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Entrevista

Inês Lopes Gonçalves reforça manhãs da Renascença. "Sinto falta de fazer rádio"

17 jun, 2021 - 17:11 • João Carlos Malta , Joana Bourgard (vídeo e fotografia)

Inês Lopes Gonçalves regressa a um local que a viu nascer profissionalmente. A apresentadora não fala na terceira pessoa, mas arrisca algumas analogias futebolísticas para descrever nesta nova etapa profissional.

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Inês Lopes Gonçalves: "A informação e o entretenimento não têm de estar de costas voltadas"
Inês Lopes Gonçalves: "A informação e o entretenimento não têm de estar de costas voltadas"

Inês Lopes Gonçalves é a mais recente contratação da Renascença. A partir desta quinta-feira passa a integrar a equipa do programa As Três da Manhã. O anúncio aconteceu durante a ação Três por Todos, que a Renascença está a realizar no Rossio, em Lisboa, num gesto de solidariedade a favor da União Audiovisual.

Em entrevista, a apresentadora fala do regresso à casa em que tudo começou. Confessa que este era "um desafio que foi muito inesperado", mas "que era irrecusável".

Promete cumplicidade com Ana Galvão, Joana Marques e Filipa Galrão, mas "desengane-se quem espere que vai ser fofinha". Promete imprimir um tom "gozão, sarcástico, e um bocadinho irónico". E revela ainda uma missão mais ou menos impossível: "Domar a Joana Marques". E conta como ficou para sempre ligada à história da rubrica "Extremamente Desagradável".

Uma conversa com uma comunicadora cuja grande mais-valia é "ser mediamente boa em muitas coisas".

Há um ditado popular português, mais ou menos fatalista, que diz que não se deve voltar aonde já fomos felizes...

Não podia discordar mais, e não é só por causa disto. Acho que devemos sempre voltar o mais possível ao sítio onde fomos felizes. Mas se quisermos aplicar esse ditado popular a esta situação, é com muito, muito gosto e muita alegria que volto a este sítio onde fui muito feliz.

Passaste na Renascença como jornalista...

Precisamente. Foi o meu primeiro trabalho, o meu primeiro emprego a sério, vinda da faculdade. Vim para cá estagiar. Na altura foi curioso, fiz um estágio de três meses. Eu queria continuar, mas depois não era possível, porque era preciso receber outros estagiários que vinham a caminho. De repente, houve uma possibilidade de ficar e prolongar o estágio, e depois ficar mesmo.

Foram cinco anos muito bons.

Passou mais de uma década desde essa altura....

Estou velha…. (risos)

O que é que ainda há da Inês jornalista?

Somos sempre um produto das escolhas que fomos fazendo. Há muita coisa que vem daqui, desta casa. Formou-me não só enquanto jornalista, formou-me enquanto profissional de rádio.

"Acho que devemos sempre voltar o mais possível ao sítio onde fomos felizes"

Há muita coisa que se aprende, e na altura nem nos apercebemos que estamos a aprender, e que é útil até hoje. É preciso sair daqui, encontrar outras pessoas, fazer outro tipo de trabalhos, cruzar-me com outras realidades, para perceber e dar ainda mais valor àquilo que aprendi aqui.

Quais as memórias mais fortes que tinhas da Renascença?

Às vezes, há aquela ideia de que antigamente é que era bom. Acho que tem a ver com a predisposição com que vivemos as coisas naquela altura. Tinha 22 anos, era o meu primeiro emprego, e quase que vivia aqui de manhã à noite e gostava disso. O ambiente da redação era extraordinário, ainda vivi o ambiente de redação um bocadinho à antiga. Ali no Chiado, ainda apanhei grandes clássicos desta casa em termos de jornalistas.

Lembro-me da excelência com que se fazia jornalismo. São memórias e ensinamentos que ficam para tua carreira.

Acabaste por dar outro rumo à tua vida profissional. Transitaste do jornalismo para o entretenimento. O que é que muda?

Há muita coisa que é diferente, quanto mais não seja se quisermos usar um elemento como a voz. Ainda me lembro de quando comecei a usar a minha voz para coisas que não a informação. Era muito diferente. Vimos mais formatados, com as arestas por limar quando se vem da informação.

Na informação tens de ter a preocupação dos dois lados da história, com os factos. Há coisas que no entretenimento são completamente diferentes, nem sequer envereda por esse caminho.

Nesta altura, em que vivemos acho que é gritante esta ideia da confirmação, da informação que é fidedigna. De ter o cuidado de perceber o que é verdadeiro do que é falso. Ir ao facto.

Ao longo do tempo foste fazendo muitas entrevistas. Esse passado foi uma base boa?

