23 abr, 2021
O Tribunal Constitucional da Alemanha deu “luz verde” à bazuca europeia. Não foi uma decisão inesperada, mas foi mais rápida do que se contava. Uma excelente notícia para Portugal e para a UE. Recorde-se que estava sobretudo em jogo o financiamento dessa bazuca: emissão de títulos pela Comissão Europeia, algo que se aproxima da comunitarização da dívida pública. As emissões já realizadas mostram uma boa aceitação desses títulos pelos mercados. A pandemia não trouxe apenas inconvenientes e dramas...
Da Alemanha também vieram indicações políticas. A sucessão de Merkel dividiu os democratas-cristãos. A CDU-CSU escolheu como futuro candidato a chanceler (primeiro-ministro) um político próximo de Merkel, mas com fraco carisma, Amin Laschet. Na corrida estava também o líder do partido democrata-cristão da Baviera (CSU), Markus Soeder, situado um pouco mais à direita da linha centrista que Merkel seguiu.
Mas quem nesta altura vai à frente nas sondagens para as eleições gerais de setembro na RFA é o partido dos Verdes. Este partido já teve, há vinte anos, um ministro dos Negócios Estrangeiros muito popular (mas não populista) e altamente apreciado na UE: Joschka Fischer, vice-chanceler do socialista Gerhard Schroeder. Agora, em segundo lugar nas sondagens aparece a CDU-CSU, relegando para terceiro os socialistas.
Os dirigentes dos Verdes são gente nova e europeísta (como era J. Fischer). O candidato dos Verdes para suceder a Merkel como chanceler (primeiro-ministro) é uma mulher de 31 anos, Annalena Baerbock.
Contrariamente à posição de Merkel, os Verdes alemães estão contra o gasoduto Nord Stream 2, diretamente da Rússia para o norte da Alemanha, um ponto de fricção com vários parceiros da UE e com os EUA, pela maior dependência de Putin que esse gasoduto significa. E encontra-se numa fase difícil e perigosa o relacionamento da UE e dos EUA com a Rússia de Putin. Dezenas de milhares de militares russos, fortemente equipados, foram deslocados para a fronteira Leste da Ucrânia.
Para Portugal é importante começar quanto antes a receber os fundos europeus. Não é um acaso termos sido o primeiro país da UE a apresentar em Bruxelas o Plano de Recuperação e Resiliência. A crise económica e social desencadeada pela pandemia no nosso país é de difícil e lenta recuperação, porque a nossa dívida pública é muito alta e porque os bons resultados nas contas externas dos anos anteriores à pandemia ficaram a dever-se em grande parte ao turismo estrangeiro, que agora desceu para quase zero. Ora estão a acentuar-se os grandes “buracos” financeiros que vão absorver muito dinheiro dos contribuintes: TAP (1.320 milhões de euros de prejuízos no quarto trimestre de 2020, o maior prejuízo de sempre), Novo Banco, falências de inúmeras empresas após terminadas as moratórias, etc.
Felizmente que uma intervenção do Presidente da República, reclamando a criminalização do enriquecimento ilícito, problema que já se discute há muitos anos sem que se avance para medidas concretas, eficazes e constitucionais, veio desbloquear este impasse. Agora todos, incluindo o PS, dizem querer legislar a sério sobre o assunto.
Para esta viragem muito contribuiu uma proposta da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, considerando necessária uma alteração da lei do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, publicada em julho de 2019. A alteração visa a que o crime de ocultação de riqueza seja efetivamente investigado e punido. A proposta rejeita até a designação de “enriquecimento ilícito” ou “enriquecimento injustificado”, já que estes remetem para “normas inconstitucionais”.
A verdade é que muitas propostas anteriores, vindas nomeadamente de advogados, também excluíam inconstitucionalidades. Mas os partidos, nomeadamente o PS, não se interessaram em pegar nessas sugestões. Agora, porém, não conseguiram alhear-se do assunto. Mais vale tarde do que nunca. É provável que o trauma causado pela decisão instrutória do juiz Ivo Rosa, na sequência da “Operação Marquês”, também tenha influenciado este súbito interesse político-partidário quanto ao enriquecimento ilícito.