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Testemunhos

Os Construtores desta Páscoa

09/04/2020 • Conteúdo de programação religiosa. Produção e textos: Ana Marta Domingues. Edição vídeo: Miguel Rato


Estes serão talvez os rostos mais próximos de Deus que podemos encontrar nas nossas vidas neste tempo de pandemia e de Páscoa: os médicos, os enfermeiros, os auxiliares, os caixas de supermercado, os estafetas e o pessoal da recolha do lixo, os camionistas, os bombeiros e os policias, os pescadores e agricultores. E tantos outros. A alegria do Domingo de Páscoa que vai chegar não seria possível sem eles.

Este é um tempo diferente para todos. Nestes 40 dias que antecederam a Páscoa fomos desafiados a refletir sobre nós, sobre a vida, sobre o que nos rodeia e também sobre os outros. Uma quarentena histórica, obrigatória, que nenhum de nós imaginava viver. Confinados a um espaço pequeno, junto de quem mais gostamos, ou sozinhos, para muitos é como se tivéssemos sido convidados a atravessar uma espécie de deserto. A quarentena transformou-se numa verdadeira quaresma.

Alguns, no entanto, enquanto muitos ficavam em casa, tiveram que sair e manter-se na linha da frente. Homens e mulheres como nós.

Também eles vão viver a Páscoa de um modo diferente. E aceitaram partilhar consigo o que estão a fazer e como vão ser estes seus dias.

Esta é a voz de quem continua a fazer-se ao mar e à terra, com espírito de missão, para que tenhamos pão, vinho, carne ou hortaliças e fruta à mesa.

Manuel Marques é pescador na Póvoa do Varzim, diz nunca ter vivido nada assim em 30 anos de pesca e até já pensa duas vezes antes de ir para o mar. Mas diz também ter um dever cívico para com os portugueses: o de colocar peixe fresco no mercado todos os dias. E por isso não pode parar de pescar. Esta Páscoa será muito diferente: não haverá missa de Páscoa nem compasso na rua, ou o aroma da hera fresca espalhada pelo chão. Serão só 4 em casa. Ainda assim não estarão sós.

Manuel Marques - pescador na Póvoa do Varzim
Manuel Marques - pescador na Póvoa do Varzim

O Papa Francisco disse recentemente que a pandemia mostra bem como é urgente mudar a relação dos homens com a natureza, lembrando um ditado espanhol que diz que "Deus perdoa sempre, nós de vez em quando, a natureza nunca". Essa é uma mensagem de sempre da Igreja. Foi esse o tema da primeira Encíclica do Papa Francisco, a "Laudato Si", um incentivo a cuidar da nossa casa comum.

Alfredo Sendim é “agroecologista”. Gere a Cooperativa de Usuários do Freixo do Meio no Alentejo. Na herdade nunca pararam de trabalhar. Para ele, a grande mensagem desta Páscoa, vivida em quarentena, é percebermos de uma vez por todas que somos todos um: a natureza, nós e os outros. Temos que cuidar de nós, de todos, deste planeta que habitamos.

Alfredo Sendim - agroecologista
Alfredo Sendim - agroecologista

A palavra “Páscoa” vem do hebraico “Pessach”, que significa passagem. Uma passagem que para ninguém, devido à pandemia, será indiferente.

Alguns vão viver este tempo sozinhos, junto da família mais chegada, no confinamento desta quarentena. Mas outros, para que esses possam ficar em segurança e no conforto de suas casas, ou para socorrer os que estão em sofrimento, continuam a fardar-se e a sair todos os dias, para se manterem na linha da frente.

Raquel Cohen é Diretora Técnica na Farmácia Nifo em Algés. Não parou de trabalhar porque não podem faltar medicamentos a quem mais precisa. Esta Páscoa será passada pela primeira vez em casa a sós, com os sete filhos. São muitos mas mesmo assim muito menos do que costumam ser quando se junta toda a familia. Vão fazer tudo o que puderem para não falhar as celebrações. E no Domingo vão tentar viver a Páscoa de Jesus como deve ser: com festa, alegria e união.

Raquel Cohen - Farmacêutica
Raquel Cohen - Farmacêutica

Vitor Primo é Comandante dos Bombeiros Sapadores e Protecção Civil de Vila Nova de Gaia. Nestes dias coordena uma vasta equipa de pessoas. Muitos deles não estão com as famílias há semanas. Embora estejam habituados a passar datas festivas e religiosas longe de casa, nunca foi como agora. Esta Páscoa será muito diferente. Mas apesar de tudo é preciso manter a esperança e com certeza esta será uma passagem que todos vamos viver e ultrapassar juntos.

