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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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A transição energética e o nuclear

10 mar, 2021 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


Recordando a tragédia do maremoto que atingiu uma central nuclear, há dez anos, em Fukushima, no Japão, importa lembrar que ainda não existe uma solução satisfatória para os detritos radioativos. Sobretudo por isso, as centrais nucleares são demasiado perigosas para serem consideradas uma alternativa aos combustíveis fósseis.

Há 10 anos, mais precisamente a 11 de março de 2011, um maremoto atingiu a central nuclear de Fukushima, no Japão. Morreram quase 20 mil pessoas e mais de cem mil casas foram destruídas.

É certo que a maior parte destas vítimas foi causada pelo maremoto e não por radiações nucleares. Mas estas, vindas da central de Fukushima, ainda hoje matam pessoas no Japão. O mesmo se diga da explosão da central nuclear de Chernobil, em 1986.

Fukushima acentuou o receio da energia nuclear. Antes desta catástrofe dois terços dos japoneses queriam continuar e até aumentar a eletricidade produzida em centrais nucleares, apesar do horror de Hiroshima e Nagasaki (1945); depois de Fukushima, a maioria dos japoneses está contra o nuclear. Assim, até hoje apenas nove dos 54 reatores nucleares do Japão foram reativados; muitos deles não voltarão a funcionar.

Por causa de Fukushima, Merkel decidiu fechar gradualmente as centrais nucleares existentes na Alemanha.

Mas a China prosseguiu a construção de centrais nucleares para o fornecimento de eletricidade; a ditadura do partido comunista chinês não dá grande importância aos receios dos chineses, enquanto as democracias não podem desprezar as opiniões públicas.

A energia nuclear tem sérios riscos, mas não contribui para a emissão de CO2. Ora, felizmente, as opiniões públicas de muitos países democráticos estão hoje mais conscientes da urgência de defender o ambiente e travar as alterações climáticas.

Porque não, então, voltar a apostar no nuclear para a produção menos poluente de energia elétrica? Seria um passo importante se levasse a uma forte descida na utilização de carvão, petróleo e gás natural na produção de eletricidade.

Essa posição é defendida, por exemplo, por Bill Gates. E também pelo semanário britânico “The Economist”, afirmando que centrais nucleares bem reguladas não são perigosas.

Julgo que Bill Gates e o “Economist” são demasiado otimistas quanto aos riscos da energia nuclear. Pensava-se que os japoneses eram muito competentes e teriam tomado todas as precauções nas suas centrais nucleares.

Mas em Fukushima falharam, ao não preverem a possibilidade de um maremoto provocar inundações que atingiram os reatores da central, bloqueando o seu sistema de refrigeração. É impossível prever tudo.

Por outro lado, não está cabalmente resolvido o problema dos resíduos nucleares, que permanecem radioativos durante uma eternidade. A prática corrente é enterrar bem fundo esses detritos. Mas o que poderá acontecer daqui a várias gerações, em caso por exemplo de um terramoto?

É uma herança muito perigosa, que o princípio da precaução desaconselha. O imperativo de justiça entre gerações, que obriga a zelar pelo ambiente, não exclui gerações que possam surgir daqui a milhares de anos.

Em Portugal há um consenso, não unânime, mas bastante alargado, quanto a não recorrer ao nuclear. O que não nos evita os seus riscos. É o caso, tantas vezes falado, da central nuclear espanhola de Almaraz, junto ao Tejo e a 100 quilómetros da fronteira portuguesa.

A construção de um aterro para os detritos radioativos dessa central, um “cemitério” nuclear, pode contaminar as águas do rio, que irão entrar em Portugal. Além disso, trata-se de uma central que começou a funcionar em 1981, tendo, portanto, 40 anos.

Ora, 30 anos é o período normal de vida de uma central nuclear e em Almaraz já se registaram vários incidentes preocupantes.

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