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Lei travão à despesa

Covid-19. Constitucionalista defende suavização das normas para aprovar apoios às famílias

25 mar, 2021 - 19:31 • Henrique Cunha

Bacelar Gouveia entende que "o princípio geral de necessidade" deve suavizar a interpretação da 'lei travão' que impede o aumento de despesa no Orçamento atualmente em vigor. Já para Paulo Otero, a 'lei travão' é inflexível e a única possibilidade de contorná-la será, no limite, "a introdução de um retificativo ao Orçamento" para incluir a despesa necessária para apoiar as famílias no âmbito do encerramento das escolas por causa da pandemia de Covid-19.

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O constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia defende uma suavização da "interpretação das normas constitucionais" para contrariar a chamada 'lei travão' que impede a aprovação de leis com impacto económico no orçamento em vigor.

Em causa está o facto de o Governo pretender que o Presidente da República envie para o Tribunal Constitucional a lei do Parlamento que alarga os apoios às famílias no âmbito do encerramento das escolas por causa da pandemia de Covid-19, tal como foi avançado pela Renascença.

Bacelar Gouveia reconhece que a 'lei travão' impede a aprovação de leis que impliquem um aumento de despesa no presente Orçamento, mas entende que "o princípio geral de necessidade" deve "suavizar a interpretação das normas constitucionais".

Aliás, o antigo deputado do PSD entende que, “mesmo que a questão vá ao Tribunal Constitucional”, como pretende o Governo, “há aqui um princípio geral de necessidade, há um princípio geral de urgência, há um princípio geral de direito de crise que deve suavizar a interpretação das normas constitucionais”.

Bacelar Gouveia explica o seu ponto de vista e adianta que “essa norma da lei travão é uma norma que está feita para as circunstâncias da normalidade, mas nós não vivemos na normalidade, nós vivemos na crise já há muitos meses, e, portanto, os juízes constitucionais como os doutrinadores devem interpretar as leis também no seu contexto”.

Ou seja, Bacelar Gouveia admite que “se se fizer uma interpretação literal” a lei travão “impede que os deputados aprovem diplomas legislativos que aumentem a despesa ou diminuam a receita”. Ainda assim, o professor de Direito Constitucional afirma “haver maneiras de contornar o problema”.

Diferente é a leitura do constituicionalista Paulo Otero, para quem não há possibilidade de flexibilizar a 'lei travão'.

Na opinião deste especialista, “haverá, quanto muito, a sensibilização do Parlamento e do Governo em procurarem encontrar uma solução alternativa que permita a existência de receitas para cobrir este acréscimo de despesas”.

Isto é “no limite a introdução de um retificativo ao Orçamento que permita aumentar a receita para, no fundo, fazer face a este acréscimo de despesa no âmbito dos apoios suplementares às famílias”, diz.

Segundo este professor de Direito Constitucional, “a 'lei travão' prevista no Artigo 167 da Constituição impede que os deputados possam aprovar uma lei com este conteúdo para produzir efeitos durante este ano orçamental”.

O constitucionalista esclarece que “os deputados podem aprovar [legislação] para produzir efeitos a partir de um de janeiro de 2022, não o podem fazer para produzir efeitos durante este ano”.

“Quem o poderia fazer, quem poderia ter a iniciativa para desencadear esta lei seria o Governo e não os deputados. É esse o sentido da 'lei travão'”, sublinha Paulo Otero.

O constitucionalista esclarece que, no caso de o Presidente da República decidir promulgar a lei, o Governo tem sempre a possibilidade de desencadear “uma fiscalização sucessiva da legalidade do diploma” aprovado pelo Parlamento.

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