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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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Tentar perceber

A difícil transição energética

23 fev, 2019 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


A pesquisa e produção de petróleo e gás tende a aumentar e muito. Um problema para o ambiente.

Fala-se muito na transição para fontes de energia não poluentes. É, de facto, um imperativo para se evitarem desastres ambientais, que já começam a acontecer.

Mas a transição energética – basicamente, dos combustíveis fósseis, como o petróleo e o carvão, para energias limpas – oscila entre previsões entusiásticas de um mundo descarbonizado a médio prazo e ceticismo quanto a essa evolução.

Começando por Portugal, as vendas de automóveis a gasóleo caíram mais de 15% este mês; foram até mais baixas do que as vendas de carros a gasolina, o que não acontecia há quinze anos. Consequência, em grande parte, da previsão do ministro do Ambiente sobre a desvalorização, no futuro próximo, dos carros a gasóleo.

Soube-se, depois, que o Turismo de Portugal iria comprar 46 automóveis a gasóleo. Diz o jornal “i” que a compra apenas aguarda o visto do Tribunal de Contas.

Os carros movidos apenas a eletricidade representam 4% do parque automóvel nacional, mas esse número tende a aumentar. Para efeitos ambientais não chega, porém, que o carro seja movido a eletricidade, que de facto é menos poluente do que a gasolina e o gasóleo. Importa saber como é produzida essa eletricidade – se vier de centrais térmicas a fuelóleo ou, pior ainda, a carvão, o benefício ecológico será mínimo ou mesmo nulo. Ora parece que ainda durante longos ambos teremos de recorrer ao carvão para evitar o “apagão”.

A procura de “crude” aumenta

Passando à cena internacional, a Agência Internacional de Energia estima que em 2019 a procura global continuará a subir, como aconteceu no ano passado. Já a multinacional petrolífera BP não prevê que o petróleo deixe de ocupar um lugar de destaque como fonte de energia: até á década de 2030 a procura de “crude” irá aumentar a nível global. E essa fonte energética continuará a desempenhar um papel decisivo até aos anos 40 do presente século.

A BP não esconde as consequências negativas para o ambiente e em particular para o aquecimento global, prevendo que as emissões de carbono aumentarão 10% até 2040. E diz outra coisa reveladora: a dependência do petróleo vai exigir grandes investimentos na pesquisa e produção de “crude”.

Quanto às renováveis, a BP prevê que elas sejam origem de 30% da produção mundial de eletricidade por volta de 2040 e se tornem a principal fonte energética global daqui a vinte anos, uma previsão mais otimista do que aquela que a empresa fez no ano passado. O crescimento destas fontes energéticas (solar, eólica, etc.) tem sido bem mais rápido do que a afirmação inicial do petróleo ou do gás natural.

Grandes investimentos das petrolíferas

Por sua vez, outra grande empresa petrolífera, a Exxon-Mobil, planeia produzir em 2025 mais 25% de petróleo e gás do que produziu em 2017. Essa multinacional estima que a procura mundial de petróleo e gás aumente 13% até 2030.

Segundo o semanário “The Economist”, as grandes empresas petrolíferas não apenas irão, todas elas, subir a sua produção de “crude” e gás natural, como acentuarão o seu “lobby” contra medidas de limitação de emissões de carbono. Essas grandes petrolíferas, designadas por “majors”, são, além de Exxon-Mobil e da BP, a Shell, a Chevron e a Total.

Ora, segundo o IPCC, uma entidade cientifica intergovernamental, seria preciso que a produção de petróleo e gás baixasse cerca de 20% até 2030 e cerca de 55% até 2050 para que o aquecimento global deixasse de subir mais de um grau e meio centígrado acima do nível pré-industrial.

Em suma, as perspetivas de travagem das alterações climáticas e outras consequências negativas para o ambiente parecem negras. Ainda por cima, como se sabe, os EUA abandonaram o acordo de Paris. Que fazer, então?

O “Economist”, desde a sua fundação em 1843, é um semanário que defende, com inteligência, a economia de mercado. Pois, perante as intenções das grandes petrolíferas de aumentarem a produção de “crude” e gás, este semanário liberal afirma claramente que, por si só, o mercado não conseguirá resolver o problema do ambiente. São por isso necessárias “medidas musculadas” dos governos.

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