É uma base boa para a vida, uma pessoa não pode ficar com a primeira coisa que leu. Mais do que falar em coisas concretas, do eu faço isto porque aprendi, acho que a ideia é a de forjar, espicaçar a curiosidade, espicaçar o cidadão curioso, a pessoa que tem interesse por, que tem interesse nos assuntos, que vai mais além. São ótimas ferramentas que eu trouxe do jornalismo e que se aplicam facilmente noutras áreas.

"Nesta altura, em que vivemos acho que é gritante esta ideia da confirmação, da informação que é fidedigna. De ter o cuidado de perceber o que é verdadeiro do que é falso. Ir ao facto."

Nunca escondeste a paixão pela rádio, nas entrevistas que li, é um tema de que falas sempre. Sentes-te como André Villas-Boas, que regressas para a tua cadeira de sonho?

Bolas... Estou muito contente com este regresso, foi um desafio que foi muito inesperado, mas que era irrecusável. Gosto mesmo muito de rádio, e sinto falta de fazer rádio. Este projeto e a forma como ele põe junto a questão da informação e o entretenimento, como isso de repente se entrelaça num programa como é o “As Três da Manhã”.

Identificas-te muito com essa fusão?

Acho que sim. Esta ideia de estar a par com o mundo, como é slogan da Renascença. A ideia de que as duas coisas não têm de estar de costas voltadas e podemos ter um programa em que temos ambas: a parte do entretenimento que faz rir, mas também a informação muito presente no programa. Cruzar isso, tornava um desafio muito difícil de dizer que não.

Muita gente fala desse quase misticismo e magia da rádio. É um chavão. O que é que isso significa para ti?

No outro dia, estava a falar com um amigo que é jornalista, mas nunca fez rádio. Ele é da imprensa, mas como o órgão de informação em que ele trabalha também tem uma rádio, ele diz que faz um programa de uma hora, mas que aquilo fica, aquilo entranha-se.

Acho que já tinha esse bichinho ainda antes de fazer rádio. Tinha o bichinho do ouvinte. Não sei dizer porquê, talvez fosse um hábito lá de casa, lembro-me de ter essa vivência, da escuta da rádio, e de gostar da palavra na rádio. Não sei se é daqui que vem a receita para a tal paixão.

Consigo identificar algumas coisas da grande diferença de trabalhar em rádio ou televisão, há um imediatismo em rádio, as coisas são muito mais imediatas, precisamos de muito pouca coisa para a rádio acontecer: uma pessoa, um microfone e de um ouvinte do outro lado. Na televisão precisamos de muito mais funções, e isso é boa parte do segredo.

Para quem estava habituada a trabalhar no “late night”, voltar a acordar às 5h00 como é que vai ser? Já estás a ter pesadelos?

Vamos ter que falar desse assunto, não é? O elefante na sala. Digo sempre que as manhãs na rádio são a melhor e a pior coisa da minha vida. É fazer provavelmente aquilo que mais gosto de fazer, mas depois tem esse lado. Era ótimo que eu fosse a pessoa que diz, não, não, acordo naturalmente cedo, e não me custa nada. Não, vai ser horrível claro. Mas aí é que está o segredo, a partir do momento em que saímos acordamos muito cedo, e fazemos o sacrifício, mas vimos para fazer uma coisa de que se gosta muito, uma pessoa esquece-se. Fica-se com vontade de voltar no dia a seguir…

O que podemos esperar de ti nas "Três da Manhã"?

Isso é pergunta à jogador da bola. Agora podia ser como o Sérgio Conceição para usar uma analogia futebolística que quando foi contratado para o FC Porto disse que ia ser campeão, e foi. Gostava de ter esse nível de taxa de bazófia, à José Mourinho. Sou a "special one".

O que podemos esperar? Essa pergunta é muito difícil está a pôr-me muita pressão. Antes de mais podemos esperar bastante cumplicidade entre mim, a Ana Galvão e a Joana Marques e a Filipa, que não conheço tão bem.

"Era ótimo que eu fosse a pessoa que diz, não, não, acordo naturalmente cedo, e não me custa nada. Não, vai ser horrível claro"

Acho que isso é boa parte do sucesso de um programa como este. Tentar trazer o humor também. E domar um pouco Joana Marques, que aquilo é impossível. Assim não pode continuar.... (risos)

Serás algo próximo do que víamos no "5 para a meia noite", ou terás de incorporar outro registo?

Sendo eu a mesma pessoa, há um olhar para as coisas que é um bocadinho a mesma: gozona, sarcástica, um bocadinho irónica. Acho que vai passar um bocado por aí. Não sei até que ponto estavam à espera de uma pessoa que viesse para cá ser muito fofinha, não vai acontecer... (risos)

Vais entrar numa equipa com pessoas que já conheces, como alias já disseste. És até a responsável pelo nome de uma das rubricas de maior sucesso… conta-nos essa história.

Eu gostava que houvesse uma profissão que era dar nomes, do género: tens um programa novo e precisas de um nome....

Um gabinete de ideias...

