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Francisco Sarsfield Cabral
Opinião de Francisco Sarsfield Cabral
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Os EUA em alerta máximo

15 jan, 2021 • Opinião de Francisco Sarsfield Cabral


É necessário correr o risco de tentar destituir Trump, ainda que isso desencadeie uma onda de protestos dos seus apoiantes. Os EUA continuam divididos. Mas a democracia americana precisa de recuperar da perda de prestígio que o assalto ao Congresso provocou.

A cinco dias da tomada de posse do novo Presidente dos EUA, Joe Biden, há quem receie graves distúrbios e/ou uma ação externa do ainda Presidente capaz de paralisar a transição.

Distúrbios violentos são possíveis, provavelmente não em Washington, para onde foram destacados 20 mil guardas nacionais, mas noutros locais. Foram encontrados engenhos explosivos no Capitólio.

Há nos EUA muitos grupos armados de extrema-direita que, até porque estão exasperados com Trump ter deixado de os felicitar após o golpe falhado, ambicionam mostrar que existem. Daí o alerta máximo em todo o território americano.

Em 1865, Lincoln foi assassinado num teatro depois de ganhar a sangrenta guerra civil contra os estados confederados, que queriam manter a escravatura...

No plano externo, Nancy Pelosi, líder da maioria democrática na Câmara dos Representantes, já falou com altas chefias militares sobre um tema delicado. Recordo que, em 1974, o então Presidente Nixon, forçado a pedir a demissão por causa do escândalo Watergate, dava mostras de algumas perturbações mentais.

Nessa altura, Kissinger (Secretário de Estado), inquieto, combinou com os chefes militares que não executariam sem exame prévio uma eventual ordem de ataque nuclear dada por Nixon. Presumo que algo parecido tenha sido realizado agora, mas Pelosi não o poderia revelar, claro.

Trump deve invejar o seu amigo Putin, que não só fez mudar a Constituição para permanecer indefinidamente no cargo de Presidente da Rússia, como mandou aprovar uma lei para que os ex-presidentes russos se tornem senadores com imunidade vitalícia. Eles e a família.

Apesar das tentativas de Trump, a democracia americana ainda não foi destruída, mas precisa de recuperar o seu prestígio. Por isso, o Senado de Washington terá de votar a destituição dele, depois de a Câmara dos Representantes a ter aprovado, com dez votos vindos de congressistas republicanos a somar aos votos dos democráticos. A decisão do Senado será tomada depois da entrada de Joe Biden na Casa Branca. Não é provável que o Senado aprove a destituição de Trump; mesmo assim será um gesto simbólico.

Parece que o líder republicano no Senado, Mitch McConell, terá dito em privado que a destituição de Trump facilitaria travar a sua influência no partido republicano. Talvez, mas essa influência, se bem que tenha diminuído depois do lamentável episódio no Capitólio, ainda é considerável nas bases do partido.

Não se deve esperar uma espetacular quebra no apoio a Trump: os seus defeitos eram bem visíveis para quem não recusava vê-los; no entanto, ainda que vencido por Biden, a sua votação aumentou vários milhões desde 2016 até novembro passado.

Trump vem agora ameaçar que a sua destituição desencadearia uma tremenda onda de protesto. É possível, como é certo que a América continua dividida. Ainda há numerosos políticos republicanos com eleições à vista, primárias sobretudo, que receiam opor-se abertamente ao ainda presidente, com medo que a sua influência política futura lhes liquide as suas carreiras.

É necessário correr o risco de tentar destituir Trump. De resto, mesmo que Trump escape à destituição, ficará sujeito a uma série de processos depois de sair da Casa Branca, incluindo processos criminais.

Escreve o “Financial Times”, em editorial, que “os últimos quatro anos foram uma lição sobre a loucura de adiar decisões difíceis, esperando que tudo corresse pelo melhor”. Não correu, como se viu na semana passada no Capitólio.

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