09 out, 2017
Um excelente exemplo do papel decisivo e vital de um jornalismo documentado, crítico e plural é o actual enfrentamento entre a Catalunha e o governo de Madrid. Ainda mais para nós, que somos vizinhos de uma parte e de outra, e que partilhamos, parcialmente, uma história comum.
Para o poder político em Portugal trata-se de um assunto interno de Espanha. O que nos poderia pôr nesse lugar de espectadores neutros, mas ao mesmo tempo curiosos, de um conflito que sabemos como começa, mas não como acaba.
Através das notícias ou dos conhecidos que tenhamos de cada um dos lados, vamos assistindo ao evoluir da situação, na expectativa de saber quem vai ganhar e quem vai perder. Mas é claro que muitos de nós têm uma visão do que se passa, mais pró-Madrid ou pró-Barcelona, que formata e condiciona a interpretação de cada episódio. Somos, de certa maneira, dos que acham que não estamos em tempos de brexits e divisões, ou, pelo contrário, estamos ao lado do sonho independentista. Porventura, ficamos mais sensíveis à causa destes últimos com a brutalidade das polícias no dia do referendo.
As coisas não são, contudo, assim tão simples. E é aí que entra o papel do jornalismo. Quem se informa seguindo sobretudo as redes sociais deve ter em conta que estas tendem a devolver-nos aquilo que já sabemos ou, pelo menos, aquilo que já pensamos. Correlativamente tendem a desqualificar e mesmo silenciar aquilo que contraria os nossos gostos e pontos de vista. Mais preocupante, porém, neste processo da Catalunha, é ver grande parte dos principais meios de comunicação social perfeitamente alinhados ora com uma ora com outra das partes, assim reforçando e ampliando a lógica de facebooks, twitters, instagrams e quejandos. Tal alinhamento não se faz apenas através daquilo que se publica e deixa de publicar ou daquilo que se destaca ou secundariza. Traduz-se na contabilização de espingardas, na não discussão de todos os argumentos relevantes, na exacerbação da conflitualidade, no silenciamento dos que buscam o diálogo, na descontextualização histórica ou na redução dos problemas aos faits divers e aos atos das lideranças.
O jornalismo conduzido pela verdade de uma causa é necessariamente um jornalismo que sacrifica a causa da verdade.