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"Não há soluções fáceis para conflitos complexos"
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"Não há soluções fáceis para conflitos complexos"

26 mar, 2023 • José Bastos


Francisco Pereira Coutinho, Jorge Tavares da Silva e Nuno Botelho na análise da China.

A ordem de detenção contra Putin ditada pelo TPI Tribunal Penal Internacional de Haia foi seguida por dois episódios relevantes para contrariar a imagem de isolamento do presidente russo: a deslocação a Mariupol e, em particular, a visita a Moscovo do presidente chinês Xi Jiping.

Apesar da dificuldade de que a indiciação do TPI tenha qualquer resultado prático, Putin necessitava de sublinhar a sua liberdade de movimentos no Donbass, mas, mais importante, acentuar a dimensão da sua aliança estratégica com a China, que no ano passado apresentou como sendo uma “aliança sem limites”, mas que na realidade está bem demarcada. A cuidadosa ambiguidade de Pequim, até ao momento, continua a excluir, por exemplo, a possibilidade de ajuda militar a Moscovo.

Resulta claro que a China pretende competir com os Estados Unidos como mediador de uma crise regional que adquiriu uma dimensão global. Pequim quer dividir a nova ordem mundial com Washington. Também por Taiwan. Daí que a primeira viagem ao estrangeiro de Xi Jiping, ao iniciar um terceiro mandato, seja a Moscovo. Um gesto de proximidade a Putin e desafio a Biden, ainda que a gestão da diplomacia chinesa esteja repleta de contradições.

A imprensa chinesa apresentou a visita como “uma missão de paz, uma oportunidade para a amizade e estabilidade global”. Xi Jiping esclareceu num artigo publicado na imprensa oficial russa que “não há soluções fáceis para conflitos complexos” e defendeu a sua atitude “objectiva e imparcial”. Na resposta, Putin agradeceu, num artigo publicado nos jornais chineses, “a posição equilibrada” de Xi Jiping “e que a visita do seu velho e bom amigo aperte ainda mais os nós bilaterais”.

Como sempre na alta diplomacia são decisivos os silêncios e os matizes deste intercâmbio epistolar. Putin alude à “cooperação sem limites nem zonas proibidas”. A fórmula foi adotada, em Pequim, durante a visita nos Jogos Olímpicos de Inverno e quando, dias depois, os tanques russos avançaram para Kiev, foi interpretada no Ocidente como uma promessa de ajuda chinesa a Moscovo. Mas não. A China insiste não ser aliada da Rússia, o que implicaria um compromisso mútuo de defesa militar, mas ser apenas um parceiro estratégico.

O plano de paz apresentado por Pequim para a Ucrânia não é audaz, nem detalhado, apenas um compêndio do óbvio, mas chega de um país com relações fluídas com Moscovo e Kiev e surge também depois de Xi Jiping apadrinhar o acordo entre o Irão e a Arábia Saudita, aproximando o universo árabe sunita e persa shiita. Acordo difícil de digerir para Washington por ter sido conseguido por Pequim na área de tradicional influência dos Estados Unidos, o Médio Oriente.

Não por acaso, a Casa Branca pediu à comunidade internacional que não se deixe enganar com o plano de paz chinês e que seja rejeitado o cessar-fogo proposto por Pequim para a Ucrânia, porque vai consolidar as conquistas de Moscovo e daria tempo às tropas de Putin para se rearmar, antes de nova ofensiva.

A análise é do do professor Francisco Pereira Coutinho, o professor Jorge Tavares da Silva e do gestor da ACP – Câmara de Comércio e Indústria Nuno Botelho.

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