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Nova lei eleitoral precisa-se

05 mai, 2015 • Graça Franco • Opinião de Graça Franco


O facto de o projecto de diploma ser péssimo, não torna menos absurda a actual lei. O mundo, a sociedade e a média mudaram demais só na última década.

A actual lei eleitoral é a mais “anacrónica das leis em vigor”. A frase é de Cavaco Silva que, em boa hora, desafiou os legisladores a revogarem-na a tempo de assegurar por parte dos meios de comunicação social a desejável cobertura das próximas campanhas eleitorais, longe das imposições absurdamente igualitárias impostas pelo diploma de 75 na interpretação radical e recente da actual CNE. Tomara que a voz do Presidente se faça ouvir, porque ainda vamos a tempo de conseguir evitar um novo desastre em termos de cobertura mediática das próximas campanhas.

O pior que nos poderia acontecer (e não falo só de jornalistas, mas de todos os cidadãos) era que, no rescaldo da discussão gerada pelo polémico projecto PS/PSD e CDS com a peregrina ideia de criação de um visto prévio, se acabasse a concluir que mais vale não mexer na lei actual.

O facto de o projecto de diploma ser péssimo, não torna menos absurda a actual lei. O mundo, a sociedade e a média mudaram demais só na última década. O diploma feito em plena Revolução, há mais de 40 anos, não se compagina mais com esta mudança.

Vale a pena pensar que o direito a informar e a ser informado tem subjacente o principio sagrado da liberdade de expressão, constitucionalmente consagrada.
Os média regem-se ainda por uma série de legislação própria, incluindo o estatuto dos jornalistas e o respectivo código deontológico, sob vigilância dos órgãos independentes de regulação como a ERC e a comissão de carteira.

Toda esta panóplia de diplomas constitui quadro legal mais do que suficiente para assegurar o respeito da classe pela imparcialidade e pluralismo da cobertura das várias campanhas. Tudo o mais não passa de disfarçadas ingerências administrativas nos critérios editoriais de cada órgão, numa intromissão inaceitável do Estado sobre as redacções, impedindo que se trate de forma diferente realidades políticas sem a mesma relevância noticiosa.

Os jornalistas não têm um direito a informar, mas, pelo contrário, tem o dever de o fazer e, esse dever, não se compadece com cedências ao papel de pés de microfone ou emissores disfarçados de tempos de antena. Os públicos têm o direito a ser informados e a exigir aos jornalistas que o façam de forma isenta, plural, mas necessariamente crítica. Discernindo o essencial do acessório, o relevante do marginal.

Conceder a “régua e esquadro” os mesmos tempos e os mesmos espaços noticiosos a mais de 20 forças políticas concorrentes, não é apenas impossível. É, sobretudo, mediaticamente inútil e manipulador. Um pequeno partido marginal não pode, nem deve, ter o mesmo tratamento mediático que outro igualmente pequeno, mas que possa servir para viabilizar um eventual Governo.

Esta realidade impõe-se por bom senso e não impediu que surgissem, se viabilizassem e crescessem partidos como o Bloco de Esquerda, tal como não garantiu a entrada no Parlamento a forças como a do ex-MEP, mesmo depois de terem desencadeado/beneficiado da deriva interpretativa radical da CNE que lhes conferiu uma exposição mediática superior à de qualquer outro. Independentemente da simpatia por uns ou da antipatia mediática por outros, a verdade é que o quadro partidário português deu até agora provar de conseguir mudar.

É evidente que a actividade política continua a evidenciar o que em economia se chama “barreiras à entrada”, mas elas não radicam na cobertura mediática diferenciada nem podem ser eliminadas por uma falsa igualdade de tratamento noticioso.

Se o legislador quiser debater a questão da desvantagem relativa dos recém-chegados (e ela existe!) e lhe quiser por fim, pode e deve rever o financiamento partidário (em concreto os critérios de atribuição de subvenções públicas).

Se o legislador achar que isso melhora a qualidade da democracia pode até discriminar positivamente as novas formações, garantindo a sua maior visibilidade mediática em sede de tempos de antena reforçados ou garantindo a obrigatoriedade da passagem desses tempos em horários nobre. Tudo isso pode ser discutido em sede académica e/ou parlamentar, mas nada disso tem a ver com a actividade jornalística.

Os média devem obedecer em exclusivo a critérios editoriais, no respeito pelos estatutos dos vários meios que em última instância prestam contas aos seus próprios leitores, telespectadores e/ou ouvintes.

A carta de princípios subscrita pelos directores de informação de todos os principais órgãos de informação, na semana passada, a entregar a uma longa série de actores políticos, dá conta destas verdades elementares.

É urgente uma nova lei e esta não precisa de ter mais do que cinco a seis artigos claros que salvaguardem a independência editorial dos vários meios em período de campanha. Se os nossos deputados não entenderem a urgência da matéria seremos todos nós portugueses a sair derrotados das próximas eleições.

Esta não é uma luta de jornalistas pelo dever de informar, é sobretudo uma luta de todos pelo direito a ser devidamente informados, sem nos vermos reduzidos a sujeitos passivos da propaganda partidária. Tomara que desta vez a voz de bom senso de Cavaco Silva se faça ouvir.
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