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Igreja não sabe explicar transferências de 1,8 mil milhões do Vaticano para a Austrália

06 jan, 2021 - 02:41 • Filipe d'Avillez

Segundo as autoridades financeiras da Austrália as mais de 40 mil transferências individuais começaram no ano em que o cardeal George Pell, entretanto condenado e depois ilibado por abuso sexual de menores, começou a trabalhar no Vaticano.

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A Igreja Católica na Austrália não sabe explicar por que razão foram transferidos mais de 1,8 mil milhões de dólares americanos (cerca de 1,5 mil milhões de euros) de contas no Vaticano para contas na Austrália desde 2014.

O valor das mais de 40 mil transferências foi revelado pela AUSTRAC, o Centro Australiano de Análise de Relatórios de Transação, a pedido de uma deputada pouco antes do Natal, segundo o site de informação “Crux”, e divulgado nos últimos dias pelo jornal “The Australian”.

Os bispos australianos ficaram surpreendidos com os valores e garantem que nem um dólar foi parar às dioceses ou a qualquer organização católica de que tenham conhecimento. A Igreja australiana está a ponderar pedir mais detalhes à AUSTRAC e ao próprio Vaticano.

Um dos aspetos mais surpreendentes é o volume das transferências. Para se ter ideia, o orçamento anual de toda a Santa Sé é de cerca de 350 milhões de dólares.

Em 2020 já tinha sido notícia uma transferência suspeita de setecentos mil dólares feita do Vaticano para a Austrália. Na altura a imprensa italiana especulou que esse dinheiro possa ter sido enviado por ordem do cardeal Becciu, que entretanto foi forçado pelo Papa Francisco a demitir-se, possivelmente com a intenção de influenciar o julgamento do cardeal australiano George Pell, com quem Becciu tinha tido desentendimentos públicos no passado.

Pell foi nomeado em 2014 pelo Papa Francisco para ajudar a limpar os departamentos financeiros da Santa Sé, que tinham péssima reputação. Como parte dessa operação de limpeza chegou a ordenar uma auditoria externa a todos os departamentos do Vaticano, mas que Becciu cancelou.

As transferências a que a AUSTRAC se refere começaram precisamente em 2014, pouco tempo antes de surgirem acusações de que Pell teria abusado menores no passado. O cardeal sempre negou as acusações mas suspendeu o seu cargo em Roma para voltar para a Austrália para enfrentar o julgamento. Foi condenado em primeira e em segunda instância, mas acabou por ser ilibado pelo Supremo Tribunal, que concluiu que não havia bases para sustentar a sua condenação.

As autoridades financeiras e policiais da Austrália não chegaram a investigar formalmente a transferência de 700 mil dólares, cujo destinatário continua a ser desconhecido, mas a Igreja australiana quer respostas quanto a estes novos dados.

“Os bispos australianos só tomaram conhecimento das transferências quando a AUSTRAC divulgou a informação, pouco antes do Natal. Embora tenham sido fornecidos detalhes do número e da quantidade de pagamentos, ainda não existe informação sobre o destinatário ou destinatários, nem sobre se as transferências continuam a ser feitas”, disse o bispo Richard Umbers, auxiliar de Sydney.

O prelado acrescentou que “contrariamente aos estereótipos que existem, a Igreja simplesmente não tem esse tipo de valores – o Vaticano funciona com um orçamento comparável ao de uma empresa média na Austrália. Se estamos perante uma operação de lavagem de dinheiro, então temos de garantir que quaisquer crimes sejam expostos e remediados”, afirmou, em declarações à “Crux”.

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  • Manuel Saraiva
    08 jan, 2021 Lisboa 22:05
    Porquê a escolha de uma fotografia do Cardeal Pell?

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