Exatamente. Eu gosto disso, de dar nomes a coisas. A Joana Marques quando criou esta rubrica precisava de um nome, então eu lembrei-me deste nome "Extremamente desagradável", ato continuo lembrei-me, na altura, de ligar ao Toy, por causa da música "Estupidamente apaixonado", ele aceitou. E fico feliz que, entretanto, o indicativo desta rubrica forjar já tenha tido várias declinações. Agora temos a Marisa Liz. Mas sim, o nome é meu. Portanto, eventuais lucros que possam vir da rubrica, 2% deviam ser meus (risos)

Aliás tu tens muitos amigos nesta casa…

Sim, foi bom vir aqui hoje e ver gente que já não via há milhões de anos.

"Devia concorrer ao Got semi-Talent"

Até tiveste ou tens uma banda com alguém que aqui trabalha. Como é que isso aconteceu?

Essa banda já não existe. É verdade, era com o Rodrigo Gomes, que faz parte dos nossos vizinhos da RFM. Sim, começou aqui, estávamos os dois aqui a trabalhar e foi muito engraçada essa altura. Esses anos foram incríveis. Havia uma banda, era tudo muito divertido.

Já disseste que és mediamente boa em muitas coisas, mas não excelente. Isso não é um talento por si só?

(risos) Demorei algum tempo a perceber que isso podia ser uma boa caraterística. Era a ideia de sentir que não tinha uma vocação objetiva e muito concreta para uma determinada coisa. Do género, eu sou muito boa a fazer isto...

Às vezes via com uma certa inveja as pessoas que nasciam com um dom inacreditável para tocar um instrumento, para serem médicos, para jogarem à bola. Eu fazia isto mais ou menos bem, aquilo mais ou menos bem, só há pouco tempo é que comecei a perceber que o meu sucesso está nesta multiplicidade de semi-talentos..

E ficaste em paz...

Devia concorrer ao "Got semi-Talent" (risos).

Já fizeste muita coisa em rádio, na televisão até passaste pela Sportv, e apresentaste a Eurovisão. O que te falta fazer ainda? E o que sonhas fazer?

Há uma coisa que adorava fazer, adorava apresentar um concurso. Gosto muito de concursos, gosto muito de quizzs....

Tipo um "Quem quer ser milionário"?

Uma coisa desse género, o “Elo mais fraco”. O “Elo mais fraco” estava no topo das minhas preferências. Cresci a ver este tipo de programas e tenho essa vontade e essa curiosidade.

Tens família no Porto e em Coimbra, passavas muito tempo em Braga com os teus avós, e vives em Lisboa. Como é que esses sítios todos se repercutem na tua personalidade?

Tudo o que é diversidade, seja de que ordem for é uma coisa boa. Quanto mais coisas tu vês, isso dá-te mundo. Saber que aqui faz-se assim, mas ali faz-se assado. Abre-te a cabeça.

Tens 40 anos, dois filhos gémeos, uma carreira sólida. Ainda vivemos numa sociedade que para uma mulher ter estas coisas ao mesmo tempo é preciso ser uma privilegiada?

É conhecido, é um facto, não é uma coisa de opinião que a questão já não tem tanto a ver com o acesso.

Passamos a barreira do acesso...

Não sei se já passamos a barreira do acesso, teria de me munir de outros dados para perceber isso. No outro dia, via uma entrevista precisamente com a Elvira Fortunato sobre o papel das mulheres na ciência. Cada vez há mais. Mas ela falava disso, já não é a questão de as mulheres lá chegarem, é depois manterem-se e sobretudo permitirem-se a serem chefes de, a terem posições de liderança. É preciso que se coloquem nessa posição de serem elegíveis para.

"Há uma coisa que adorava fazer, adorava apresentar um concurso."

Mas factos são factos, e há mulheres e homens nas mesmas posições a não serem pagos da mesma forma.

Achas que há dez anos seria possível ter quatro mulheres num programa como este?

Não. Mas passámos a olhar para as coisas de forma diferente. Antes era sempre o casalinho, o casalinho piroso, era a questão da representatividade. Mas as coisas mudaram muito, e ainda bem que mudaram.

Há uns anos não era possível haver quatro mulheres num programa como estes. E isso é muito bom, sobretudo para quem ambicionar de alguma forma ter este tipo de profissão, perceber sim é possível. Essa representatividade é muito positiva.

És uma entrevistadora com experiência, que pergunta nunca farás e que pergunta fazes quase sempre?

Não sei se há alguma que faça com muita frequência, devia ter uma do género "o que dizem os teus olhos?" (risos)

Uma que nunca faria? Relacionada com dinheiro. Acho meio deselegante. Também perguntas do foro muito pessoal. Ou perguntas que sei que vão alimentar alguma imprensa ou um título escandaloso.

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  • Maria Rita Padilha
    20 jun, 2021 Valongo 21:21
    E agora como se vai chamar o programa? Será "As quatro da manhã"?

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