O linfoma, doença maligna do sistema linfático que afeta milhões de pessoas no planeta, e que se divide em vários tipos, está entre as 10 doenças oncológicas mais prevalentes do mundo. Conheça esta doença durante as próximas semanas na Renascença , bem como alguns dos desafios que enfrentam os doentes que dela sofrem e os seus cuidadores. Numa série a que chamámos “Conversas de Esperança”, vamos falar-lhe desta doença e de alguns avanços científicos nesta área, de que são exemplo a Terapia Celular com células CAR-T, tecnologia que está a transformar a prática clínica em Portugal e no mundo.
Juntámo-nos à Associação Portuguesa Contra a Leucemia e à Gilead/Kite para vestir o medo de verde e falarmos de esperança consigo na Renascença.
Quem já passou por doenças oncológicas conta que não esquece o dia do diagnóstico, os meses de tratamento, os momentos em que perdeu a esperança para a ganhar outra vez. É preciso coragem para manter essa esperança durante toda a jornada. Mas vale a pena. Há testemunhos e histórias como a de Luisa Fernandes que comprovam isso mesmo. E muitas outras, que também falam de sucesso e superação, de várias etapas vencidas, de casos em que a remissão dura há décadas.
Para além dos avanços médicos promissores, que trazem esperança a quem passa por este desafio, é importante salientar que para vencer todas as incertezas, há uma rede de apoio estabelecida e com representação nacional que garante aos doentes e seus cuidadores que não estão sozinhos nesta jornada. Vale a pena conhecer o que se está a fazer de inovador neste momento no nosso país, e conhecer a resiliência de quem já viveu de perto ou vive neste momento com esta doença. Todos nós podemos ajudar, estando informados e partilhando esse conhecimento.
A Carla Rocha conversa, ao longo desta semana, com alguns especialistas neste tema, a Professora Maria Gomes da Silva, hematologista do IPO Lisboa e com a Dra. Daniela Alves, hematologista do Hospital Santa Maria. Falará também com uma doente que dará o seu testemunho de esperança e superação na primeira pessoa. Fique atento ao videocast que vamos partilhar consigo aqui ao longo dos próximos dias.
É um tumor do sistema linfático descrito como o cancro hematológico mais comum. Atinge pessoas de todas as idades, mas sobretudo adultos, e é mais frequente com o avançar da idade. Não sendo uma doença contagiosa nem hereditária, podem existir casos de linfoma em vários membros da mesma família. Na maioria dos casos a sua causa é desconhecida e não associada a fatores de risco externos. Ao contrário de outros tipos de cancro, em que o rastreio familiar é de elevada importância no que à prevenção diz respeito, este aspeto não assume essa relevância no contexto dos linfomas.
Este tipo de cancro afeta os linfócitos, um tipo particular de glóbulos brancos, cuja função é a defesa contra as infeções e que têm origem na medula óssea. O sistema linfático inclui os gânglios, timo, baço, amígdalas e os vasos linfáticos, por onde circula a linfa, constituída essencialmente por linfócitos.
O linfoma surge quando ocorrem alterações genéticas que levam à formação do tumor e a um aumento descontrolado de células tumorais (neste caso, os linfócitos) no organismo. Este tumor pode afetar vários tecidos e partes do corpo.
Numa fase inicial os sintomas podem ser bastante inespecíficos e pode não ser fácil detetar um linfoma. Embora possam estar também associados a outro tipo de patologias ou fatores externos, sintomas como um aumento do volume dos gânglios no pescoço, axilas ou virilhas, tosse ou falta de ar persistente, perda de peso, febre, cansaço fácil e suores noturnos podem ser sinais de alerta. O diagnóstico precoce é importante para o combate a esta doença, com particular relevância em tipos mais agressivos de linfoma, pelo que se apresentar alguns destes sintomas deve consultar o seu médico que, após uma avaliação clínica completa, o poderá referenciar a um hematologista.
Thomas Hodgkin foi um médico inglês que em 1832 diagnosticou pela primeira vez uma doença que provocava aumento dos gânglios e do baço dando-lhe o seu nome. É por isso que os linfomas se dividem em dois tipos: Linfomas de Hodgkin (LH) e não Hodgkin (LNH), sendo estes últimos os mais frequentes.
Em 2010 foram diagnosticados, em Portugal, 1812 novos casos de LNH e 342 de LH. No LH a incidência é maior entre os 15-30 anos e depois dos 60 anos. Nos LNH a incidência é ligeiramente superior nos homens, aumentando com a idade. Dependendo do tipo de linfoma, da extensão da doença e da condição do doente, a taxa de sucesso dos tratamentos pode chegar hoje aos 90%.
