa porque há puffs e maçãs na receção!).
A falta de pessoas fará com que as empresas, além do salário que será sempre um fator diferenciador, ofereçam outros benefícios entre os quais se incluirá os quatro dias de trabalho.
Não. Tal como se discute hoje em dia que o trabalho remoto não é ajustado para todas as funções. E não é. Um médico não faz a cirurgia em casa, tal como a cabeleireira não corta cabelos à distância.
O facto de não ser ajustado a todas as funções ou a todos os dias, não quer dizer que não se faça nas funções em que é possível. É uma forma de diferenciar as empresas que permitem esta flexibilidade.
Tal como a semana de quatro dias. Em empresas, mesmo as que trabalham por turnos, desde que seja possível conciliar os horários, é possível implementar. Mesmo no caso de uma creche, que aparentemente não seria possível ter apenas quatro dias (exemplo que no projeto piloto voltou para os cinco dias), acredito que um dia mais tarde, em que seja massivamente implementada a medida dos quatro dias, as/os educadores e auxiliares possam ser menos diariamente, pois também as crianças não irão cinco dias à creche (mas apenas quatro dias) - menos crianças diariamente, implica turmas mais pequenas e disponibilização de funcionários para o dia de folga.
Mesmo assim, haverá funções em que não será mesmo possível. Será um fator de injustiça principalmente e quanto mais pequenas forem as empresas.
Já hoje em dia temos mais de 90% de microempresas, que muitas vezes são autoemprego – muitas das quais pagaram pelo seu posto de trabalho – com investimento inicial - e já hoje em dia vemos estes trabalhadores que para garantirem um nível de salário médio, trabalham mais de oito horas por dia. Tal como não será possível trabalharem oito horas por dia, será impensável fazerem os quatro dias por semana. Sim. É injusto mas não parece preocupar ninguém.
No futuro, tal como no passado conseguimos implementar as oito horas por dia (apesar de inicialmente não se acreditar que era possível, apesar de serem necessárias manifestações, apesar de serem necessárias reivindicações), vamos implementar os quatro dias de trabalho, desta vez (e desejavelmente) não tanto por reivindicações, mas porque todos preferem que assim seja – empresas e funcionários.
Rute Xavier, professora da Católica-Lisbon School of Business and Economics
Este espaço de opinião é uma colaboração entre a Renascença e a Católica-Lisbon School of Business and Economics