Vítor Primo - Comandante dos Bombeiros
Vítor Primo - Comandante dos Bombeiros

Nuno Carocha é Intendente da Polícia de Segurança Publica . Deixa a família todos os dias em casa, em quarentena, para ir trabalhar pois assim exige a sua profissão.

Nesta Páscoa tudo será muito diferente para a sua família, habituada a manter fortes tradições nesta quadra. Desta vez, porque vivemos este tempo de contradições, não poderão estar próximos fisicamente. Vai ser preciso adaptar-se e, como tantas famílias portuguesas, celebrar à distância.

Nuno Carocha - Polícia de Segurança Publica
Nuno Carocha - Polícia de Segurança Publica

Jorge Madureira Nunes trabalha em seguros e na gestão de condomínios mas, durante este tempo, sentiu que faltava alguma coisa. Então viu um anúncio com um pedido do batalhão onde cumpriu serviço militar e alistou-se como voluntário do Exército, "para o que for preciso". Não podia ficar de braços cruzados. Se não for chamado, diz que vai passar a Páscoa naturalmente em família, mas desta vez só com o seu pequeno núcleo familiar de três pessoas.

Jorge Madureira Nunes - trabalha em seguros e na gestão de condomínios
Jorge Madureira Nunes - trabalha em seguros e na gestão de condomínios

Neste Sábado Santo somos todos convidados ao silêncio. Um dia de oração que nos deixará a todos mais próximos de Deus se deixarmos. Foi também isso que nos pediu o Papa Francisco na Quaresma: para nestes dias “acolhermos o apelo a deixar-nos reconciliar com Deus, para fixarmos o olhar do coração no Mistério pascal. E nos convertermos a um diálogo aberto e sincero com Deus”.

Este é um tempo precioso em que nenhum de nós devia deixar a mente entrar em quarentena.

Oiça as palavras dos médicos que continuam neste tempo a dar consultas e os seus conselhos. Ou de quem, para manter a mente saudável e ajudar os outros na solidão, decidiu apoiar os vizinhos e os mais idosos, tornar-se paquete e distribuir bens e medicamentos porta a porta.

Bruno Nifo trabalha na farmácia da família em Algés . Tem feito nestes dias um trabalho que nunca tinha feito antes: tem andado de carro a fazer entrega de medicamentos diretamente em casa dos clientes. É um trabalho que encara como missão neste tempo de quarentena e quaresma. Espera contribuir para a saúde e para o bem de todos.

Será uma Páscoa vivida só com a mulher e os quatro filhos, num núcleo mais reduzido, pois costumam correr toda a família nestes dias, de casa em casa. Mas "será vivida de certeza com muito amor, tal como esta quadra e este tempo diferente nos pedem".

Bruno Nifo - trabalha numa Farmácia
Bruno Nifo - trabalha numa Farmácia

Paulo Gonçalves é dono do café “O Paulinho” em Belém. Começou esta quarentena por vender à porta do café em regime take away e depois percebeu que era preciso dar apoio aos mais idosos e aos vizinhos e passou a distribuir porta a porta algumas mercearias, leite e pão, até o jornal.

A quarentena passou a quaresma, o trabalho a voluntariado. O seu Domingo de Páscoa, será pela primeira vez vivido a fazer entregas e serviço pelos outros. No fundo a levar alguma da alegria da Páscoa a quem mais precisa.

Paulo Gonçalves - proprietário do Café “O Paulinho” em Belém
Paulo Gonçalves - proprietário do Café “O Paulinho” em Belém

João Graça é médico psiquiatra no IPO em Lisboa. Teve que ir trabalhar para casa nestes últimos dias mas continua a dar consultas aos doentes do Serviço Nacional de Saúde à distância. Neste tempo de "grande stress individual e social", desafia-nos a que, nesta Páscoa, não deixemos a mente entrar em quarentena. É um tempo precioso que devemos aproveitar para crescer como pessoas.

João Graça - Psiquiatra
João Graça - Psiquiatra

A alegria do Domingo de Páscoa não seria possível sem as pessoas que continuam a combater este vírus na linha da frente.

Graças a estes homens e mulheres, também nós nos modificamos nesta Páscoa. E com eles, como diz o Papa Francisco, “poderemos tornar-nos aquilo que Cristo diz dos seus discípulos: sal da terra e luz do mundo.”

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