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Avenida da Liberdade
Um podcast Renascença para assinalar os 50 anos do 25 de abril de 1974. Nesta terceira série, juntamos quem nasceu antes da Revolução e viveu em ditadura, e quem cresceu em democracia. Cruzamos os olhares de duas gerações para o que fomos, o que somos e o que queremos ser. Avenida da Liberdade é um podcast da jornalista Maria João Costa com sonorização de André Peralta.
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Fernando Rosas no Avenida da Liberdade

Fernando Rosas. 25 de Novembro “é uma contenção da Revolução pactuada entre PCP e MFA”

18 mai, 2023 • Maria João Costa


Tinha 15 anos quando entrou para o PCP, fundou mais tarde o MRPP. Fernando Rosas tem a política no sangue. O historiador recorda que foi preso duas vezes pela PIDE, sujeito a tortura do sono e que, a 25 de Abril de 74, recebeu a notícia da Revolução na clandestinidade. Em entrevista ao podcast Avenida da Liberdade, Rosas recupera as memórias da luta estudantil e olha para o país de hoje, no caminho para os 50 anos da Revolução.

No caminho para os 50 anos do 25 de Abril de 1974, Fernando Rosas pega no programa do Partido Trabalhista inglês de 1945 para dizer o que acha que era revolucionário fazer hoje. Então, tal como agora, defende o historiador é preciso uma “defesa da nacionalização dos setores estratégicos da economia; uma nova reforma da agricultura que impeça o desastre para que esta caminha, a defesa dos serviços públicos essenciais como a saúde, a educação e segurança social e a defesa dos direitos do trabalho”.

Em entrevista ao podcast Avenida da Liberdade, da Renascença, Fernando Rosas olha também para o passado, percorre as suas memórias do tempo da ditadura, os dias em que esteve preso e a tortura a que foi sujeito pela PIDE.

A política estava "à mesa de casa"

Tornou-se militante do PCP tinha apenas 15 anos. Faz questão de esclarecer que “a política estava à mesa” em sua casa. Se por um lado, a família da mãe era da oposição, e o seu avô um republicano antissalazarista que chegou a ser preso, por outro, o lado do pai, era salazarista. Fernando Rosas sublinha, no entanto, que o seu pai não era um defensor do regime, mas o seu tio paterno chegou a ser “ministro de Salazar e depois de Marcello Caetano”.

Enquanto estudante no Liceu Pedro Nunes começou a intervir nos movimentos estudantis e depois, com entrada para a faculdade de Direito, na Universidade de Lisboa, acaba mesmo preso.

“A primeira vez que fui preso tinha 18 anos. Foi uma grande operação da polícia. Prenderam 40 estudantes, toda a direção do Movimento Associativo Estudantil, por denúncia de um funcionário do PCP que se passou para a polícia e que tinha o glorioso nome de Nuno Álvares Pereira”, diz, com ironia, Fernando Rosas.

Foi, então, condenado a 15 meses de prisão. Passou pelas cadeias do Aljube, Caxias e, mais tarde, por Peniche. Questionado sobre as condições nas prisões de então, Fernando Rosas distingue a experiência das duas vezes que esteve preso. “Em 1965 e 1966, que foi o tempo que lá estive, foi uma experiência de vida extraordinária. Estive preso com os assalariados rurais, os marmoristas de Pêro Pinheiro, e, portanto, foi um contato com o mundo real”.

Já sobre a prisão de Peniche, em 1971, considera-a mais do que “uma escola, uma universidade”. Dos tempos de cadeia recorda ainda os intensos interrogatórios e, em especial, a tortura do sono a que foi sujeito. “Quando nós dormíamos, os PIDES batiam nas paredes, tiravam-nos a cadeia, obrigavam-nos a fazer estátua, os pés inchavam, cheirávamos mal. A tortura do sono é direcionada para a quebra da vontade”, afirma, mas conclui: “Não me venceram”.

O 25 de Abril de 1974 apanhou Rosas na clandestinidade

Com o seu olhar pessoal, mas também o de historiador, recorda “o primeiro dia do resto” da sua vida, o dia 25 de Abril de 1974. Recebeu a notícia na clandestinidade. Apressou-se em ir para a rua. Subiu ao Largo do Carmo e recorda a alegria no momento em que as pessoas deixaram de ser apenas espectadoras da Revolução e perceberam que também faziam parte do dia “inicial e limpo”, como lhe chamou a poeta Sophia de Mello Breyner Andresen.

Questionado sobre o período que se seguiu à Revolução dos Cravos, Fernando Rosas é claro ao dizer que “uma das características da nossa democracia é que ela é filha da Revolução". "A democracia não se faz ‘apesar’ da Revolução, como diz a direita. Faz-se por causa da Revolução. As pessoas conquistam na rua os direitos fundamentais”, refere.

O 25 de Novembro e o acordo entre Álvaro Cunhal e Melo Antunes

Já sobre o momento que se seguiu, diz, a rir: “as revoluções são confusas!”. “O país ficou virado de pernas para o ar”, explica o historiador. Nesta entrevista ao podcast Avenida da Liberdade, Fernando Rosas vai mais longe no que toca ao 25 de novembro de 1975 e considera que foi um momento de “contenção da Revolução pactuada entre PCP e MFA”.

O historiador explica que, na sua opinião, o 25 de Novembro de 75, “não é bem uma contrarrevolução. É uma revolução pactuada sobretudo entre o PCP e o Grupo dos 9, do MFA, ou seja, entre o Álvaro Cunhal e o Melo Antunes”. Segundo Fernando Rosas, é devido ao 25 de Novembro que “faz, felizmente para todos nós, a economia de uma contrarrevolução. As conquistas revolucionárias fundamentais são depois consagradas na Constituição de 1976", remata Fernando Rosas.

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