Há diversos tipos de tratamento, nos quais se incluem regimes de quimioterapia e radioterapia, mas também um conjunto de outras terapêuticas, incluindo a imunoterapia e os tratamentos dirigidos a mecanismos de crescimento e sobrevivência das células tumorais mais ou menos específicos. A terapia celular com células CAR-T constitui um avanço no tratamento de alguns tipos de cancro hematológico que tem trazido esperança a doentes com alguns tipos de linfoma não Hodgkin que já falharam linhas de tratamento anteriores. Uma vez que são utilizadas as células do próprio doente para “fabricar” o medicamento, esta opção terapêutica inovadora é produzida e administrada de forma personalizada a cada doente, e é utilizada com sucesso em Portugal desde 2019. Os doentes que tenham indicação para este tratamento poderão ter acesso ao mesmo após referenciação do seu médico assistente a um dos hospitais onde esta terapêutica está disponível: o IPO do Porto, o IPO de Lisboa e também o Hospital de Santa Maria em Lisboa.
Do ponto de vista social, laboral e económico, estas doenças podem representar um enorme impacto dentro do seio familiar, salientando-se que, no contexto de uma doença do foro oncológico, estão previstos na lei alguns benefícios de suporte ao doente e cuidador durante a sua jornada. Adicionalmente, são várias as Associações e Grupos de doentes com representação nacional que constituem uma rede de apoio multidimensional e multidisciplinar ao doente e seu cuidador durante esta fase.
De forma a assinalar o dia mundial do Linfoma, celebrado a 15 de setembro, a Renascença, associa-se à Associação Portuguesa contra a Leucemia e à Gilead/Kite, para lhe dar a conhecer mais sobre este tipo de doenças hemato-oncológicas, bem como alguns dos desafios e oportunidades que vivem atualmente os doentes com linfoma em Portugal, abordando ainda a temática dos avanços na terapêutica , nos quais se incluem as terapias celulares com células CAR T, produzidas “à medida” de cada doente.
A terapia celular com células CAR-T tira partido da capacidade de defesa e regeneração do nosso organismo, nomeadamente do sistema imunitário. Este tratamento é produzido a partir dos linfócitos T do próprio doente, e por isso é um método individualizado, que se destina a tratar alguns tipos de doenças hemato-oncológicas, através da administração de células vivas do próprio doente, que foram previamente modificadas geneticamente para detetar e combater as células malignas, e consequentemente a doença. É o resultado de muitos anos de investigação, e tem por base o conceito de que as células tumorais produzem antigénios (substâncias que levam à formação de anticorpos capazes de as neutralizar).
As terapias celulares com células CAR-T utilizam o sistema imunitário do próprio doente para combater o cancro.
Como tal, para produção desta terapêutica, é feita uma colheita de sangue do próprio doente para captação dos seus linfócitos T (aférese). Durante o processo de fabrico, os linfócitos T (células que pertencem ao grupo dos glóbulos brancos) colhidos na aférese são modificados em laboratório de modo a expressar recetores que permitirão identificar e atacar as células cancerígenas, após serem novamente administradas ao doente, num processo semelhante a uma transfusão.
Por esta razão, nas terapias celulares CAR-T, não há dois medicamentos iguais. Uma vez que são utilizadas as células do próprio doente para “fabricar” o medicamento, esta terapêutica é individualizada e concebida apenas para uma determinada pessoa.
O processo de fabrico das células CAR-T é por isso altamente complexo e envolve inúmeros passos até o tratamento ser administrado aos doentes. Também a sua disponibilidade nos centros hospitalares depende de um rigoroso processo de qualificação, que inclui não só a validação de procedimentos e equipamentos, mas também a formação de todos os profissionais de saúde envolvidos na manipulação do medicamento e gestão do doente. Atualmente, esta terapêutica está disponível em 3 unidades hospitalares: IPO do Porto, IPO de Lisboa e Hospital de Santa Maria, esperando-se que num futuro próximo possa chegar a outros hospitais e assim a mais doentes que sejam elegíveis para este tipo de tratamento.
O panorama terapêutico destas doenças está em constante mudança, e é alvo de muita atenção por parte da comunidade científica, existindo de momento inúmeros tratamentos em fase de ensaio clínico e muitos outros já aprovados. Exemplo disto é a aplicação de células de dadores a este tipo de tecnologia, utilizando-as para produzir as células CAR-T em substituição das células do próprio doente.